No passado dia 17 de Novembro, os bispos dos EUA fizeram história ao aprovarem por 222 votos a favor, 8 contra e 3 abstenções, um documento intitulado «O Mistério da Eucaristia na Vida da Igreja».
Quando a Conferência Episcopal Norte-Americana tomou a decisão de o elaborar, em Junho de 2019, ninguém imaginava os problemas que surgiriam dois anos mais tarde, em virtude de o novo Presidente ser um militante activo a favor do aborto, ao mesmo tempo que se declara católico. Esta inconsistência talvez se explique por algumas pessoas que admiram as iniciativas da Igreja se considerarem católicas, mesmo desconhecendo a doutrina ou tendo divergências de fundo.
O assunto ganhou especial acuidade quando o Presidente Biden apareceu numa Missa e se aproximou para Comungar. A contradição escandalizou os católicos e gerou um movimento forte a pedir aos bispos que explicassem a Biden que não podia tratar assim a Eucaristia. Inesperadamente, o documento que se trabalhava desde há dois anos, parecia destinado a concentrar-se nesta lição fundamental: Biden venha à Missa, mas não pode comungar.
Bastantes bispos viram o perigo de se transformar a Eucaristia num instrumento de luta política. Em Maio deste ano, o Cardeal Luis Ladaria, Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, enviou-lhes uma carta repetindo a cada passo que o aborto é um crime grave, mas pedindo que o documento reflectisse o consenso de todos os bispos, evitasse aparecer como uma intromissão na luta partidária, ou desse a entender que a doutrina da Igreja se resume à sua oposição ao aborto. Em vista da polémica, na reunião da Conferência Episcopal de Junho, 55 bispos preferiram adiar indefinidamente o documento sobre a Eucaristia. Felizmente, 168 mantiveram o plano.
O resultado conheceu-se no passado dia 17 de Novembro, aprovado pela quase por unanimidade. Realmente, está bem escrito e expressa com clareza os pontos centrais acerca da Eucaristia, sem alimentar controvérsias políticas.
As páginas sobre o carácter sacrificial da Missa e sobre a presença real de Jesus na Eucaristia abrem o panorama geral, que permite compreender a relação da Eucaristia com a Igreja e entender o significado de Comunhão, simultaneamente com Cristo e com a Igreja. Para alguns leitores, uma consequência prática é a importância de assistir presencialmente à Missa, em especial ao Domingo, porque a pandemia os fez perder o bom hábito de assistir à Missa, como se a transmissão televisiva a pudesse substituir.
O capítulo sobre a resposta do cristão ao dom da Eucaristia ilustra a exposição doutrinal com esplêndidas observações práticas, por exemplo acerca do Sacramento da Confissão.
Sem abandonar a perspectiva teológica e sem referir casos particulares, o documento é perfeitamente claro acerca da importância de estar em comunhão visível com a Igreja para poder comungar Jesus na Eucaristia. «Repetimos o que os bispos dos EUA declararam em 2006: “Se, na sua vida pessoal ou profissional, um católico rejeita consciente e obstinadamente doutrinas definidas pela Igreja, ou se consciente e obstinadamente repudia os seus ensinamentos definitivos acerca de temas morais, diminui seriamente a sua comunhão com a Igreja. Receber a Sagrada Comunhão nestas condições contradiz a natureza da celebração eucarística, de modo que tal pessoa deve abster-se de comungar”». O texto cita ainda uma Encíclica papal sobre a Eucaristia: «Em casos de uma conduta pública que seja séria, clara e persistentemente contrária à norma moral, a Igreja, na sua preocupação pastoral pela boa ordem da comunidade e por respeito ao sacramento, não pode deixar de intervir. O Código de Direito Canónico refere-se a esta manifesta falta de disposições morais quando estipula que “quem persiste obstinadamente num pecado grave” não deve ser admitido à Comunhão eucarística”».
Este documento dos bispos norte-americanos contém muitas citações, dos últimos Papas, do Catecismo da Igreja Católica e de muitos santos. Realço os testemunhos de Carlo Acutis, beatificado em 2020, e de S. José Sánchez, um rapaz mexicano martirizado com 14 anos, canonizado pelo Papa Francisco em 2016. Este último, na prisão, sujeito a muitas torturas para renegar a fé, recebia a Eucaristia às escondidas e respondia às propostas dos seus raptores dizendo-lhes: «a minha fé não está à venda». É também inspiradora a devoção eucarística de Santa Elizabeth Ann Seton, a primeira santa nascida nos EUA, quer antes quer depois de se converter à fé católica.
Em resumo, vale a pena ler «O Mistério da Eucaristia na Vida da Igreja».