Vírus? Mais do que um é moléstia!

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A designação “Cisne Negro” atribui-se, normalmente, a um fenómeno imprevisível, raro, de consequências incertas, e, muitas vezes, severas.

O coronavírus (Covid-19) encaixa perfeitamente nesta designação. Em Portugal, no norte, ao quinto caso confirmado, os Hospitais de S. João e St. António rebentam pelas costuras e torna-se preciso alargar a rede a mais quatro unidades hospitalares, entre eles, uma aqui ao lado, o Hospital Padre Américo. Dos 5 casos confirmados, 4 são da nossa região e um é de Lisboa. Quando a coisa dá para o torto o norte paga sempre mais do que o sul. Até na saúde pública. Não é o destino, mas parece. Não é sina, talvez seja só azar. Ou não!

Desta maneira, se a lógica se mantiver, e como ainda nos encontramos em fase de contenção, tudo indica, hoje, que a nossa região poderá vir a ser, em Portugal, a mais atingida pelo epifenómeno.

Poderá ser assim ou não, mas neste momento, o que mais interessa reter é que o nosso maior inimigo não é o coronavírus em si. São os rumores, os medos, os estigmas, a ignorância.

Estes perigos, tão grandes ou maiores do que o vírus, só se conseguem combater com a eficácia possível se a partir dos factos soubermos usar a razão e a solidariedade.

Ao mesmo tempo que somos mais ou menos atacados por este cisne negro, o país é afectado e, mais do que provavelmente infectado, por outros vírus que parecem querer destruir as convicções até aos mais crentes democratas. Os casos impensáveis no nosso sistema de Justiça.

Num dia dizem-nos que há cinco desembargadores da Relação de Lisboa metidos em redes de corrupção. As suspeitas resultam de uma simples auditoria aos sorteios na atribuição dos processos.

No dia seguinte demite-se o presidente do Tribunal da Relação por causa das mesmas suspeitas. A ser verdade, começamos a pensar no que se descobriria de perverso se a investigação se estendesse a um período mais longo. Quinze ou vinte anos, por exemplo.

Entretanto, o ex-presidente do tribunal da relação de Lisboa, Luís Vaz das Neves, é acusado e não nega, de ter usado sala do tribunal para ganhar 280.000 euros com “julgamento privado”.  A coisa parece prática comum e instalada. Intocáveis? Sempre os mesmos.

Neste caso não bastará sequer apurar a responsabilidade do acusado. Os órgãos, sempre muitos, que têm como função regular e monitorizar a arbitragem extrajudicial em Portugal  não podem ficar de fora deste escrutínio.

Não metendo no mesmo saco, mas, ao mesmo tempo, sabendo que cinco inspetores da ASAE são detidos por suspeitas de corrupção, não conseguimos escapar ao raciocínio de que umas coisas andam ligadas às outras.

Quando a coisa, antes, já parecia feia pela não eleição dos dois juízes para o Tribunal Constitucional que, não sendo caso de corrupção, evidenciou uma vez mais como a nossa democracia vive de regras tão particulares e tão próprias que até os órgãos da soberana Justiça são ocupados pelos partidos políticos. Uma espécie de nomeação através de eleição ou vice-versa. Em qualquer dos casos sinónimos evidentes da apropriação pelos partidos políticos do poder judicial que, segundo a cartilha da democracia de que nos orgulhamos, devia ser o poder mais independente, justo e cego.

Enquanto isto e enquanto espera acusação do caso LEX, o juiz Rui Rangel faz rejuvenescimento da pele. Nestas coisas da Justiça a aparência, ao que parece, também conta.

A confirmarem-se as suspeitas, uma que seja, a machadada no intocável sacrossanto sistema de Justiça, se , por ora, não o mata, também não nos permite olhá-lo de boa saúde.

Os juízes são aqueles senhores que nunca se sentam sem que nos levantemos. Por respeito. À Justiça, a eles e ao poder que representam. O exemplo tinha de vir deles.

Sobra a esperança última por, desta vez, o Conselho Superior de Magistratura ter prometido agir a tempo e horas.

Quem dera: a tempo, horas e com justiça.

É que se um vírus mata muita gente, dois vírus podem matar a democracia.