Parte de um terreno cedido pela Câmara Municipal de Paredes à Santa Casa da Misericórdia de Paredes para construir um lar de idosos em Baltar foi vendido a uma empresa imobiliária.
A diminuição do espaço disponível inviabiliza o projecto e, para o CDS-PP Paredes, é caso de justiça. Numa conferência de imprensa realizada no sábado, o partido adiantou que vai avançar com uma queixa no Ministério Público até ao final do ano, levando a questão também para os tribunais cíveis e administrativos numa tentativa de reverter o processo.
“Queremos apurar responsabilidades. O PSD sabia da venda e, mesmo assim, votou a cedência do terreno nos termos iniciais em Assembleia Municipal”, diz Jorge Ribeiro da Silva, vice-presidente da comissão política do CDS-PP e actual membro da Assembleia Municipal.
Ilídio Meireles, provedor da Santa Casa da Misericórdia de Paredes, diz que aguarda uma reunião com o novo executivo municipal, mas avisa que este protocolo está “viciado”, “morto” e é “impossível de cumprir”.
Misericórdia queria avançar com lar e Baltar e creche, pré-escolar e ATL na Madalena
A história começa no início do ano de 2017. A 20 de Fevereiro, a Câmara Municipal de Paredes e a Santa Casa da Misericórdia de Paredes assinaram um protocolo em que o município cedia a antiga EB 2/3 de Baltar e a antiga Escola Primária da Madalena à Santa Casa. Em contrapartida, a Misericórdia, enquanto proprietária do Palacete da Granja, onde funciona a Casa da Cultura de Paredes, alargava o prazo de cedência do imóvel à autarquia para 50 anos.
O objectivo da Misericórdia de Paredes era instalar em Baltar um lar, com cerca de 40 camas, para dar apoio a idosos com doenças degenerativas, e na Madalena criar um novo polo escolar, reforçando as valências de creche, pré-escolar e ATL da instituição. Na altura, Celso Ferreira, presidente da Câmara de Paredes, garantia que todos saiam a ganhar e que os novos equipamentos iam beneficiar a comunidade.
No mesmo protocolo, o município comprometia-se a incluir a obra do lar na Carta Social do concelho, declarando-a área prioritária de intervenção, e a tudo fazer para que fosse possível candidatá-la a fundos comunitários.
Seguiam-se formalidades. O protocolo foi aprovado por unanimidade em reunião de executivo a 13 de Março. Faltava depois a aprovação em Assembleia Municipal e na Assembleia-Geral da Misericórdia de Paredes.
A 27 de Março, a Irmandade da Santa Casa da Misericórdia de Paredes reuniu em Assembleia Geral e aprovou a aceitação da doação do município do conjunto de edifícios da antiga EB 2,3 de Baltar e da antiga Escola Primária da Madalena, aprovando os encargos envolvidos e conferindo ainda ao Provedor poderes para formalizar todos os actos necessários.
Seguiu-se a 8 de Maio a aprovação, também por unanimidade, de todas as forças políticas com assento na Assembleia Municipal de Paredes.
Tudo estaria normal e pronto para que a Misericórdia de Paredes pudesse arrancar com os projectos que tinha para ambos os espaços, não fosse ter decorrido, paralelamente, um outro processo.
Parcela de terreno a ceder sofreu diminuição e inviabiliza o projecto do lar
Em Abril, diz o CDS-PP, começaram as “movimentações subterrâneas” que haviam de pôr o lar previsto “ligado às máquinas”.
Do terreno, de cerca de 14.392 metros quadrados, que já estava dividido em duas parcelas, deviam ser vendidos cerca de 4.592 metros quadrados, havendo uma outra parte que era cedida para domínio público. Mas foi pedida uma alteração às áreas de terreno, que reduziu o terreno a ceder à Santa Casa da Misericórdia para 5.762 metros quadrados e aumentou a parcela a vender para os 6.721 metros quadrados.
A 28 de Abril, em edital assinado por Celso Ferreira, ia a hasta pública essa parcela de terreno, com 6.721 metros quadrados, na parte traseira do terreno da escola. O valor base de licitação era de 200 mil euros.
A 8 de Maio, o terreno foi adquirido por 201 mil euros, pela Gindungo – Imobiliária SA, uma empresa de Vandoma, representada por Daniela Moreira Leal e Sandra Moreira Leal. No mesmo dia em que era aprovada, em Assembleia Municipal, a cedência do terreno à Misericórdia.
O destino do terreno alienado seria a revenda, lê-se no contrato de adjudicação celebrado com o município. A escritura pública foi feita a 30 de Julho. O CDS-PP estranha porque afirma que no Plano Director Municipal este terreno surge como sendo de equipamentos. O partido estranha também que Alexandre Almeida, agora presidente da Câmara Municipal de Paredes e na altura vereador do município, fosse Revisor Oficial de Contas da Gindungo desconhecesse todo este processo.
Quando a venda veio a público, Celso Ferreira alegou a existência de um erro administrativo.
Os novos donos iam começar a construir um muro, mas a situação foi travada.
“Caso nada seja feito, o sonho da existência de um lar nestas instalações morre de vez”, acredita Jorge Ribeiro da Silva. Alertando para os postos de trabalho, directos e indirectos, que aquele investimento ia criar na freguesia, sendo “porta-estandarte da revitalização do comércio, indústria e serviços”, o vice-presidente do CDS-PP Paredes garantiu que o partido não vai cruzar os braços apesar do combate “longo e difícil que se adivinha”.
“Vamos levar o caso ao Ministério Público de Paredes para que sejam avaliados os ilícitos criminais neste processo e o CDS-PP vai junto dos tribunais administrativos e cíveis interpor acções que visem reverter esta situação e construir o lar. Vamos até às últimas consequências”, garantiu.
Dizem-se preocupados porque desde que este novo executivo camarário tomou posse nada foi feito.
“O protocolo está morto porque o anterior presidente da câmara o matou”
Ao Verdadeiro Olhar, o provedor da Santa Casa da Misericórdia de Paredes sustenta que a instituição não pode aceitar um protocolo que está “viciado”. “Não podemos fazer a escritura de 5.762 metros quadrados quando o terreno doado era superior”, sustenta. Defendendo que o protocolo é “impossível de cumprir”, Ilídio Meireles lembra que a Misericórdia já teve prejuízos, porque fez levantamentos topográficos e projectos de arquitectura para a obra do lar.
“O presidente Celso Ferreira falou em erro administrativo e ainda fez uma minuta e comprometendo-se a devolver cerca de 63 mil euros à Gindungo mas isso nunca avançou”, sustenta. “O protocolo está morto porque o anterior presidente da câmara o matou”, acrescenta.
Sem aquele terreno, para espaço de lazer e estacionamento, o projecto existente não faz sentido, admite o provedor.
A Santa Casa da Misericórdia de Paredes está a aguardar por uma reunião com a Câmara Municipal que, confirma o município, vai acontecer em Janeiro.
Só depois dessa reunião a autarquia responderá a questões colocadas sobre se há ou não intenção de reverter a venda deste terreno ou se estão preocupados com a cedência das instalações da Casa da Cultura e com a não concretização da construção do lar.
Sobre o facto de ter sido ROC da empresa Gindungo, Alexandre Almeida sustenta que “um ROC desempenha as funções em regime de completa independência funcional e hierárquica relativamente às empresas e a outras entidades a quem prestas serviços”. “Renunciei às funções de Revisor Oficial de Contas, antes da tomada de posse como Presidente da Câmara Municipal, a 21 de Outubro de 2017. Pauto-me pelo rigor e pela transparência”, conclui o autarca.