A Câmara Municipal de Valongo aprovou, esta quinta-feira, por unanimidade, o resgate das duas concessões do estacionamento à superfície existentes, nas cidades de Ermesinde e de Valongo, “para garantia do interesse público”.
A municipalização do serviço, que passará a ser gerido pela autarquia e deve baixar de preço, só poderá entrar em vigor daqui a seis meses, por questões legais. Mas até lá, adiantou o presidente da câmara, a empresa já foi notificada de que está “proibida” de fiscalizar o estacionamento nos lugares com parcómetro.
Mais do que isso, disse José Manuel Ribeiro, os funcionários da empresa não têm, até hoje, equiparação a agentes da autoridade administrativa pelo que estão impedidos de fiscalizar e as multas emitidas, de 30 euros, por estacionamento indevido no último ano, não foram processadas e enviadas à Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária pelo que serão pagas.
Apesar de votar a favor, o PSD criticou todo este processo, lembrou que por várias vezes alertou para “a caça à multa” existente e culpou o presidente da câmara pela adenda que entregou à empresa concessionária, a Parque VE, S.A, o poder de fiscalização.
Decisão é “política” e resposta às “práticas comerciais agressivas e desleais” da empresa
A decisão é “política” assumiu José Manuel Ribeiro. Terá “impactos e consequências”, mas o resgate destas concessões era a única forma de resolver o problema face às “práticas comerciais agressivas e desleais” adoptadas pela empresa.
“A gestão do serviço de estacionamento à superfície é um instrumento fundamental para as políticas públicas de acessibilidade, mobilidade e organização urbana. Pretende-se diminuir a agressão automóvel à qualidade urbana, diversificar as soluções de transporte e organizar os canais de circulação afetos ao sistema de transportes públicos, ora não é compatível desenvolver estas novas políticas, estando o município vinculado às obrigações e restrições contratuais resultantes dos contratos de concessão de estacionamento em vigor”, defendeu o autarca em reunião de executivo.
O presidente da câmara afirmou que a autarquia recebe, diariamente, inúmeras queixas sobre a actividade dos fiscais da concessionária “que em lugar de estarem orientados para a boa gestão do estacionamento, entraram numa verdadeira caça à multa”. “A gestão do estacionamento é um serviço público que deve estar alinhado com as políticas de gestão das cidades e focado na qualidade de vida dos habitantes, e não apenas na obtenção do maior lucro possível”, criticou, dizendo que a “concessionária não mostrou sensibilidade para a defesa do interesse público”, o que levou o executivo a avançar para o resgate das concessões, tema que ainda tem que passar pela Assembleia Municipal.
O serviço passará a ser gerido pelo município. Mas, por razões legais, a decisão só terá efeito daqui a cerca de seis meses, em Julho.
“No entanto, a empresa concessionária foi, desde já, proibida de continuar a fiscalizar o estacionamento, que será da responsabilidade do município. Foi ontem notificada dessa decisão. Os cidadãos devem estar alerta para qualquer comportamento agressivo e inadmissível e se for caso chamar as autoridades polícias e o município”, realçou José Manuel Ribeiro. Segundo o socialista, os funcionários da empresa não estão habilitados a fiscalizar, algo para o qual a empresa já teria sido alertada, sendo dado um prazo para obter a equiparação do pessoal a agentes da autoridade administrativa. “Como não o conseguiram fazer informamos que doravante estavam impedidos de fiscalizar porque não têm competências”, explicou Paulo Esteves Ferreira, vereador do PS.
“Não há um único processo relativo às concessões que tenha dado origem a multa, nem vai haver”
José Manuel Ribeiro explicou que a lei permite às empresas não fiscalizar, mas verificar infracções. “Tecnicamente não é uma fiscalização. Quem pode aplicar coimas são as autoridades administrativas locais que são as câmaras municipais”, disse. Caberia ao município enviar para a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária os processos para dar origem a coimas no valor mínimo de 30 euros, algo que não aconteceu. “Neste momento não há processos remetidos à ANSR porque os fiscais não estavam habilitados. Não há um único processo relativo às concessões que tenha dado origem a multa, nem vai haver”, garantiu o edil, não dizendo, no entanto, o que acontece nos casos em que as pessoas pagaram, voluntariamente, no prazo de 72 horas, os seis euros deixados nos avisos.
O autarca prometeu ainda que, quando se concretizar o resgate, vai propor uma redução do valor da hora de estacionamento, que deverá passar a custar 0,40 cêntimos ao invés dos 0,50 cêntimos actuais. O município pretende ainda implementar um cartão de estacionamento para comerciantes.
“Não foi este executivo municipal que trouxe estas concessões para as cidades de Ermesinde e Valongo, mas fomos eleitos para defender o interesse público e é por isso mesmo que vamos resgatar os dois contratos”, argumentou.
PSD culpa o presidente do município e diz que “a câmara foi conivente com este processo”
Do lado do PSD houve críticas. “E a câmara só percebeu agora? Permitiu que de forma abusiva os fiscais da empresa fizessem, até à data, fiscalização e caça à multa?”, questionou Luís Ramalho.
“A partir do momento que há caça à multa e comportamento abusivo e agressivo deveria imediatamente ter suspendido o processo de fiscalização com base nesse argumento. A câmara foi conivente com este processo”, acusou o vereador social-democrata.
Luís Ramalho aceitou que não foi este executivo a contratualizar estas concessões, realizadas em 2003 e 2004, na gestão do PSD, mas salientou que são os seis elementos do PS eleitos para este mandato que são “responsáveis pelo caminho que levou a esta caça à multa”. “Os contratos foram adendados por iniciativa do senhor presidente da câmara, que alegou sempre que as pessoas teriam uma tolerância de 10 minutos, algo que a empresa sempre negou e nunca cumpriu. Temos situações de multas passadas antes de terminar o tempo”, salientou.
O social-democrata sustentou ainda que não cabe à empresa, que tem interesses privados, zelar pelo interesse público, como argumenta José Manuel Ribeiro. “Compete-lhe a si garantir que a empresa não ultrapassa os limites e, de Janeiro do ano passado até agora, sempre permitiu que a empresa enganasse a população”, sustentou Luís Ramalho, afirmando que a autarquia “fez zero” para zelar pelo interesse das pessoas lesadas.
O eleito do PSD lembrou ainda que, há alguns meses atrás, o partido da oposição pediu um estado para avaliar o custo do resgate das concessões de estacionamento e água no concelho. Requerimentos que nunca tiveram resposta.
“Não quero acreditar que isto não passe de uma golpada de charme para arrancar o ano a tentar redimir-se do aumento da água e da taxa de resíduos. Diz que quer ser dos mais baratos no estacionamento. Porque não aplica isto na água e nos resíduos?”, criticou, acrescentando que este resgate também visa dar competências à Polícia Municipal que vai ser criada que estava “vazia de competências”.
“Agora diz vamos resgatar a concessão e ainda vamos receber dinheiro por isso, quando até agora sempre disse que o resgate das concessões custava vários milhões de euros”, sustentou o eleito do PSD.
Luís Ramalho apelou ainda a que o município preste apoio a quem foi indevidamente multado para que possam ser ressarcidos do dinheiro. “Até pode ter havido infracção, mas como não havia quem fiscalizasse não pode haver punição”, disse.
“Quanto me perguntam ‘quando pode custar este resgate?’ Nas nossas contas zero, mas é possível que vá parar a tribunal”
Seguiu-se uma troca de palavras e de acusações. “Registo que não falou de interesse público. Fiquei na dúvida se está interessado em defendê-lo. A sua intervenção foi uma tentativa para justificar o interesse privado”, frisou José Manuel Ribeiro. “Ninguém sabia que ia haver este comportamento agressivo da empresa. Tentei que a câmara reduzisse os riscos. Há um processo de milhões de euros a decorrer em tribunal. E fizemos um acordo para resolver alguns problemas”, salientou.
Sobre custos, o autarca acredita que não existirão. “Quanto me perguntam ‘quando pode custar este resgate?’ Nas nossas contas zero, mas é possível que vá parar a tribunal”, constatou.
“Eu não tenho que dizer que defendo o interesse público, tenho que o exercer. Quem pediu o ressarcimento aos munícipes de valores pagos indevidamente? Fomos nós. O que é que o senhor fez? Zero! Quem votou contra as medidas de renegociação destes contratos, fomos nós. Foi aprovado com seis votos a favor dos vereadores eleitos pelo PS. Aqui há duas eras. A antes adenda e a pós adenda e na antes adenda o comportamento não era este. Sabe porquê? Porque era a câmara que fiscalizava”, criticou Luís Ramalho, depois de ser desafiado pelo presidente da câmara a dizer de que lado estava da “barricada”, contra ou a favor do interesse público.
O social-democrata lembrou ainda que o aditamento aos contratos realizado em 2017 trouxe mais receitas à câmara. O presidente da câmara reconheceu que houve aumento de 4% para 7% de receita numa das concessões, mas defendeu que essa não foi a motivação da adenda. “A gestão de estacionamento não pode ser vista numa lógica de receita, tem a ver com mobilidade e comércio, mudança de comportamentos e poluição”, disse.
O eleito do PSD sustentou ainda que o partido está de acordo com o resgate da concessão, sendo que já há meses queriam começar o processo.
No concelho de Valongo há 1026 lugares de estacionamento à superfície concessionados em 19 vias da freguesia de Valongo, num total de 493 lugares de estacionamento pagos, e em 17 vias na freguesia de Ermesinde, num total de 533 lugares de estacionamento pagos.
O documento aprovado na reunião de executivo, que será remetido à Assembleia Municipal, alega “razões sérias de interesse público resultantes da implementação das novas políticas urbanas, de mobilidade e de regeneração urbana em curso nas freguesias de Ermesinde e de Valongo” para o resgate e lembra que “já decorreu mais de metade do prazo de vigência das concessões”, estando “fixado nos contratos de concessão a fórmula de cálculo do preço do resgate, que de acordo com o parecer em anexo, será no valor negativo de – €31.062,00”.
O Verdadeiro Olhar aguarda esclarecimentos da Parque VE, S.A.