Tradição dos bugios e mourisqueiros saiu às ruas de Sobrado e juntou milhares de apaixonados

Festa remete para o tempo dos conflitos entre cristãos e mouros e recebeu milhares de visitantes que apreciam a tradição

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Na segunda-feira em que se celebra o São João, a tradição saiu à rua em Sobrado, acompanhada de milhares de visitantes. As famosas Bugiadas e Mouriscadas, que remetem para o tempo dos conflitos entre cristãos e mouros, são o tema desta festa tão própria da região e que tem milhares de seguidores.

Quase não havia espaço nos passeios para assistir à Dança de Entrada. Alguns aproveitaram as varandas das suas casas, o coreto e até degraus e muros serviam de apoio para poder pôr os olhos no que se passava.

As ruas, ainda decoradas com motivos relativos ao São João com muita cor, fitas e manjericos, estavam também repletas mas de carros estacionados nos lugares mais inacreditáveis.

Foto: Ana Regina Ramos/Verdadeiro Olhar

De miúdos a graúdos, há quem venha só pela festa, mas também há quem tenha todo o orgulho em saber os pormenores da história que inspirou esta tradição. Rosa Marujo vive em Sobrado e diz que desde pequena acompanha este dia. “Gosto da história em si porque acho que é algo único”, explica.

Conta que a tradição começou com o facto de a filha do Rei da tribo dos mouros estar doente e os cristãos terem um santo que era o São João Baptista. “Eles achavam que, levando o santo, curava a filha, então, pediram-no emprestado aos cristãos. Entretanto, queriam reavê-lo e ele não queria entregar, porque achou que era importante já que tinha salvo a filha”, descreve.

Foto: Ana Regina Ramos/Verdadeiro Olhar

“Começou aí uma luta entre eles e a maneira que arranjaram para se defenderem foi mascarando-se”. Esta é uma das partes mais visíveis da festa e expressada através das várias danças.

No final do dia, há a representação da Prisão do Velho da Bugiada, que está numa roda de Mourisqueiros. Os Bugios, entretanto, conseguem ter a ajuda da Serpe para libertar o velho e recuperar a imagem milagrosa.

Foto: Ana Regina Ramos/Verdadeiro Olhar

“Acho mesmo muito lindo e fora do comum. A própria música, os guizos, as cores, tudo isso a apelar mexe com uma pessoa”, confessa Rosa Marujo. Ao lado, a amiga Zélia Almeida acredita que “quando era mais nova não existiam tantos mourisqueiros, nem tantos bugios” e confessa uma preferência por estes últimos.

Apaixonada por esta tradição é também Lucélia Ferreira, que estava vestida de bugio, como costuma fazer todos os anos. “Tenho vindo espontaneamente. É uma paixão enorme por isto, um gosto enorme fazer esta Dança de Entrada e todos os momentos aqui vividos neste dia”, revela a sobradense. Conta ainda que a família vive esta tradição e que ela, como pertencente a uma geração mais nova, pois tem 33 anos, decidiu “dar um bocadinho de continuidade a isto”.

Foto: Ana Regina Ramos/Verdadeiro Olhar

Já para Lara Reguengo, de nove anos, esta foi a primeira vez que se vestiu a rigor. Diz que todos os anos vem ver o evento e que gosta muito, então, decidiu mascarar-se.

Segundo a tradição, os bugios podem ser representados por homens ou mulheres de qualquer idade e incluem uma máscara, enquanto os mourisqueiros são reservados apenas aos rapazes solteiros. São centenas de pessoas que todos os anos dão o corpo por esta recriação, vestidas com trajes de veludo colorido.

Foto: Ana Regina Ramos/Verdadeiro Olhar

Mário Santos, de Rebordosa, estava na primeira fila com a filha Neuza, de sete anos, para tentar que ela deixasse de ter medo das máscaras, mas conta que, “de vez em quando, ainda lhe faz alguma confusão”. “Todos os anos cá vimos para fazer cumprir a tradição. Conheço-a e acho muito lindo”, afirma.

Foto: Ana Regina Ramos/Verdadeiro Olhar

Já perto da Igreja Matriz, a dança continuou durante largos minutos, acompanhando quem almoçava nas mesas ao lado, mas não sem antes haver uma pausa para os rostos respirarem.

Armando Rocha e Amélia Carreiro estavam abraçados mais à frente a apreciar o ambiente que se criava. Vivem há décadas em França, mas esta semana reservaram para vir a Portugal. De manhã até à noite, pretendiam acompanhar todas as actividades, começando pela missa. “Aqui o que é bom é a convivência, os mourisqueiros”, afirma Armando Rocha. “Gosto muito de ver também a missa e a procissão. É muito giro”, sublinha Amélia Carreiro.

Foto: Ana Regina Ramos/Verdadeiro Olhar

Se de um lado se respirava tradição e história, do outro passava, entretanto, um camião, precedido por uma carrinha, com colunas de som e música mais recente e alegre muito alta. Transportavam cartazes que satirizavam o aterro existente em Sobrado e que tem motivado muitas críticas, enquanto atiravam esponjas embebidas em água para as pessoas que passavam.

Foto: Ana Regina Ramos/Verdadeiro Olhar

Na fachada da junta era visível também uma faixa preta que apelava contra o aterro.

Esta sátira surge dias após uma caminhada de protesto que juntou 1.200 pessoas vestidas de negro contra o aterro de resíduos não perigosos da Recivalongo, em Sobrado. Há já uma petição que tem mais de 2.800 assinantes que pedem o encerramento do espaço. A população queixa-se de cheiros nauseabundos, da existência de mosquitos e está preocupada com a possível contaminação dos lençóis de água.

Foto: Ana Regina Ramos/Verdadeiro Olhar