“Portugal tem a maior taxa de cuidados domiciliários informais da Europa, a menor taxa de prestação de cuidados não domiciliários e uma das menores taxas de cobertura de cuidados formais. Segundo o International Labour Office, a escassez de trabalhadores formais configura uma limitação ao acesso a cuidados continuados de qualidade em Portugal”. A conclusão é do estudo “Acesso, qualidade e concorrência nos Cuidados Continuados e Paliativos, realizado pela Entidade Reguladora da Saúde (ERS).
O documento, que analisa a realidade da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI), abarcando as unidades e equipas de cuidados paliativos, conclui ainda que o nosso país está muito longe de atingir o número total de camas necessário para satisfazer as necessidades. A meta era de 14.640 camas, e ainda nem 50% foi atingida. A situação agrava-se tendo em conta que, em 2025, a proporção de idosos em Portugal deve atingir os 25%.
Esta semana, traçámos o retrato dos cuidados continuados na região. Há 144 camas, em quatro unidades, que recebem os utentes que entram na RNCCI e estão sempre lotadas. Uma instituição de Gandra está à procura de aumentar a oferta e tem um projecto em curso que vai integrar mais 22 camas na rede nacional.
844 utentes estavam à espera de uma cama de cuidados continuados em 2014
Quando se fala de cuidados continuados falamos de um conjunto de intervenções sequenciais de saúde e ou de apoio social, centrado na recuperação global da pessoa em situação de dependência, com vista à promoção de autonomia, através da reabilitação, readaptação e reinserção familiar e social, explica a ERS.
E este tipo de cuidados será cada vez mais necessário nos anos vindouros. “Perspectiva-se que a procura por cuidados continuados e paliativos deverá aumentar nos próximos anos na UE 28, mas especialmente em Portugal, devendo a proporção de população idosa chegar a perto de 25% até 2025”, referem as conclusões do estudo.
Apesar de estar a aumentar, todos os anos, o número de camas disponíveis está longe de ser o necessário. Segundo os dados apresentados pela ERS, a rede de camas dos cuidados continuados rondaria as 7.300, em Dezembro do ano passado. Em Setembro, o Ministério da Saúde expectava ter pelo menos 8.300 camas na RNCCI, até ao final de 2015.
Um relatório da Administração Central do Sistema de Saúde, apresentado em Maio de 2015, mostrava que o número de camas e de doentes referenciados para os cuidados continuados subiu em 2014. No final desse ano, 844 utentes estavam à espera de uma cama de cuidados continuados ou paliativos e 41.657 utentes tinham sido referenciado para integrar a rede (mais 4,4% que no ano anterior).
Portugal com a taxa mais elevada de cuidados domiciliários informais da Europa
Em Portugal, a maior parte dos cuidados são domiciliários e informais, prestados por um residente na mesma habitação, ou por uma pessoa amiga. O país tem mesmo a taxa mais elevada de cuidados domiciliários informais da Europa (12,4 %). Por outro lado, tem a menor taxa de prestação de cuidados não domiciliários (10,8 %). “A falta de trabalhadores formais em cuidados continuados na Europa resulta na exclusão do acesso a serviços de qualidade por grande parte da população idosa, encontrando-se Portugal numa das piores posições relativas quanto a este indicador, com mais de 90% da população com 65 ou mais anos sem acesso a cuidados continuados de qualidade, devido a lacunas na dotação de recursos humanos dedicados a estes cuidados”, refere o estudo.
Há 319 unidades de internamento de cuidados continuados
Até Agosto de 2015, foram identificadas 319 unidades de internamento de cuidados continuados e paliativos em Portugal. 93 delas ficavam no Norte do país. Ainda assim, são as regiões do Norte e Lisboa e Vale do Tejo onde o acesso a este tipo de internamento é mais baixo, diz a ERS.
Estas unidades são de diferentes tipologias. Existem Unidades de Convalescença, para prestar tratamento e supervisão clínica, continuada e intensiva, e para cuidados clínicos de reabilitação, na sequência de internamento hospitalar originado por situação clínica aguda, destinadas a internamentos com previsibilidade até 30 dias consecutivos; Unidades de Média Duração e Reabilitação, para a prestação de cuidados clínicos, de reabilitação e de apoio psicossocial, a pessoas com perda transitória de autonomia potencialmente recuperável, e com períodos de internamento entre os 30 e os 90 dias; e Unidades de Longa Duração e Manutenção, para prestar apoio social e cuidados de saúde de manutenção a pessoas com doenças ou processos crónicos, com diferentes níveis de dependência e que não reúnam condições para serem cuidadas no domicílio, e que visam retardar o agravamento dessa situação de dependência, favorecendo o conforto e a qualidade de vida. Depois existem ainda as Unidade de Cuidados Paliativos para acompanhamento, tratamento e supervisão clínica a doentes em situação clínica complexa e de sofrimento, decorrentes de doença severa e/ou avançada, incurável e progressiva.
Os utentes podem entrar na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados de duas formas: se estiverem internados num hospital do Serviço Nacional de Saúde; ou estando em casa ou num hospital privado, através da referenciação do médico de família.
Há 144 camas de cuidados continuados na região e não há vagas
Na região, há 144 camas que integram a Rede Nacional de Cuidados Continuados, divididas por quatro instituições.
No Hospital da Santa Casa da Misericórdia de Lousada há uma Unidade de Média Duração e Reabilitação com 30 camas protocoladas com a RNCCI. Ao lado, em Paços de Ferreira, desde 2009 que a clínica Radelfe tem a funcionar duas unidades – uma de Média Duração e Reabilitação e uma de Longa Duração e Manutenção – com um total de 49 camas.
Também o Hospital Particular de Paredes tem camas na RNCCI. Há uma Unidade de Média Duração e Reabilitação, com 17 camas e uma Unidade de Cuidados Continuados de Convalescença, com 16 camas.
Em Valongo, o Hospital de São Martinho integra a rede nacional desde 2008, com duas unidades, uma de Longa Duração e Manutenção e uma de Média Duração e Reabilitação, com um total de 32 camas.
De acordo com os dados da ARS Norte, actualizados diariamente no site desta entidade, não há vagas em nenhuma destas instituições. Há medida que os utentes recebem alta, há centenas à espera para entrar.
Funcionam ainda na região duas Equipas de Cuidados Continuados Integrados, associadas ao Agrupamento de Centros de Saúde (ACES) Tâmega II Vale do Sousa Sul e ao ACES Grande Porto III Maia/Valongo. Trata-se de equipas multidisciplinares da responsabilidade dos cuidados de saúde primários e das entidades de apoio social, que presta serviços domiciliários, a pessoas em situação de dependência funcional, doença terminal ou em processo de convalescença, cuja situação não requer internamento, mas que não podem deslocar-se do domicílio.
Rede de cuidados continuados na região
Lousada
Instituição: Hospital da Santa Casa da Misericórdia de Lousada
Tipologia: Unidade de Média Duração e Reabilitação
Número de camas: 30
Paços de Ferreira
Instituição: Radelfe
Tipologia: Unidade de Longa Duração e Manutenção
Número de camas: 27
Instituição: Radelfe
Tipologia: Unidade de Média Duração e Reabilitação
Número de camas: 22
Paredes
Instituição: Hospital Particular de Paredes
Tipologia: Unidade de Média Duração e Reabilitação
Número de camas: 17
Instituição: Hospital Particular de Paredes
Tipologia: Unidade de Cuidados Continuados de Convalescença
Número de camas: 16
Valongo
Instituição: Hospital de São Martinho
Tipologia: Unidade de Longa Duração e Manutenção
Número de camas: 16
Instituição: Hospital de São Martinho
Tipologia: Unidade de Média Duração e Reabilitação
Número de camas: 16
Equipas de Cuidados Continuados Integrados
– Paredes/Rebordosa, ACES Tâmega II Vale do Sousa Sul
– Ermesinde/Valongo, ACES Grande Porto III Maia/Valongo
IPSS Olhar Atento avançou com projecto há alguns anos, mas atrasos no financiamento fizeram com que a obra só arrancasse em 2013
Unidade que vai criar 22 camas em Gandra deve estar concluída em 2017
O projecto arrancou em 2009 com uma candidatura em Programa Modelar, mas só agora a unidade de cuidados continuados da Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) Olhar Atento está a dar passos largos em direcção à fase de conclusão.
Orçada em 1,3 milhões de euros, esta unidade de longa duração e manutenção, que está a ser construída em Gandra, vai contribuir com mais 22 camas para a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados.
O edifício já está de pé e a direcção espera ter a obra concluída no início de 2017.
“Estas unidades são necessárias como pão para a boca”
A candidatura para avançar com a construção desta unidade dedicada à prestação de cuidados continuados foi lançada em Agosto de 2009, à segunda fase do Programa Modelar.
Previa-se que o edifício, a construir na zona do novo Complexo Desportivo, em terreno cedido pela Junta de Freguesia de Gandra, teria várias valências, divididas por três pisos. O valor da obra total ronda os 1,3 milhões de euros, tendo uma comparticipação máxima de 750 mil euros.
O protocolo para a concretização deste projecto foi assinado a 5 de Junho de 2010, com a Administração Regional de Saúde, juntamente com outras 72 instituições que viram as suas candidaturas aprovadas. Ao todo o Programa Modelar 2 previa um investimento de 140 milhões de euros nesta área.
A unidade de cuidados continuados Olhar Atento deveria estar acabada em 2012, mas foi só depois dessa data que foi, efectivamente, para o terreno. “Houve um interregno devido à contenção das despesas governamentais”, explica o empresário António Rocha, actual presidente da direcção desta instituição sem fins lucrativos. A obra começou em 2013.
Dos 750 mil euros comparticipados pelo Ministério da Saúde receberam até agora uma terça parte, o que tem condicionado o avanço da obra, refere. “Temos procurado apoios, mas esta é uma altura difícil, e ninguém tem dinheiro para ajudar. Mas somos um grupo sério e temos vontade de acabar a obra”, salienta.
As previsões apontam para que o edifício, com 22 camas para utentes de cuidados continuados, esteja concluído no início de 2017. A obra vai avançando devagar e à medida das possibilidades da Olhar Atento. O edifício está de pé e pronto para a instalação das redes de electricidade e ar condicionado.
“Isto está a fazer falta. Estas unidades são necessárias como pão para a boca. E isto não é uma obra só para Paredes”, salienta António Rocha.