Na região do Vale do Sousa existem apenas dois postos de carregamento eléctricos da rede Mobi.E – Mobilidade Eléctrica: em Paredes e Penafiel. Além de serem considerados insuficientes para uma região tão vasta, estes postos estão recorrentemente fora de serviço, não podendo ser utilizados por quem optou pela mobilidade eléctrica. Em Lousada e Paços de Ferreira não existe qualquer posto instalado. O mesmo acontece aqui ao lado, em Valongo.
A situação cria constrangimentos a quem comprou veículo eléctrico, a quem resta o carregamento em casa, e a quem está em trânsito e atravessa esta região, ficando sem alternativa de carregamento.
Contactadas, as autarquias da região afirmam que aguardam, algumas há vários anos, a instalação de postos de carregamento no seu território. Algumas estão também a apostar nesta forma de mobilidade.
O Fundo Ambiental tem em curso um aviso, com dotação de 1,5 milhões de euros, que permitirá o financiamento de pelo menos 100 postos de carregamento rápido no país.
Há aviso para instalação de 100 novos postos, mas ainda não se sabe se algum virá para a região
Portugal é o quarto país da União Europeia onde se compram mais veículos eléctricos, segundo um relatório da Federação Europeia dos Transportes e Ambiente (T&E, na sigla internacional). Os dados mais recentes da Associação do Comércio Automóvel de Portugal revelam que nos primeiros sete meses de 2019 foram colocados no mercado 4.341 carros eléctricos, o dobro face a igual período do ano passado, adianta o Jornal Público.
Recentemente, em visita a Paredes, questionado sobre a mobilidade eléctrica e os incentivos concedidos, o recandidato a primeiro-ministro e secretário-geral do PS garantia que os incentivos eram para continuar. “O país perdeu muito tempo, quando a partir de 2011, desinvestiu na mobilidade eléctrica. Nós estávamos na linha da frente. Éramos o único país do mundo que tinha uma rede integrada de carregamento que, infelizmente, não foi desenvolvida e em muitos casos não foi mantida e desapareceram os incentivos à aquisição de carros eléctricos”, disse António Costa.
Contactado pelo Verdadeiro Olhar, o Fundo Ambiental confirma a existência de um aviso para Aquisição e Instalação de Postos de Carregamento Rápido de Veículos Eléctricos aberto, cuja dotação orçamental é de 1,5 milhões de euros, que permitirá o financiamento de pelo menos 100 postos de carregamento rápido. “De acordo com o regulamento constante no Aviso este abrange todo o território nacional e não prevê a priorização de nenhuma área geográfica, mas privilegia a dispersão por todo o território nacional, estipulando que o mesmo beneficiário não pode candidatar mais do que dois postos instalados na área geográfica da mesma Comunidade Intermunicipal”, explica a mesma fonte, não concretizando sobre possíveis candidaturas para instalar postos em Lousada, Paços de Ferreira, Paredes, Penafiel ou Valongo ou ao nível da Comunidade Intermunicipal do Tâmega e Sousa e Área Metropolitana do Porto. “Os dados relativos às candidaturas apenas poderão ser divulgados findo o prazo de submissão das mesmas”, aponta o Fundo Ambiental. O aviso decorre até Dezembro. Para já, nenhum dos postos existentes na região é de carregamento rápido. Esses existem apenas na zona do Porto.
Paredes quer postos em Baltar e Gandra
Até agora, nestes cinco concelhos, existem apenas dois postos de carregamento integrados na rede Mobi.E, um em Paredes e outro em Penafiel. São insuficientes para dar resposta a uma região com milhares de habitantes e, o facto de estarem frequentemente fora de serviço obriga os condutores de eléctricos a fazerem contas à autonomia quando circulam por cá.
Em Paredes, os postos ficam nas traseiras da Câmara Municipal. Nasceram de um protocolo com a JAPAutomotive e o município. Os dois postos de carregamento são ainda gratuitos, mas a situação está a ser revista face a alterações legislativas, adianta o presidente da Câmara. “Para já, quem está a suportar os custos, cerca de 300 euros mensais, é a autarquia. Na altura, foi uma forma de incentivar a mobilidade no concelho. Para dizer em Paredes há um posto de carregamento. Agora a ideia é ter mais postos e reparti-los pelo concelho”, explica Alexandre Almeida.
O município de Paredes tem uma candidatura submetida no final de 2018 para instalação de postos em dois locais: Gandra e Baltar. A ideia é ter locais de carregamento para veículos eléctricos em locais distintos do concelho e junto às saídas de auto-estrada. “Um ia ficar junto à Cespu e o outro no Centro de Baltar. Assim, enquanto carrega o carro as pessoas podem visitar e almoçar por ali”, dá como exemplo. “Faz todo o sentido ter estes postos. Há parceiros privados que também têm vontade de colocar esses postos em Paredes. Por isso, de uma forma ou de outra vamos aumentar o número de postos de carregamento eléctricos em Paredes”, acredita o autarca.
Em Penafiel paga-se a dobrar. Município aguarda instalação de novo posto há dois anos
Em Penafiel, o posto está localizado no parque subterrâneo do Museu Municipal de Penafiel. Está actualmente fora de serviço. Segundo a Placegar, que gere o parque, serão instalados novos carregadores no dia 26 de Setembro, sendo que a operação ficará a cabo da empresa Mobiletric. Ali, além de pagar o carregamento do veículo, os proprietários têm também de pagar o estacionamento ao tarifário em vigor.
Também a Câmara de Penafiel tem procurado aumentar o número de postos no concelho. “O município aguarda, desde 2017, pela instalação de um posto de carregamento para veículos eléctricos na Av. José Júlio (em frente ao Tribunal Judicial de Penafiel). Este posto será instalado pela entidade gestora da rede Mobi.E”, refere o vereador com o pelouro da Mobilidade e Transportes, Pedro Santana Cepeda. “A autarquia tem vindo a fazer diligências junto da Mobi.E para garantir que o posto de carregamento previsto há dois anos seja definitivamente instalado. A prioridade tem sido garantir que o compromisso existente seja cumprido para que, depois, possa ser iniciado um novo processo de instalação de mais pontos de carregamento”, justifica o autarca.
Pedro Santana Cepeda acredita que, com o crescimento de veículos eléctricos é preciso acompanhar a tendência com a expansão da rede de carregamento. A aposta na mobilidade eléctrica deve passar por “reforço de apoios públicos ao nível da Administração Central, para garantir que a comercialização dos veículos eléctricos é mais competitiva, através da criação de benefícios fiscais”, acrescenta o vereador.
Lousada sem nenhum posto apesar da “pressão”
“Neste momento, Lousada não tem qualquer posto de carregamento para veículos eléctricos sendo que temos vindo a fazer uma grande pressão junto da Mobi.E para que fossemos dos primeiros concelhos a serem abrangidos com estas condições, muito devido à nossa forte aposta na promoção e protecção ambiental nas mais diversas áreas”, responde a Câmara de Lousada, quando questionada. “Desde o ano de 2015 temos vindo a proceder a vários contactos com as mais diversas entidades (Ministério do Ambiente, Secretaria de Estado da Energia, Mobi.E) e de todas as vezes temos obtido respostas de que estaríamos muito perto de conseguir esta instalação, mas lamentavelmente a situação mantém-se e em claro prejuízo dos nossos munícipes e visitantes”, acrescenta a mesma fonte.
Estavam previstos dois postos de carregamento no concelho, que nunca saíram do papel. A instalação chegou a ser apontada para 2017, mas sem sucesso. “Em Junho de 2017, após mais um pedido de informações de nossa parte, obtivemos uma resposta da Mobi.E a referir que a entidade ‘lançou o concurso para a aquisição e instalação de 202 postos de carregamento normal de veículos eléctricos, a instalar em todos os concelhos do território nacional ainda não contemplados com nenhum posto da rede piloto’, e nos quais se incluiria o município de Lousada, sendo certo que seria intenção ‘proceder à colocação no mês de Setembro’ desse mesmo ano”, lembra a Câmara de Lousada.
Isso não aconteceu nem nesse Setembro nem até ao Setembro em curso. Entretanto, já este ano, e após nova insistência da autarquia lousadense, a Mobi.E terá explicado que o processo “se teria atrasado face ao concurso público internacional levado a cabo, mas que já estariam reunidas as condições legais para se iniciarem os trabalhos”. O que ainda não se verificou.
Está em fase de conclusão a instalação de dois postos em Paços de Ferreira
Em Paços de Ferreira, segundo a Câmara, “está em fase de conclusão o processo de instalação de dois postos de carga na rede Mobi-E”. A autarquia também garante que tem feito pressão para que haja postos no concelho. “Nomeadamente ao nível das acções que estão a ser tomadas para num futuro próximo alargarmos o número de carregadores para veículos eléctricos. O investimento na descarbonizacao do município é uma prioridade e apesar das conhecidas limitações financeiras, apostaremos neste tipo de investimento, amigo do ambiente”, sustenta o município.
A Câmara de Paços de Ferreira reconhece que o número de locais de carregamento é “manifestamente insuficiente em todo o país” e, consequentemente, no concelho.
A autarquia lembra que já tem vindo a apostar na mobilidade, nomeadamente com as obras de regeneração urbana em curso, bem como um conjunto de outras medidas como é o exemplo da instalação no concelho de uma rede de trotinetas eléctricas. “Para além disso, a aposta na implementação de novas alternativas de mobilidade será também alargada a outro tipo de projectos, do qual se destaca a construção de uma via ciclável que ligará os dois centros urbanos, Paços de Ferreira e Freamunde”, destaca a autarquia.
Valongo ainda não tem os dois postos de carregamento prometidos em 2015
Da mesma forma, em Valongo, se aguarda a instalação de dois postos de carregamento. Mas os “atrasos têm sido recorrentes por razões não imputáveis ao município”. “Esperamos a breve prazo a sua entrada em funcionamento”, diz a autarquia, assumindo desde já que eles serão “nitidamente insuficientes para dar resposta às necessidades da população” e que é intenção da Câmara alargar a rede.
Foi em 2011, conta a autarquia, que foi elaborada a primeira versão do Plano Municipal para a Mobilidade Eléctrica no concelho. “Valongo pretendia integrar o grupo de municípios abrangidos pela extensão de rede Mobi.E, numa fase subsequente à da rede piloto, que incluiu 25 municípios. A estratégia não avançou por terem sido retirados os incentivos inicialmente estabelecidos.
Mas nesse plano, que tinha em conta a população, estavam previstos 70 pontos distribuídos por todo o concelho, sendo 50 pontos de carregamento lento e 20 pontos de carregamento para duas rodas, em 2011-2012. “Como objectivo para o período de 2013-2015, a rede de carregamento do município de Valongo deveria cobrir toda a população do município, ficando, contudo, a expansão das áreas de carregamento pendente da evolução da procura de veículos eléctricos no município e no país.
À semelhança do que aconteceu nos outros concelhos da região, em 2015 foi publicado em Diário da República que estava prevista a implementação de dois pontos de carregamento normal a localizar na Rua Emídio Navarro, Valongo. Até agora, continuam por instalar.
Mesmo que o fossem não chegariam, acredita a Câmara. “Nos serviços do município têm sido registados pedidos de utilizadores para a instalação de postos no concelho, assim como já foi contactado por empresas para instalarem postos privados. Esta pretensão tem de ser avaliada, estando-se a estudar as condições adequadas à sua concretização, nomeadamente no que se refere à ocupação do espaço público”, explica a autarquia.
A mesma fonte acrescenta que, no âmbito dos incentivos à transição para a mobilidade eléctrica, está previsto um regulamento municipal para permitir a instalação de infra-estruturas de carregamento, estando também em estudo a implantação de empresas privadas que disponibilizam trotinetas e bicicletas eléctricas.
Proprietários de veículos eléctricos ficam sem alternativa que não o carregamento em casa
Para quem se aventurou a comprar um carro eléctrico, a inexistência de uma rede de carregamento obriga a fazer contas à autonomia dos veículos.
Pedro Luís, um gestor de marketing de 31 anos, de Lousada tem um carro com 250 quilómetros de autonomia. Faz viagens diárias em direcção ao Porto. “Carrego em casa e sempre que saio é com a certeza de que tenho autonomia para fazer os quilómetros para voltar”, explica. Porque a rede é incerta. Há pontos identificados de carregamento onde depois não é possível efectuá-los. “É preciso planeamento”, assume. Mesmo no Porto, onde há mais postos de carregamento nem sempre estão disponíveis.
“Quando adquiri um carro eléctrico já sabia o país em que estávamos, por isso comprei um carro com autonomia superior”, justifica o lousadense. A casa também já estava preparada para que pudesse ser o local prioritário de carregamento.
A família já tinha preocupações ambientais e ter um carro eléctrico foi só mais uma fase. “Tenho notado que há mais investimento nestes veículos, não tanto por questões ambientais, mas porque é mais barato”, realça.
Por isso, acredita que a rede de postos irá crescer, mas sem ilusões. “Acho que não será para breve”, comenta.
Carlos Machado, advogado de Paços de Ferreira com escritório em Lousada, tem um carro eléctrico há três anos. Optou por esta solução pelo preço dos combustíveis e também pela questão ambiental. “Tinha expectativas que se ia desenvolver muito mais depressa. Isto está extremamente atrasado. Devia de haver pelo menos um posto em Paços de Ferreira e outro em Lousada”, defende. “Mesmo os postos que existem muitas vezes chega-se lá e estão avariados. É preciso que seja feita manutenção”, critica.
Carrega o carro em casa. Tem autonomia para 400 quilómetros. Os problemas surgem quando há deslocações maiores. “A rede não está preparada para dar resposta às necessidades das pessoas, mesmo em termos de circulação nas auto-estradas. O meu carro é só eléctrico e não tenho alternativa. Nunca fiquei sem carga porque tomo precauções, mas às vezes fico aflito. Por exemplo, numa viagem entre Porto e Aveiro, pela auto-estrada do litoral não há nenhum posto de carregamento”, explica, assumindo que escolhe percursos em função dos postos de carregamento existentes.
O Verdadeiro Olhar questionou a Mobi.E sobre se haveria novos postos a instalar nestes concelhos, se considera o número de postos existentes nesta região como suficientes e se têm existido reclamações quanto a avarias, mas não recebeu resposta.