Penafidelense foi para a Marinha por “impulso”. Acaba de terminar missão como Comandante da Zona Marítima do Sul

Capitão-de-mar-e-guerra, Fernando Rocha Pacheco tem 54 anos e já participou em vários exercícios e operações reais

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Há muito que a vida levou Fernando Rocha Pacheco para longe de Penafiel. O seu porto é o Algarve, mais concretamente Faro. Ainda assim, não esquece a terra que o viu nascer.

Oficial da Marinha, o Capitão-de-mar-e-guerra ocupou, até hoje, vários cargos. Acaba de terminar a missão como Comandante da Zona Marítima do Sul (função militar no âmbito da Marinha), e também de Comandante Regional da Polícia Marítima do Sul, Chefe do Departamento Marítimo do Sul, Capitão do Porto de Faro, Comandante Local da Polícia Marítima de Faro e Director do Museu Marítimo Almirante Ramalho Ortigão, sendo estes cinco últimos cargos em funções não militares, no âmbito da Autoridade Marítima Nacional.

Aos 54 anos, adora o mar e aquilo que faz. Já participou em vários exercícios e operações reais em unidades navais e consta com várias medalhas e louvores no currículo.

Entrou na Escola Naval em 1986

Fernando Rocha Pacheco ainda guarda na memória a forma como cresceu a brincar na rua em Penafiel – a jogar ao espeto, pião, carica, escondidas, saltos e a fazer corridas com carros de rolamentos -, com os colegas de escola e vizinhos, e também a ajudar os pais nas tarefas de casa e no quintal. Eram tempos de liberdade. “Ainda hoje tenho uma marca na testa (quase imperceptível, mas eu sei que está lá!) de uma pedra das balizas de rua que foi arremessada, porque um carro precisava de passar, encontrando como obstáculo a minha testa!!! Claro que hoje seria impossível jogar futebol nessa rua, atendendo à evolução do trânsito!”, conta.

Foto: DR

O seu percurso escolar passou primeiro pela Pré-escola na Sagrada Família em Penafiel, Escola Primária Conde Ferreira, em Penafiel, Escola Preparatória de Penafiel, por um Seminário em Gondomar e pela Escola Secundária de Penafiel, onde foi vice-presidente da Associação de Estudantes durante o 12. º ano. Também frequentou o Instituto de Francês do Porto (pólo de Penafiel). Era bom aluno, admite. E sobretudo considera que a formação é uma dádiva, que não deve ser “desperdiçada”. 

Na família não havia ligações à vida militar e a decisão de ir para a Escola Naval surgiu “por impulso”, refere. Na altura apenas teria andado de barco “na travessia do Rio Tejo e, esporadicamente, também em barcos a remos ou a pedais”.

“Tinha acedido à Universidade no curso que tinha escolhido (Engenharia Electrónica e Telecomunicações), tinha-me matriculado na Universidade (de Aveiro), tinha tratado de alojamento (iria ficar em casa do pai de um dos meus futuros professores, amigo de um tio). Contudo, nesse Verão, e porque tinha família a residir próximo da Escola Naval, onde pontualmente passei férias em anos anteriores,  decidi concorrer à Escola Naval”, recorda Porquê? “Foi um impulso, sem explicação fundamentada, até umas semanas antes de concorrer nunca tinha pensado nisso sequer”, relata o penafidelense. “Em jovem pensei em muitas profissões, sempre ligadas à área de ciências/engenharias de preferência. Curiosamente na Escola Naval, não segui a área de engenharia (de entre as áreas de Marinha, de engenharia mecânica, de engenharia de armas e electrónica, de administração naval e de Fuzileiros, à época), pois a área de Marinha (à qual concorri) abria-me possibilidades de carreira dedicada às operações e ao Comando que nas outras estaria limitado”, explica.

Candidatou-se e prestou provas e a 1 de Outubro de 1986 entrou na Escola Naval. Terminaria o curso de Ciências Militares Navais em 1991. “Durante o curso a ligação à Marinha foi-se sedimentando, sem que nunca colocasse a hipótese de desistência. O meu gosto pela Marinha ia aumentado cada vez que embarcava (e fazíamo-lo sempre no final de cada ano lectivo e pontualmente em embarques de fim-de-semana durante o ano lectivo), onde para além de pormos em prática os conhecimentos adquiridos na Escola Naval, poderíamos desfrutar da magia de estar no mar e da vivência nos portos, com diferentes geografias, tradições e culturas”, elenca Fernando Rocha Pacheco.

Além da Escola Naval, frequentou a Escola de Comunicações, onde efectuou pós-graduação/especialização em comunicações e guerra electrónica, o Instituto Superior Naval de Guerra, onde fez o curso de promoção a oficial superior, a Escola de Tecnologias Navais da Armada, e a Escola NATO na Alemanha, Itália, Bélgica, onde efectuou diversas açcões de formação complementares, workshops e seminários em diversos países da NATO.

Foto: DR

Estava no Golfo Pérsico quando começou a Guerra do Golfo

Nas suas funções a bordo de unidades navais, no mar, participou em vários exercícios e operações reais. Como oficial subalterno desempenhou as funções de Chefe de Serviço de Comunicações, Oficial de Operações e Oficial Imediato em diversos navios de guerra portugueses. Os navios em que prestou serviço incluem os patrulhas “Geba” e “Cuanza”, as corvetas “João Coutinho” e “Oliveira e Carmo” e a fragata “Comandante João Belo”.

Já como oficial superior, no período de Janeiro a Junho de 2003, embarcou no navio “destroyer” Italiano “ITS Francesco Mimbelli” onde assumiu as funções de Chefe da Divisão de Comunicações e Sistemas de Informação do Estado-maior do Comandante do Grupo-tarefa da EUROMARFOR e da Força Tarefa 150, participando nas operações reais “Resolute Behaviour” e “Enduring Freedom”, nas áreas do Mar Vermelho, Golfo de Adem, Mar Arábico e vizinhança da Somália, em apoio à Guerra Global contra o Terrorismo. “Estava no Golfo Pérsico quando começou a segunda Guerra do Golfo ou Guerra do Iraque! Claro que nesse período passou a haver mais apreensão e receio, principalmente nas escalas em porto”, recorda.  

No período de Dezembro de 2010 a Agosto de 2012, foi Chefe do Estado-maior da Força Naval Portuguesa onde, para além de diversos exercícios, participou na operação real Manatim, na vizinhança da Guiné-Bissau, “em preparativos para uma operação de evacuação de não combatentes, que não se chegou a concretizar, pois foi possível a estabilização do país”.

Já segundo o extenso currículo, em terra prestou serviço como Chefe do Gabinete de Tecnologia Educativa, na Escola de Comunicações, Oficial de Estado-maior nas Divisões de “Plans & Policy”, “CIMIC (Civil Military Cooperation) e na Divisão de Comunicações e Sistemas de Informação, no comando NATO Joint Command Lisbon e na “Joint Capability Planning Division – Strategic Management Section” no NATO – Supreme Headquarters for Allied Powers in Europe (SHAPE), na Bélgica. Foi ainda Capitão do Porto e Comandante Local da Polícia Marítima, de Tavira e de Vila Real de Santo António, onde foi membro da Comissão Internacional de Limites entre Portugal e Espanha, Segundo Comandante da Esquadrilha de Navios Patrulhas, Oficial de Estado-maior na Divisão de Planos do Comando Conjunto para as Operações Militares, Adjunto Militar (Marinha) no Gabinete do Chefe do Estado-maior General das Forças Armadas (CEMGFA) e Adjunto para a Coordenação do Comando-Geral da Polícia Marítima.

Desde 10 de Outubro de 2019 desempenhava vários cargos, como referido: Comandante da Zona Marítima do Sul, Chefe do Departamento Marítimo do Sul, Comandante Regional da Polícia Marítima do Sul, Capitão do Porto de Faro, Comandante Local da Polícia Marítima de Faro e de Director do Museu Marítimo Almirante Ramalho Ortigão.

Foto: DR

Essa elevada diversidade de funções/tarefas, com elevada diversidade de interlocutores internos e externos traz como dificuldade “a gestão do tempo” e uma “necessidade de dedicação 365 dias e 24 horas, com todo o impacto que isso tem na vida pessoal e principalmente na família mais próxima”. “Para além da elevada quantidade de tarefas de rotina existe um elevado número de actividades inopinadas co-relacionadas com as responsabilidades nas áreas de defesa, de security e de safety em que é necessário dar resposta imediata, independente do dia e hora”, sustenta Fernando Rocha Pacheco, que se diz apaixonado pelo que faz.

Gosta do mar e apaixonou-se pelo Algarve

“Gosto muito do mar, da diversidade de funções e tarefas e do retorno dos interlocutores e cidadãos na generalidade quanto ao serviço público prestado, quer militar quer não militar”, assegura o penafidelense. O Capitão-de-mar-e-guerra também não está preocupado com o futuro. “A Marinha e Autoridade Marítima Nacional já me deram oportunidade de fazer praticamente tudo o que gostaria, pelo que neste momento a minha expectativa é apenas de ser útil no que me for requerido, ao serviço do país”, sustenta.

Ao longo da sua já extensa carreira, recebeu vários louvores e medalhas – que incluem quatro de Serviços Distintos prata, de Mérito Militar de 2.ª e 3.ª classe, de Cruz Naval de 2.ª e 3.ª classe, de Comportamento Exemplar – ouro e prata, duas de Comissão Especial, com a legenda Somália 2003 e Guiné 2012, e de Cruz Comemorativa – Pela Segurança (Itália), com a legenda Afeganistão 2003. “São o reconhecimento público pela entrega, dedicação e valores colocados ao serviço da causa pública, da nação e do país”, confirma.

Questionado sobre a responsabilidade de liderar tantos homens e mulheres, Rocha Pacheco afirma que “a responsabilidade advém da missão que nos é entregue, priorizando sempre a missão, o grupo e o indivíduo”. “Claro que quanto mais for possível elevar os níveis de motivação individual, onde a liderança é fundamental, mais facilmente se conseguirá congregar o grupo e atingir os objectivos da missão. Mas, sim, o líder tem uma grande responsabilidade na concretização dos objectivos da missão e na manutenção da coesão do grupo, no respeito pelos valores intrínsecos à condição militar, mas não só”, argumenta.

Foto: DR

O penafidelense reside em Faro e admite que “por razões de vida profissional,  pessoal e familiar” mantém “forte ligação à região”. “Família e parte dos meus melhores amigos de longas décadas residem ou têm fortes ligações ao Algarve”, justifica o pai de um menino de 10 anos. “É uma região que me apaixona, nesta costa orientada a Sul de águas mais quentes, sob influência da proximidade com África,  e mais protegida da agitação marítima, normalmente proveniente de Noroeste (estando por isso, a zona mais próxima de costa, protegida pela costa oeste, onde se sente mais o efeito da ondulação) e protegida dos ventos/ nuvens pela serra, a Norte, criando condições para um clima especial, onde praticamente todos os dias é possível ver-se o sol, com temperaturas moderadas e, ar puro”, descreve. A par disso, Fernando Rocha Pacheco destaca “a ausência de trânsito automóvel intenso, diminuindo os níveis de stress associado (não existem buzinadelas) e encurtando os tempos de deslocação (à excepção de 15 de Julho a 15 de Agosto, claro!)”. “O Algarve tem sol, mar, sossego, tranquilidade, ar puro e segurança, este último aspecto para o qual muito me orgulho de contribuir”, resume.

Ainda regressa a Penafiel, uma a duas vezes por ano, para visitar a família, mas não conta regressar. Acompanha a evolução da terra, mesmo que à distância, e aponta a “salutar evolução, quer nas infra-estruturas quer na cultura”. Só lamenta que o futebol profissional tenha “estagnado”.

Penafiel “é uma cidade muito bonita, razoavelmente dotada de boas estruturas, com gente muito boa, amiga e acolhedora, que gosto sempre de revisitar, e na qual me sinto tranquilo e em casa”, garante.