Susana Magalhães, de 45 anos de idade, residente em Mouriz, Paredes, é uma mulher igual a tantas outras, com uma vida repleta de projectos e sonhos e uma filha, a quem subitamente foi diagnosticado um cancro da mama.
A sua vontade de superar este desafio a par da força que lhe tem sido dada pela família e pelos amigos mais próximos têm sido o seu fiel da balança e suporte para continuar a lutar numa luta desigual mas que acredita que vai vencer.
Apesar deste momento difícil, a jovem conhecida pelo optimismo e a positivismo com que enfrenta os desafios, está determinada em vencer mais esta adversidade e continuar em frente, como sempre fez.
No dia em que se assinala o Dia Mundial de Luta Contra o Cancro, partilhamos com o leitor a história de uma mulher que é verdadeiramente uma guerreira. A engenheira alimentar, fala da forma como o cancro a transformou, da positividade que tem mantido ao longo deste processo, assim como das mensagens de motivação e de apoio que tem recebido.
“Estou a travar uma luta, sou mais forte que o cancro e vou ganhar”, garante.
“É como se me tivessem tirado o tapete”
Foi em Outubro que foi diagnosticado o cancro a Susana Magalhães, engenheira alimentar.
“Estava ver um filme e após um toque na zona do peito pressenti que tinha algo de diferente. De imediato fui verificar os exames que tinha feito em Abril e verifiquei que estava tudo bem. Fui ao médico de família e disseram-me para voltar logo no dia a seguir. Achei estranho porque habitualmente marcam com uma semana, quinze dias, e isso fez adensar as minhas dúvidas. Fui fazer o exame e mal a médica da clínica meteu o aparelho disse-me que era muito mau, que tinha uma coisa muito feia e eu nesse instante fiquei em pânico. Recordo-me de ter dito à médica que tinha feito um exame em Abril e o mesmo ter dado negativo. Ela foi ver os exames e confirmou que na mamografia não aparecia nem uma pintinha”, disse, salientando que o seu carcinoma designa-se de invasor triplo negativo, sendo de crescimento rápido, um dos mais agressivos a nível de cancro da mama.
“Tinha já dezassete milímetros. De Abril para Outubro cresceu rapidamente. A médica disse-me que pode ter começado em Julho ou Setembro, não se sabe. Entretanto, entrou outro médico na sala e logo ali ficou definido que tinha de fazer uma biopsia. É como se me tivessem tirado o tapete. Recordo, que à data, mesmo sem ter o diagnóstico e a biopsia, os médicos já me tinham avisado para a possibilidade de ser cancro. Fiz a biopsia e o médico confirmou”, avançou, salientando que nesse dia chorou de manhã à noite.
Quando teve a confirmação do carcinoma, Susana Magalhães foi de imediato assolada por um conjunto de perguntas: “Porquê eu?”, “Porque é que me aconteceu a mim?” “O que é que eu fiz para merecer isto?” ou “Onde é que eu errei?”.
“São daquelas situações que ninguém controla. Naquele momento não queria aceitar o que me estava a acontecer. Pensei, isto não me estar a acontecer a mim, é mentira. Naquele instante senti-me completamente perdida”, recordou, sustentando que mais tarde se deslocou ao Porto para ser analisada por um médico especialista no cancro da mama.
“A minha irmã falou-me num médico do Porto especialista neste tipo de cancro. Fui com ela e confesso que foi uma pessoa que entrou na minha vida que me ajudou imenso. Repeti uma outra biopsia no Hospital da Luz e voltei uma semana depois e o médico confirmou que era um carcinoma invasor triplo negativo, invasivo e de crescimento rápido”, concretizou, salientando que o seu processo foi posteriormente transferido para o IPO do Porto.
“Em três dias passei para o Instituto Português de Oncologia. Estou a fazer quimioterapia, vou no quarto ciclo, faço reforços o que faz com que faça quimioterapia todas as semanas”, avançou.
“Não foi propriamente cortar o cabelo que me custou, foi vê-lo cair. Pensamos que ele vai cair sem darmos conta, mas não, ele caiu de um dia para o outro”
Susana Magalhães reconheceu que a quimioterapia inevitavelmente acabou por lhe provocar alterações significativas no seu organismo.
“Neste momento vou a meio do tratamento, faltam mais quatro sessões. Até este momento já fiz 10 sessões de quimioterapia. E faço reforços, que é metade da dose do ciclo. Em vez de tomar 200 mililitros faço 100. Quanto mais sessões eu faço, mais debilitado o meu corpo se começa a sentir. Costumo dizer que dois a três dias estou ‘off’. O primeiro dia é para dormir, venho dopada. No segundo dia o meu corpo começa a reagir à medicação e no terceiro dia ainda estou mais debilitada que no segundo dia. Regressam as diarreias, os enjoos, o mal-estar”, descreve.
“Não foi propriamente cortar o cabelo que me custou, foi vê-lo cair. Pensamos que ele vai cair sem darmos conta, mas não, ele caiu de um dia para o outro. Acorda-se, vai-se tomar banho e o cabelo sai às mãos cheias. No meu caso, passei-me peguei na máquina e cortei-o. Ninguém mo queria cortar e optei por fazê-lo eu própria com a ajuda da minha filha de 14 anos. Fiquei também com pigmentação vermelha porque eu reajo ao sol. A medicação escurece a pele e com o sol ainda fico pior. Não gosto desta parte, mas estou a adaptar-me e até costumo dizer quem não gostar que não olhe”, assegurou, sublinhando que no dia-a-dia tenta agir com normalidade.
“Pode parecer um contra-senso, mas estas situações dão-nos mais força para aguentar todas as situações e como tenho uma filha que participa nestas cosias, tendo a agir de uma forma natural, que ela ache que isto é uma coisa natural para também para ela não ficar debilitada nem enfraquecida. A minha filha reage para comigo como se eu tivesse uma gripe, basicamente”, acrescentou, adiantando que passado uma semana de saber do carcinoma deu conhecimento à filha.
“Agora, não vai ser este obstáculo que me vai impedir de fazer o que quer que seja. Não penso que isto vai correr mal”
“Ela é uma jovem dinâmica, frequenta o ensino articulado na Secundaria de Paredes, e apercebeu-se que se passava alguma coisa porque deixei de trabalhar. Começou a questionar-me porque andava sempre a fazer exames e a correr para os médicos. Pedia-me para não lhe mentir, ouvia a minha mãe e a minha irmã, que têm sido ajudas prestimosas, e tive que lhe contar. Disse-lhe que tinha cancro da mama, que não era dos mais graves, que era dos mais simples, que era para ela não ficar preocupada, mas que teria de passar por todos os processos que um cancro da mama obriga, a quimioterapia, a cirurgia, a medicação e tudo isso teria implicações no meu comportamento, o ficar maldisposta, ter enjoos. Disse-lhe que me iria ver mais alterada, mas que tudo isso faria parte do tratamento”, confessou, assumindo que a menor hoje encara a situação de uma forma normal.
“Após a explicação que lhe dei, ela fez algumas pesquisas, mas acabou por desistir porque achava que toda a gente morria. Recordo-me de lhe ter pedido para não pesquisar e informei-a que em termos de recuperação, 98% das pessoas conseguem ter sucesso. Costumo até dizer que há cerca de nove anos tive um acidente, um choque frontal, em Penafiel, cujas consequências poderiam ter sido bem mais trágicas. Fiquei encarcerada dentro do meu carro, com a parte da frente da viatura quase encostada ao meu corpo. Por milagre sobrevivi. Tive sorte. Agora, não vai ser este obstáculo que me vai impedir de fazer o que quer que seja. Não penso que isto vai correr mal. Passamos por fases difíceis, o nosso corpo fica debilitado, mas temos que nos adaptar”, expressou.
“A minha vida não é fácil, se quero alguma coisa tenho de trabalhar, sempre tive que lutar pelas coisas, e como estou habituada a isso é por isso que digo que não tenho depressões nem tempo para pensar na parte negativa de tudo isto”
Falando das limitações físicas e do efeito no organismo da quimioterapia, Susana Magalhães confirmou, ainda, que se viu privada de realizar algumas das tarefas domésticas que habitualmente costumava fazer.
“Deixei de fazer as tarefas da cozinha, com as biopsias que fiz, com o cateter que tenho não posso fazer esforços para que não haja danos. O simples subir umas escadas parece que faço uma maratona, o fazer uma máquina de roupa parece que trabalhei o dia todo e fico com o coração acelerado. Adorava fazer desporto, coisa que tive de deixar de praticar”, concretizou, asseverando sentir mais as alterações físicas que as mentais, embora estas também sejam uma realidade.
“Há pessoas que com qualquer coisa ficam logo com depressões, ficam em baixo e sentem-se derrotadas. No meu caso, não tenho tempo para isso. A minha vida não é fácil, se quero alguma coisa tenho de trabalhar, sempre tive que lutar pelas coisas, e como estou habituada a isso é por isso que digo que não tenho depressões nem tempo para pensar na parte negativa de tudo isto. Encaro tudo isto como me tendo acontecido uma coisa má, à qual tenho de dar a volta e encontrar uma solução. Não sou uma pessoa negativa, sou por natureza optimista, determinada. Estou há 14 anos com a minha filha e como mãe tenho de cuidar dela, não tenho ninguém basicamente que cuide de mim. Sou uma pessoa independente e não vou atrás de ninguém para resolver as coisas”, afiançou, reconhecendo que a sua determinação e a ajuda da família mais próxima têm sido determinantes para ultrapassar todos os momentos.
“A minha mãe, que tem 73 anos e a minha irmã têm sido incansáveis no apoio que me têm dado. A minha mãe, apesar da sua idade, tem-me levado ao IPO, Vai comigo ao Porto, aos tratamentos. O mesmo acontece com a minha irmã. Têm sido seguramente a minha rectaguarda. Os meus dois braços. As minhas confidentes e o meu suporte emocional. Por isso, faço tudo para ultrapassar este momento mais difícil e não quero que quem está à minha volta fique mais debilitado, em especial a minha filha, que é a minha parceira”, manifestou.
Ao nível profissional, Susana Magalhães admitiu que as implicações físicas levaram-na a meter baixa. “Deixei de trabalhar, perco a semana toda. Se fizer quimioterapia à segunda-feira só na quinta é que começo a melhorar e não existe nenhuma empresa que me queira a trabalhar só um dia por semana. Optei por meter baixa”, avançou, salientando que o apoio dos amigos mais próximos tem sido fundamentais para ultrapassar esta fase.
“Dizem que sou uma guerreira. Quero acreditar que sim. Estou a travar uma luta, sou mais forte que o cancro e vou ganhar”
Apesar dos tratamentos estarem ainda a meio, Susana Magalhães acredita que poderá não evitar a cirurgia. “A quimioterapia acaba em Abril, tenho cirurgia e depois não sei se irei fazer radioterapia e mais quimioterapia, mas estou optimista e confiante. Quero terminar a quimioterapia porque verifico que o meu corpo está bastante debilitado. A parte mental controlo, mas a parte física não dá para controlar. Estou aqui para colaborar com os médicos. Detesto agulhas, tirar sangue, cirurgias, mas quero colaborar em tudo. Vou repetir todos os exames para ver o tamanho do cancro e só depois saberei se vou fazer cirurgia. Já estou a fazer planos e estou a preparar-me para este cenário. Talvez para Abril faça logo a cirurgia”, referiu, sustentando que cada pessoa reage de forma diferente, mas 90% do sucesso no tratamento está na cabeça das pessoas”.
“Dizem que sou uma guerreira. Quero acreditar que sim. Estou a travar uma luta, sou mais forte que o cancro e vou ganhar. Costumo dizer que isto é um alerta, uma chamada de atenção. Não aprendi da primeira vez quando tive o acidente. Alguma coisa que tenho de mudar na minha vida e que não estou a perceber o que é. Eu tenho de perceber o que é que não quero ir à terceira, mas acredito que vou superar”, declarou, justificando o número de cancros que têm surgido com o stress, os objectivos que todos temos de cumprir, a pressão do mercado de trabalho, o cumprimento dos prazos e o corre-corre do dia-a-dia.
Segundo o Observatório Global de Cancro, Portugal registou 58.199 novos casos de cancro, prevendo-se um aumento para 69.565 em 2040. A mesma fonte adianta que um em cada três cancros podem ser evitados com a redução dos riscos comportamentais.
Já a Organização Mundial de Saúde (OMS) defendeu que número de casos de cancro nos próximos 20 anos deverá aumentar 60%. As estatísticas revelam que o cancro do pulmão continua a ser o mais letal nos homens, e o cancro da mama atinge mais as senhoras.