Foto: DR/CASES

Há muito que José Henriques, de Rebordosa, tinha especial curiosidade em relação ao cooperativismo, até porque existiam em Paredes vários exemplos a este nível (água, luz, agrícolas e até de habitação).

No âmbito do mestrado que realizou, em Gestão e Regime Jurídico-Económico da Economia Social, no Instituto Superior de Contabilidade e Administração do Porto do Instituto Politécnico do Porto, resolveu dedicar a tese ao tema “As Cooperativas de Distribuição de Água do Sul do Concelho de Paredes”.

O trabalho, realizado durante o ano de 2021, procurou “compreender a capacidade de criação de valor social e económico na oferta de um serviço de distribuição de água, em rede, promovido e empreendido pelas cooperativas de distribuição de água localizadas na parte sul do concelho de Paredes”. “Para o efeito, pretendeu analisar e reflectir sobre as motivações subjacentes à criação destes empreendedorismos sociais, a exploração da oportunidade identificada, os modelos de gestão assumidos no exercício da missão social e a implementação de estratégias para a sustentabilidade económica e social das cooperativas”, lê-se.

Essa tese foi distinguida no passado mês de Fevereiro, em Lisboa, no âmbito do Prémio Cooperação e Solidariedade António Sérgio. Criado pela CASES – Cooperativa António Sérgio para a Economia Social, em 2012, este galardão “destina-se a homenagear as pessoas singulares e colectivas que, em cada ano, mais se tenham distinguido no sector da Economia Social ou na divulgação da personalidade, actividade cívica e obra de António Sérgio”. Ao todo foram distinguidos sete projectos em diferentes categorias, sendo ainda atribuído o mesmo número de menções honrosas. O trabalho de José Henriques foi premiado na categoria de Estudos e Investigação.

Há cinco cooperativas entre os cinco sub-sistemas

“Em Portugal, não existem cooperativas de água além das de Paredes”, sendo este “caso único”, relata o consultor de gestão de Rebordosa, que se focou na análise da forma como a comunidade se organizou nestes moldes para obter vantagens financeiras e sociais, conseguindo levar água ao domicílio, o que antes não acontecia.

Foi realizada uma investigação teórica e foram também recolhidos dados empíricos junto das cinco cooperativas existentes entre os 11 sub-sistemas a funcionar no Sul do concelho de Paredes, em Parada de Todeia, Sobreira, Recarei e Aguiar de Sousa, para suprir as necessidades no abastecimento de água: a ALVRAGUA – Cooperativa de Prestação de Serviços de Fornecimento de Água Domiciliária em Alvre; a CADOPATO – Cooperativa de Água Domiciliária de Parada de Todeia; a Cooperativa Popular Águas de Casconha; a COOPÁGUA – Cooperativa Popular Águas do Centro da Sobreira e a POVAR – Serviço de Água Domiciliária de Recarei.

 “Pretende-se com esta dissertação compreender a capacidade de criação de valor social e económico na oferta de um serviço de distribuição de água, em rede, promovido e empreendido pelas cooperativas de distribuição de água localizadas na parte Sul do concelho de Paredes”, descreve José Henriques. “Para o efeito, pretendeu-se analisar e reflectir sobre as motivações subjacentes à criação destes empreendedorismos sociais, a exploração da oportunidade identificada, os modelos de gestão assumidos no exercício da missão social e a implementação de estratégias para a sustentabilidade económica e social das cooperativas”, acrescenta o autor, que recolheu dados e realizou entrevistas aos responsáveis pela gestão das cooperativas em causa, falando ainda com cooperadores fundadores, entre outros.

“A análise dos resultados evidenciou que a oportunidade social se desenvolveu através da mobilização de moradores que encontraram nas cooperativas o modelo de gestão e a forma de organização empresarial para executarem esta missão social. A dimensão social não se dissociou da dimensão económica no desenvolvimento de estratégias de modo a assegurarem a sustentabilidade das organizações”, refere.

“Dignidade da pessoa humana”, “conforto e na higienização das habitações e “fornecimento de água potável e limpa” foram motivações

“A partir dos anos oitenta do século passado, nas freguesias situadas no Sul do concelho, as populações sentiram necessidade de obtenção de água através de redes de distribuição domiciliária. Assistiu-se nas freguesias de Gandra, Baltar, Parada de Todeia, Sobreira, Recarei e Aguiar de Sousa ao surgimento de grupos de populares que se organizaram e que materializaram esses empreendimentos em onze sub-sistemas, nomeadamente, três associações, cinco cooperativas, dois incorporados em juntas de freguesia e um numa cooperativa de habitação”, explica o trabalho de José Henriques.

Assinala ainda que, a partir de 2020, a ERSAR deixa de reconhecer as cooperativas como sub-sistemas, passando a ser a Câmara Municipal de Paredes a “entidade gestora” e passando as zonas de actuação das cooperativas a ser designadas “como zonas de abastecimento” no que toca aos Planos de Controle e Qualidade da Água (PCQA).

Recorde-se que, entretanto, a autarquia de Paredes concretizou o processo de resgate de concessão de água à Be Water, criando serviços municipalizados de água e saneamento, mas mantêm-se, para já, em funcionamento os sub-sistemas existentes, continuando a ser o município que reporta os resultados das análises à qualidade da água.

José Henriques concluiu que “as principais motivações subjacentes à criação destes empreendimentos evidenciam-se no cumprimento de um direito fundamental que advém do princípio da dignidade da pessoa humana, no conforto e na higienização das habitações, que as cooperativas materializam, no fornecimento de água potável e limpa” e que “a missão das cooperativas surge como o resultado de uma actividade de prestação de um serviço que beneficia e é valorizado por moradores que não sentiam essa necessidade ser respondida pelas iniciativas implementadas pelo Estado ou pelo mercado (falha de mercado da água como bem público) e sinalizaram-na como oportunidade social a ser suprida”, criando valor social e económico.

Associação VERDE de Lousada também distinguida

O Prémio Cooperação e Solidariedade António Sérgio também distinguiu, com uma menção honrosa, na categoria Inovação e Sustentabilidade, a VERDE – Associação para a Conservação Integrada da Natureza, de Lousada, e o projecto Carbono Biodiverso, “que compensa a pegada carbónica de cidadãos e empresas através da preservação das Gigantes Verdes junto dos proprietários locais e de acções de plantação de árvores nativas e restauro ecológico”. “Os Cuidadores de Gigantes têm como benefício a possibilidade de receber uma remuneração financeira, por garantirem o compromisso de preservação das Gigantes Verdes existentes; acompanhamento técnico e científico, por parte da VERDE, na conservação da sua árvore; e o acesso a uma comunidade de Cuidadores onde são partilhadas boas práticas de gestão. Os Guardiões de Gigantes, que são os clientes do Carbono Biodiverso, compensam a sua pegada ecológica, através de planos mensais, que financiam as actividades de conservação dos Gigantes Verdes junto dos seus Cuidadores”, lê-se.