Durante a ultima semana, Ricardo Robles tornou-se a figura mor da imprensa nacional. Em poucos mais de 24 horas, entre um tweet onde criticava a especulação imobiliária até se tornar manchete do Jornal de Negócios, é revelada a marca infama da hipocrisia: enquanto na sua vida publica critica os especuladores e assume-se com o defensor dos desprotegidos, na sua vida privada lucra milhões com a especulação.
A imagem de um novo político que deu a cara nos cartazes e nas ruas de Lisboa contra a especulação imobiliária, contra os despejos, contra os abusos do alojamento local, contra a gentrificação das zonas históricas, afinal, é ele mesmo um especulador imobiliário, que despeja os inquilinos e que faz a gentrificação da zona histórica. O homem que há pouco tempo proclamava ter orgulho nas ocupações ilegais de casas, que incentivava grupos de moradores de Alfama nas suas acções de agit prop contra os investimentos de proprietários, é ele mesmo um especulador submisso à vontade do capital.
Não é preciso sermos muito criativos, para imaginar o ambiente gélido que se deve ter feito sentir na sede do Bloco de Esquerda quando a notícia começou a circular na imprensa nacional e se percebeu que o país ia passar os próximos dias a discutir a coerência dos políticos. Mas, desta vez algo diferente: a coerência de uma das suas jovens promessas.
Catarina Martins, líder do BE, veio prontamente defender uma das suas estrelas dizendo que Robles nada tinha feito de errado, que era tudo uma cabala contra ele e contra o Bloco, uma reacção dos grandes grupos económicos para denegrir a imagem do Bloco e dos seus agentes e assim limitar a luta contra os interesses imobiliários. Nada mais errado.
O Bloco vive ancorado numa suposta superioridade moral distribuindo juízos de valor sobre os seus adversários políticos, agentes económicos e sociais que deles discordem, transformando o mesmo debate num combate moral e não político.
Não se limitam a discordar das propostas: o Bloco acusa os seus adversários de serem manipulados por forças e poderes obscuros. O Bloco não se limita a discutir as políticas de apoio à habitação, mas sim acusar os proprietários de apenas procurarem o lucro desmedido e de se vergarem perante o interesse do capital. Ao Bloco não basta discordar, precisa de moralizar a vida política.
É esta a marca identitária do Bloco.
O caso Robles trouxe, finalmente, para a praça publica a discussão sobre os vícios do Bloco e da esquerda caviar, como se alguém ou alguma ideologia carregasse consigo a exclusividade da transparência e do rigor.
Mas, caro leitor, não pense que este caso é exclusivo do arco governativo nacional.
Em Paredes vivemos tempos semelhantes. Ancorados numa suposta superioridade moral , o Partido Socialista refugia-se em acusações gratuitas e juízos de valor aos seus adversários políticos, transformando o debate político da nossa terra num combate de moralismo e não de ideias ou projectos políticos.
O que no passado acusavam de ser nomeações para ajudar os amigos partidários, hoje é para ajudar a Gestão Camarária. O que no passado não passavam de adjudicações aos amigos, hoje é porque a Câmara não tem recursos próprios. O que no passado era assessorias de favor, hoje é para comunicar melhor com o cidadão.
Aqueles que foram seduzidos pela mensagem de mudança e a vida eu digo: não se desiludam por causa disto nem com os partidos políticos.
Nem tudo é igual e nem todos são iguais.
No dia em que aspirarmos a ter homens a gerir a polis ao invés de santos ou heróis e deixar de confundir partidos com religiões, talvez as escolhas sejam mais sensatas, esclarecidas e construtivas.
Cabe-nos a nós, enquanto jovens actores políticos exigir e elevar a fasquia ética na vida política. E cabe aos partidos manterem as suas casas extremamente limpas sem se desculparem ou refugiarem nos erros dos seus dos vizinhos.