Fomos a votos e ganhou a democracia, apesar de continuarmos com uma abstenção demasiado elevada. Podemos arranjar muitas justificações, mas a verdade, infelizmente, é que há muita gente que ainda não percebeu a importância e a força do voto e este é um dos nossos inimigos invisíveis: a indiferença!
Mesmo com um candidato que usou um estilo completamente diferente e novo, não se conseguiu combater a indiferença. Era interessante se conseguíssemos saber se Ventura conseguiu levar a votos pessoas que, habitualmente, não votam, ou se os seus votos vieram de eleitores que normalmente votam noutros partidos.
Para aqueles que reclamam que os políticos são todos iguais, tivemos 3 candidatos que saíram desse chavão, Mayan, Vitorino e Ventura, mas, mesmo assim, aqueles que reclamam não fizeram um pequeno esforço. Só pode significar que o mal não está nos políticos que se apresentam, mas nas pessoas que insistem em arranjar desculpas para justificar a sua perigosa indiferença.
Marcelo ganhou! Como era esperado. Apesar de esperado, importa perceber porque ganhou. Ganhou porque se posicionou ao centro, provando que afinal o centro moderado existe e mantém-se forte no nosso país. Ganhou porque também ele teve um comportamento que saiu do registo habitual a que estávamos habituados em anteriores Presidentes e para muitos significou uma lufada de ar fresco. Ganhou porque soube colaborar com um governo quando o país precisou para se erguer economicamente e agora para fazer frente a outro inimigo invisível: o medo! Esta pandemia trouxe o medo e a incerteza e Marcelo percebeu isso.
Militantes do PS queixam-se de muitos camaradas e simpatizantes do PS terem votado Marcelo em vez de Ana Gomes. Que o voto deveria ter sido em Ana Gomes para combater Ventura. Sim, também devia e certamente isso aconteceu até porque, Ana Gomes, várias vezes o afirmou. É claro que tendo sido protagonista numa batalha política pelo 2º lugar na defesa dos valores democráticos contra valores absolutistas fico na dúvida quanto conseguiria Ana Gomes sem a presença de Ventura.
Acredito que terá havido muitos militantes do PS a votar em Marcelo para ajudar António Costa, com o intuito de manter esta colaboração institucional que entendem estar a servir bem o país. António Costa deu a entender que pretendia isso mesmo e esses militantes fizeram-lhe a vontade.
Depois das eleições tivemos as habituais declarações dos líderes partidários. Pelas declarações, curiosamente, todos ganharam. Destaco dois partidos: O CDS cujo líder reclamou vitória?! Lembro que o CDS decidiu anunciar o seu voto declarado num candidato e numa altura em que todas as sondagens já o davam como vencedor. Assim é fácil ganhar; e o PSD que também reclamou uma grande vitória, mas, no entanto, reconhece que foi uma vitória do centro moderado. Ora no centro moderado não se posiciona só uma parte do PSD mas também do PS. Dizer isto e depois dizer que foi uma pesada derrota do PS, a meu ver, não faz sentido.
Vamos agora aos números: Votaram 4,2 milhões de pessoas num universo possível de aproximadamente 10,8 milhões de eleitores. Marcelo teve 2,5 milhões, Ana Gomes 541 mil, Ventura 497 mil, João Ferreira 180 mil, Marisa 164 mil, Mayan 134 e Vitorino 122.
Estes números demonstram que o povo quis manter o Presidente. Quer que ele continue a fazer como tem feito. Significa que concorda com a parceria institucional Presidência/Governo da República e que o populismo de cariz racista e xenófobo convence meio milhão de pessoas, mas não consegue convencer os indiferentes, seja a votar nele, seja a votar contra o que ele defende. Parece que nada convence aqueles que, certamente, querem continuar a viver numa democracia, mas nada querem fazer para isso. É claro que é preocupante saber que ainda assim há meio milhão de portugueses que não se importariam de ter um regime menos democrático e mais absolutista. Falta saber se essas pessoas têm a real noção do risco do seu voto, se o fazem de forma ajuizada e simplesmente preferem um regime totalitário em vez de uma democracia. E uma democracia madura e forte tolera pessoas com opiniões e pensamentos pouco tolerantes e combate-os nas eleições usando a poderosa força do voto. Percebam isso os indiferentes.
O outro inimigo é o populismo e esse está evidente em Ventura, mas não só. Vamos ver muito desse populismo nas próximas eleições autárquicas e a começar já com o aparecimento de perfis falsos nas redes sociais e o lançamento de “Fake News” e verdades muito distorcidas. E não será só o Chega a usar este estilo de campanha! O populismo e em particular o de Ventura, que apregoa soluções que alguns querem ouvir, mas que na realidade não vai resolver qualquer problema, porque a sua aplicabilidade trará mais problemas. Os populistas da extrema direita e extrema esquerda não resolvem problemas antigos, pelo contrário, criam novos problemas. O pior deles é que acabam com grande parte das liberdades que esta democracia, que alguns teimam em não fortalecer, nos dá de mão beijada.
Pensem nisso nas próximas eleições, quando decidirem não votar.
Pensem nisso quando optarem pelo simplismo irreal dos populistas.