O Antigo Testamento fala dos demónios; o confronto deles com Jesus atingiu proporções épicas; a Igreja também nunca teve dúvidas acerca da existência de demónios. O que talvez seja novidade é a frequência com que o actual Papa fala da acção tenebrosa destes espíritos da insídia, da divisão e da morte. Nesta quinta-feira, 24 de Junho, assistimos a mais um acontecimento difícil de explicar se não tivermos em conta esta realidade poderosa.
Na segunda sessão de votações do Parlamento Europeu, ao princípio da tarde, aconteceu o seguinte: 14 deputados faltaram a toda a sessão. 16 dos deputados presentes, quando chegou o momento de se pronunciarem sobre a Resolução A9-0169/2021, saíram para tomar café e voltaram 1 minuto depois da votação. 42 deputados abstiveram-se, 255 tiveram a honra de votar contra e 378 deputados aceitaram a resolução.
Esta resolução, intitulada «dos direitos sexuais e da saúde reprodutiva», é apenas um parecer sem valor legal mas é um teste de força. Fundamentalmente, mostra que metade dos deputados europeus é favorável ao aborto e defende medidas contra quem respeita a vida humana.
A linguagem da resolução é característica de sociedades em que uma ideologia controla a comunicação social com pouca oposição. Só neste ambiente de unanimidade artificial é possível embrulhar as realidades mais duras em tanto eufemismo: matar o bebé nascituro é «tratar da saúde», o direito de o matar é um «direito humano» e, mais retorcido ainda, condenam-se os médicos e enfermeiros que não aceitam colaborar com este «direito humano».
Numa sociedade verdadeiramente livre ninguém se atreveria a dizer que a gravidez é uma doença que precise de ser «curada» matando o bebé.
Cidadãos capazes de pensar por sua conta nunca inventariam esse «direito humano» que vai contra a Declaração Universal dos Direitos do Homem e não está contemplado em nenhum tratado internacional de direitos humanos: nem no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, nem na Convenção Europeia dos Direitos do Homem, nem na Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia.
Se não fosse o peso opressivo de uma corrente ideológica, ninguém levantaria o dedo contra a liberdade de consciência, consagrada na Declaração Universal dos Direitos do Homem, no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, na Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia e — já agora — tão oportunamente defendida na Constituição da República Portuguesa.
Um artigo recente de José Diogo Ferreira Martins e Inês Quadros (https://observador.pt/opiniao/totalitarismo-vs-objecao-de-consciencia/) expõe com clareza os termos da questão.
A Resolução do Parlamento Europeu não é lei, mas dá-nos o retrato de uma Europa triste, de pensamento limitado, de cultura decadente.
Por estes mesmos dias, o Parlamento húngaro associou a pedofilia e a homossexualidade, para proteger as crianças desta propaganda. É um facto que a pedofilia tem relação com a homossexualidade, no sentido de que a pedofilia é mais frequente entre as pessoas com tendência homossexual, geralmente homens, mas trata-se de coisas diferentes e era escusado associá-las directamente. No entanto, não era preciso aproveitar a ocasião para fustigar destemperadamente a Hungria, em homenagem subserviente à ideologia dominante. Porque atacar húngaros não é sinal de grande coragem.
Em Portugal, os deputados preparam-se para voltar à eutanásia e aprovaram uma lei que confere ao Estado o encargo de controlar o que os cidadãos pensam. O que é a censura?
A Itália que impor, em especial às crianças, um pensamento alinhado com a nova ideologia sexual. O Vaticano lembrou formalmente ao Governo italiano que a liberdade de pensamento está consagrada na Concordata entre a Itália e o Vaticano. Tanto bastou para que muitos meios de comunicação europeus classificassem a Igreja de inimiga dos direitos humanos!
Estes apontamentos soltos dos tempos que correm explicam-se sem a acção perversa do demónio?