Ele gostava de comer e a mulher de cozinhar, conta em tom de brincadeira Manuel Machado, natural de Penamaior, Paços de Ferreira. Mas o que começou por ser uma brincadeira acabaria mesmo por tornar-se numa coisa séria que lhe havia de mudar a vida.
Era comercial de uma empresa de estofos, começou a fazer umas jantaradas para os amigos e daí a criarem a Casa Anhinho, em Arreigada, foi um pulo. O capão também veio naturalmente. Actualmente cria e confecciona cerca de 100 capões por ano. Um produto que ostenta, com orgulho, já a última certificação criada. “Com a certificação as pessoas comem e sabem o que estão a comer”, defende, caracterizando este produto típico de Freamunde como “nobre” e feito para ser degustado com a família ou amigos.
Começou a criar capões há 10 anos
Manuel Machado tem 48 anos. Os últimos dez foram dedicados a um negócio em que nunca tinha pensado. “Era comercial de mobiliário, trabalhava com uma empresa de estofos, e aquilo há dez anos atrás não estava a correr muito bem”, explica. Foi nessa altura que começou a juntar, de vez em quando, uns amigos para umas “patuscadas” que agradavam a todos. “Eles começaram a gostar da comida e eu pensei ‘se calhar o meu futuro vai ser este, vou deixar a parte comercial e dedicar-me à comida’”, recorda. Assim foi.
Primeiro com uma cabidela, depois galo assado no forno. Deu-se o passa a palavra e nasceu a Casa Anhinho. “Eu gosto de comer, a minha mulher é que gosta da culinária. Aos bocadinhos fomos fazendo a nossa casa”, resume. Não é um restaurante. É uma “casa particular que serve comidas”, precisa. “É mais para grupos, tudo por marcação. Não é uma casa de porta aberta durante todos os dias. À quarta-feira sirvo o anho e a vitela e à sexta-feira o cozido à portuguesa. De resto é marcação”, esclarece o pacense.
Neste percurso, o capão, típico de Freamunde e do concelho, surgiu naturalmente. “O capão era uma coisa que havia sempre lá na mesa em casa pelo Natal. A minha avó materna é de Freamunde e então já trazia com ela esse hábito”, conta. Foi por isso com naturalidade que, há dez anos, começou a criar capões para os pôr à mesa. “Comecei a servir também o capão nesta altura, de Novembro a Janeiro”, diz.
Há muita gente a “vender gato por lebre”
A vida do galo, cuja tradição remonta à era romana, é de cerca de um ano. Nascem em Janeiro, são castrados três a quatro meses depois, em Abril ou Maio, e depois crescem até Novembro e Dezembro, quando se transformam numa iguaria cobiçada.
O segredo, que não é segredo, refere Manuel Machado, é desde logo uma castração bem feita. “Se ficam mal castrados nem são capões nem galos, são rinchões, que não é tão bom como o capão”, garante. Depois uma boa alimentação à base de milho e verduras. “Andam soltos aí no campo e comem o que lhe apetece”, afirma.
Por ano cria cerca de 100, já certificados e com anilha. “Com a certificação as pessoas comem e sabem o que estão a comer. Ele está certificado, na asa vem lá a chapinha que identifica o número dele”, argumenta, salientando os benefícios desta nova regra. É que, confirma, há muita gente a “vender gato por lebre”: “Há pessoas que chegam aqui para comer e vinham com má impressão do capão porque não tinham comido capão, tinham comido um galo. Quando lhes servi o capão ficaram maravilhados e disseram que era muito diferente do que aquilo que tínhamos comido”.
“A primeira vez que comem o capão as pessoas gostam muito e adoram. Tenho aqui famílias que já repetem o capão há seis anos”, dá como exemplo o dono da Casa Anhinho que acredita que está a criar-se um hábito de comer o capão nesta altura do Natal. “O capão está muito na moda, na ceia de Natal já está a passar a perna ao peru, pelo menos aqui na zona”, garante.
Qualidade dos produtos é o segredo
Se na criação não há segredo, na confecção também não. O único será usar produtos de muita qualidade. “O capão é morto, deixa-se arrefecer a carne, põe-se em água e limão. Depois é temperá-lo e ao fim de 48 horas é prepará-lo e metê-lo ao forno”, resume Manuel Machado.
É preciso bom vinho para temperar e bons condimentos, assim como bons produtos para o recheio, “à base de carne de vaca, enchidos e com os próprios miúdos do capão”. Essa carne para o recheio vai ao forno dentro do capão e depois é feito um preparado que é servido à parte. Já o capão vai ao forno junto com as batatas e está cerca de três horas a assar. Depois é só trinchar e servir.
“Nos últimos três anos há muita procura do capão, foi bem publicitado, mesmo pela câmara municipal que tem feito um trabalho excelente a respeito do capão. Agora já é conhecido a nível nacional e os espanhóis, muitos da Galiza, também procuram cá o capão”, assegura o pacense.
Manuel Machado defende que, no futuro, o que é preciso é manter a qualidade deste produto e evitar que se enganem os consumidores que levam “gato por lebre”. “O capão para mim é uma coisa nobre, é um animal que deve ser comido com família e amigos. E é muito bom”, sustenta.