Pedro Teixeira é de Rio de Moinhos (Penafiel), tem 26 anos e estudou Engenharia Informática; Márcia Almeida, de 25, vive em Valongo e é da área do Desporto. Ambos descobriram a dança de formas pouco convencionais e não esperavam que viesse a tornar-se uma paixão e que os fizessem dar cartas, ou melhor, passos lá fora.
“Comecei a dançar porque era gordinho quando era pequenino. A minha mãe quase obrigou-me a entrar num grupinho de dança que havia em Rio de Moinhos e eu lá fui e, a partir daí, adorei aquilo e comecei sempre a investir”, revela Pedro.
Márcia seguiu a área do desporto e sempre experimentou várias modalidades, mas conta que o “bichinho” pela dança surgiu aos 14 anos. “Estava a haver uma festa popular em Matosinhos e eu fui ver uma colega da minha mãe a dançar e, a seguir, ia haver um grupo de mais jovens e eu achei que ia ser uma seca. De repente, comecei a vê-los a dançar e gostei e foi aí que começou a surgir o bichinho. Então, entrei para a escola que tinha visto, que é lá em Matosinhos”, explica.
“É um bocadinho clichê dizer que a dança é tudo, mas, basicamente, é porque, para além de dançar, de treinar, de ter aulas, eu dou aulas. A dança já é parte da minha vida profissional, mas também é o meu hobby, o meu escape, porque também faço isso fora das minhas horas de trabalho”, sublinha Márcia ao Verdadeiro Olhar, destacando o “carinho” dos pais que, durante muitos anos, a levavam de Valongo até Leça da Palmeira (Matosinhos) para ter aulas.
Pedro conta que chegou até a visitar outros países para conhecer mais sobre dança e poder saber aquilo que realmente gosta. “Deixei de lado a engenharia e dediquei-me mesmo só à dança, porque tinha espaço para isso e é um sonho, é aquela coisa de vamos seguir os nossos sonhos para sermos felizes”, conta com um brilho nos olhos.
Ambos criaram espaços de partilha da paixão pela dança e de conquistas
O hip hop é o estilo que preferem. “Fiz muita coisa, mas, realmente, o que me motiva mais e o que me apaixona é a dança”, conta Márcia com um sorriso. Os convites para transmitir esta paixão a mais pessoas não tardaram a surgir e tanto Pedro como Márcia dão aulas de hip hop em vários locais bem distintos e acabaram por fundar as suas próprias escolas há cerca de um ano – a PT Dance Academy, inserida na Academia de Dança de Castelo de Paiva, e a All Way Up Team, em Valongo.
Ensinam meninos e meninas desde os três anos até às mais variadas idades, com quem criam alguns laços e que os fazem encher de orgulho a cada conquista, que pode ter a mais variada forma. “Todos os alunos me marcam de alguma maneira. Tem aqui alunos que já são meus há muitos anos e claro que há um carinho enorme que se vai construindo ao longo do tempo. É bom conseguirmos dar o que temos e ver o retorno das crianças e dos alunos que gostam de estar aqui, contentíssimos”, explica o penafidelense.
Ao entrar na Academia de Dança de Castelo de Paiva, os tons suaves do ballet predominam e vê-se a imagem de um par de sapatilhas de ponta na parede. Pedro está à recepção com um sorriso e apresenta o espaço. Lá dentro, uma sala com paredes brancas e espelhos ao longo de uma delas, que reflectem os movimentos confiantes do bailarino. A música pode variar consoante as aulas de Ballet, Hip hop, Dancehall, Teatro musical, Contemporâneo, Dança criativa e Zumba.
O bailarino é agora sócio-gerente da Academia, que é o pólo principal da PT Dance Academy. A ideia do projecto surgiu para poder juntar os alunos de todos os locais onde dá aulas, em forma de parceria e de modo a fazer um “intercâmbio de experiências”.
Já a valonguense dá aulas, a partir do seu projecto, num espaço bastante amplo, chamado “Fábrica”, que serve também para organização de eventos, jantares e, de vez em quando, até de danceteria. De um lado, tem sofás e cadeiras brancos e elegantes, do outro, um espelho grande e uma parede que se assemelha a cortiça e, ao fundo, um palco e umas colunas de som. A decoração é festiva e deixa cair do tecto uma espécie de serpentinas coloridas, que a bailarina diz fazerem parte de uma festa hippie que houve há dias, mas que até combinam com os movimentos alegres que esboça em frente ao espelho.
“É a primeira vez que danço sem música”, brinca. Conta que o projecto começou após ter terminado o mestrado e perceber que havia pessoas na zona que gostavam de ter aulas de dança.
A mãe, que “está ligada ao fitness”, dá aulas de zumba no mesmo local.
Estes dois projectos surgiram para desenvolver as regiões em que se inserem, no âmbito da dança, sendo actualmente alguns dos responsáveis pela representação dessas zonas em várias competições e até mesmo da animação dos eventos concelhios.
Márcia conta que, quando era mais nova e se inscreveu na escola no concelho de Matosinhos, “não havia praticamente nada a nível de danças urbanas” em Valongo. “Agora é que começa a cultura a ficar mais viva com estas competições e as pessoas começam a ver o que há”, continua. “As pessoas não têm assim tanta noção que nós somos capazes, nós temos pessoas muito boas cá dentro”, remata.
No caso de Pedro, que foi o primeiro professor de hip hop a aparecer na Academia de Dança de Castelo de Paiva, explica que, quando era mais novo “não havia muita informação, nem muitos professores” na região.
Participaram no concurso nacional, e vão agora para a próxima fase, além fronteiras
Para o bailarino, a participação no Portugal Hip Hop Dance Championship 2019, de 25 a 28 de Abril, no Complexo da Maia, foi uma novidade. “Eu e dois colegas damos aulas em Vigo no mesmo dia e vamos todos no mesmo carro. Estávamos a ver no Facebook que ia haver uma categoria de trios e alguém sugeriu que fôssemos participar, lançando mesmo assim ao calhas”, explicou, referindo que “foi um desafio”, mas lá arriscaram e “parece que correu bem”.
A equipa chama-se VW3, nome que surgiu numa das viagens, sendo o carro um Volkswagen e a equipa formada por três amigos, explicou entre risos. Apesar de serem de locais afastados, uma vez que os dois colegas de Pedro são da Leça da Palmeira, conseguiam treinar sempre duas a três vezes por semana durante várias horas, aproveitando o tempo que não davam aulas durante o dia.
A VW3, inserida na categoria Minicrew, terminou o concurso em segundo lugar, recebendo 250 euros com o propósito da inscrição no campeonato do mundo World Hip Hop Dance Championship, a decorrer entre 5 a 10 de Agosto, em Phoenix, nos EUA. “É sempre aquela coisa de não estarmos à espera e ser sempre uma surpresa, mas foi muito bom não só o prémio em si, que tem o seu valor, mas o comentário das pessoas, o feedback de toda a gente que viu e estava lá. Isso para mim é o mais importante e foi isso que nos encheu mais”, explica com satisfação, referindo que “é sempre uma responsabilidade”. “É um sonho para qualquer bailarino conseguir ir lá fora e neste campeonato desta dimensão, ainda mais, conseguir representar o país”, sublinha.
Márcia não só já tinha participado no evento, como também já esteve nos EUA a representar Portugal há dois anos. Já integrou várias categorias mas, este ano, ficou em primeiro lugar em Megacrew, com uma equipa com cerca de 40 elementos – a RP Nation -, recebendo o grupo dois mil euros com o intuito de inscrever no campeonato mundial.
No entanto, não foi através da escola onde treinava em Matosinhos que venceu, uma vez que, no ano passado, esse espaço deixou de ter um grupo de competição. Acabou, então, por fazer audições para um grupo da Póvoa de Varzim, RP Dancers, e entrou no campeonato através dele.
“Só a possibilidade de irmos lá fora já é uma loucura, foi um entusiasmo e, mesmo para o nosso crescimento, é muito bom”, descreve. Explica que “o nível é completamente diferente”, porque, enquanto em Portugal “é treinar na desportiva”, “lá fazem daquilo carreira, a condição física deles é absurda e os miúdos parece que já nascem com aquilo porque crescem no meio da dança e a facilidade que têm é muito maior”. “Chegamos cá com uma bagagem completamente diferente e com os horizontes ainda mais abertos”, completa.
Escolha já está feita, mas ainda faltam meios para a viagem até ao outro lado do Atlântico
Este concurso nacional teve a participação de cerca de 1600 pessoas de todo o país, divididas em categorias: Junior, Varsity, Adult, Minicrew e Megacrew. O júri internacional, composto por nove elementos, avaliou tanto a parte mais artística relacionada com a performance, como a componente técnica, ligada aos estilos deste tipo de dança.
A selecção para representar o país nos EUA é automática perante a presença no pódio, mas a inscrição dos elementos tem de ser paga por cada um.
Tanto na academia de Pedro como na de Márcia estão a tentar fazer angariação de fundos, com eventos de cariz solidário ligados à dança, rifas, workshops e pedidos de patrocínios.
Esses eventos ainda não começaram, mas em Junho já vão haver novidades.
“Conseguir levar a dança onde ela não existe”
Este é o mote de Pedro e que dá mais do que razões para “continuar, evoluir e tentar fazer crescer a academia que ainda está muito pequenina”. “Nasci aqui nesta zona e sei a dificuldade que tive quando era mais novo. Quero tentar levar a dança a sítios onde ela não existe, seja por actuações, por aulas, por eventos, tentar fazer o maior número de coisas possível”, sublinha com motivação.
“Quero expandir a escola porque já é a nível profissional, ter mais grupos de competição, quero continuar a dar aulas e quero continuar a ter formação porque acho que é fundamental continuarmos com ela, uma vez que, apesar de ser professora, não posso deixar de a fazer senão vou estagnar”, explica a valonguense, acrescentando que não quer deixar de competir.