O processo de fusão dos sistemas de captação e abastecimento de água em alta, que levou à criação da empresa Águas do Norte, irá ser revertido pelo actual Governo. Foi o próprio ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, quem o anunciou durante uma visita que, na última terça-feira, realizou ao Porto.

Na ocasião, o governante admitiu que a empresa Águas de Douro e Paiva, durante anos responsável pelo abastecimento de água em alta ao Vale do Sousa, possa ser reactivada.

Recorde-se que a decisão do anterior Governo de terminar com a Águas de Douro e Paiva foi muito criticada pelos municípios da região que, nalguns casos, avançaram com processos judiciais para impedir a fusão delineada pelo ex-ministro do Ambiente.

 

Medida previa harmonizar tarifário

Era um processo que parecia irreversível, mas a entrada em funções de um novo Governo mudou aquilo que foi anunciado como certo. Na última terça-feira, o novo ministro do Ambiente garantiu a reversão da fusão dos sistemas de captação e abastecimento de água em alta. No Porto, João Pedro Matos Fernandes alegou que a medida que havia sido implementada pelo anterior Governo foi decidida contra a vontade das autarquias, que também não foram indemnizadas pelos prejuízos resultantes desta decisão. Uma realidade, disse, injusta e que prejudicava, essencialmente, os municípios do litoral, entre os quais se encontravam os que integram o Vale do Sousa.

Dando como certo o fim da fusão dos sistemas de captação e abastecimento de água em alta, o responsável pela pasta do Ambiente também admitiu que a Águas de Douro e Paiva, que abastecia os concelhos do Grande Porto e do Vale do Sousa, possa ser reactivada. O ministro acrescentou que está a ser estudado um novo modelo, que possa manter os sistemas de captação e abastecimento de água em alta e, ao mesmo tempo, garantir ganhos de escala a municípios com baixa densidade populacional. Este modelo deverá ser apresentado no prazo de um mês e poderá prôpor que os sistemas de abastecimento de água em alta e em baixa possam ser geridos em conjunto.

No porto, João Pedro Matos Fernandes anunciou, igualmente, que estão disponíveis cem milhões de euros de fundos comunitários para que os municípios possam concretizar projectos na área do abastecimento de água.

Autarcas da região contestaram medida em Tribunal

SONY DSCQuando anunciou o Plano para a Reestruturação do Sector das Água o então ministro Jorge Moreira da Silva afirmou que iria alcançar uma poupança de 2700 milhões de euros. A agregação de 19 sistemas de captação e abastecimento de água em alta em cinco entidades também iria proporcionar, assegurava o ex-governante, uma harmonização dos tarifários entre o Litoral e o Interior. Jorge Moreira da Silva afirmava que, em cinco anos, seria alcançada uma tarifa única em todo o país.

Apesar das vantagens salientadas pelo ex-ministro, os autarcas nunca concordaram com a medida. Desde o início do processo que os edis de Lousada, Paços de Ferreira, Paredes e Valongo referiram que a reestruturação imposta implicava aumentos nas facturas de água e saneamento e, nesse sentido, decidiram levar a questão a tribunal para impedir que a medida avançasse.

O presidente da Câmara Municipal de Paredes foi sempre um dos mais críticos e defendia que este processo era “uma fraude”. Celso Ferreira alegava que reestruturação do sector das águas iria prejudicar as populações dos municípios que são accionistas da Águas do Douro e Paiva e da SIMDOURO. Sustentava, ainda, que o modelo proposto não cumpria a legislação das sociedades comerciais, apropriando-se indevidamente de um bem municipal, tirando às câmaras a participação numa empresa rentável e passando por cima de uma competência que é da Assembleia Municipal, a de deliberar sobre concessões.

“Tem de ser a Assembleia Geral da Águas do Douro e Paiva a ditar se quer ou não o fim da empresa”, defendia também José Manuel Ribeiro, presidente da Câmara Municipal de Valongo, considerando “inaceitável” o “aumento brutal de 40% das tarifas da água” previsto.

Na mesma altura, o município de Paços de Ferreira, accionista da Águas do Douro e Paiva, mostrava-se contra estra reestruturação. “Considero tratar-se de uma expropriação e não de uma fusão de empresas”, afirmava Humberto Brito. Da mesma forma, o presidente da Câmara de Lousada não concordava com este processo. “O ministro do Ambiente está determinado a avançar com a fusão sem ouvir ninguém. Entendemos que somos accionistas de uma empresa e que temos direitos. Não podem extinguir uma empresa à nossa revelia”, defendeu Pedro Machado em Assembleia Municipal.

 

Requerimento foi indeferido, mas acção principal continuava em Tribunal

Todas estas autarquias acabaram por avançar com acções judiciais contra a reestruturação, dando início a uma verdadeira guerra judicial. O Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, que já tinha indeferido uma providência cautelar, indeferiu o requerimento apresentado por oito municípios para suspender a actividade da empresa Águas do Norte. Uma decisão desvalorizada pelos autarcas. “Já sabíamos que isso ia acontecer, mas não íamos deixar de defender o nosso ponto de vista. Vamos continuar a defender os interesses da população”, referiu, então, Celso Ferreira.

Entretanto, continuava em Tribunal a acção principal apresentada pelos municípios. Todavia, com a decisão do novo Governo, este processo deverá ser suspenso.

 

Qual a diferença entre o abastecimento de água em alta e em baixa?

Por abastecimento em alta considera-se a captação, o tratamento e o fornecimento de água aos reservatórios dos municípios. É designada por abastecimento em baixa a rede de distribuição de água dos reservatórios municipais até ao consumidor final.

O abastecimento de água em alta é feito por empresas públicas, que actuam sob o chapéu da Águas de Portugal. Já o abastecimento de água em baixa está, em vários concelhos, concessionado a empresas privadas. É o caso de Paredes, Paços de Ferreira e Valongo.