Etiquetas

0

Fernando Sena EstevesEm algumas peças antigas do meu Museu da Faculdade de Farmácia há umas etiquetas ovais de latão, pequeninas e bonitas, de um primitivo inventário. Se há coisa que evolua rapidamente é o universo das etiquetas e de metálicas e pequenas com três ou quatro algarismos passaram a autocolantes, muito maiores e de cinco ou seis algarismos. E agora são ainda maiores e contêm nada menos de 13 algarismos, pelo que podem codificar uns quantos milhões de milhões de peças. Uma riqueza que em alguns casos me deixa com o problema de onde “autocolar” as etiquetas sem poluição visual.

Há também o inevitável código de barras, de linhas paralelas, cuja espessura e espaçamento codificam o artigo. A sua leitura ótica foi um avanço notável sobre a introdução dos preços, com os erros que por vezes ocorriam. Com estes códigos, no entanto, o leitor de vez em quando não lê e recorre-se então aos algarismos. Muitos: num caso contei 31 deles, mais uma letra que se deve sentir sozinha.

Nesta matéria impera também a língua inglesa, mais simples nas palavras e expressões. “Codebar” é bem mais curto que as seis sílabas de “código de barras”; tal como “etiqueta” perde para “label” por 4-2 ou para “tag” por 4-1. Outra razão é que muitos destes procedimentos aparecem em países anglófonos, como o QR code (“quick response” ou de “resposta rápida”). Chamam-se também códigos de barras, mas bidimensionais, de contorno quadrangular e que podem ser lidos pelos atuais telemóveis. É notável a simplicidade de se comprar uma viagem de avião pela Internet, receber um código QR no telemóvel, bastando exibi-lo no aeroporto como cartão de embarque ao leitor de um funcionário. Simples também é a aquisição de bilhetes de comboio, como a de uma senhora idosa que recebeu a indicação de um sobrinho via telemóvel: nem foi preciso mostrar nada, pois o revisor limitou-se a saudar a senhora, de quem disse o nome, desejando-lhe boa viagem!

Etiquetas por vezes aborrecidas são as que se colocam nas roupas, como nas camisas: fazem cócegas ou desconforto no pescoço e cozem-nas tanto nos bordos que são difíceis de tirar com uma tesoura ou um “x-Acto”, o qual é mais eficaz mas tem o perigo de cortar o tecido ou um dedo. Num presente de Natal recebi um blusão curioso por ser azul por fora e vermelho por dentro. Ou vice-versa, quer dizer, pode vestir-se com o vermelho por fora e o azul por dentro. Devo dizer que com a minha idade e a minha propensão clubista aconselham o vermelho (ou encarnado) para o lado de dentro. Se falo nisto é porque num bolso encontrei duas enormes etiquetas, felizmente fáceis de cortar, o que fiz mas sem ler o que diziam: na altura não pensava de todo escrever um artigo sobre etiquetas…

Noutra peça de roupa encontrei nada menos de cinco etiquetas! Numa, pequena, vinha a marca de uma firma espanhola com a indicação surpreendente de “Made in Portugal” em vez da habitual “Made in PRC” (“People’s Republic of China”); nessa está cozida uma outra, minúscula, mas onde cabe a indicação do tamanho para três áreas geográficas. Depois havia três etiquetas de 10×2,5 cm: uma delas tinha o código de barras, outra vez o tamanho, modelo, cor, etc. tudo em Espanhol e as outras duas, com inscrições na frente e verso, traziam instruções sobre como lavar e não lavar, em muitas línguas europeias e asiáticas; à cautela, as instruções eram acompanhadas por 20 símbolos gráficos (não é gralha, contei mesmo v-i-n-t-e desenhos). Trata-se de um sobretudo? Não. Um casaco? Não. Sério: umas humílimas cuecas de algodão!

Quanto à tendência que se sente às vezes em afixar etiquetas a pessoas e instituições, como as do universo da política e do futebol, que tal, em vez disso, remover mas é umas quantas do vestuário, dessas que incomodam e fazem cócegas?