Entre os vários volumes do Facebook, que vão desde a enciclopédia ao terror, encontramos a comédia: cartoons interessantes e cheios de mensagens, caricaturas aparentemente fúteis que não são mais que a realidade empolada, críticas cerradas à atualidade política, textos onde se cruza o trágico e o cómico, numa convivência surpreendentemente possível… Maravilho-me, sobretudo, com a escolha de certas palavras embrulhadas na ironia, com as metáforas impensáveis, com os registos de língua que se misturam, com os jogos de palavras, entre muitos outros aspetos que alguns sabem conjugar como ninguém e nos deleitam… e fazem rir. Às vezes, é a alma que sorri. É quanto basta.
Por outro lado, não raras vezes, batemos com olhos na piada brejeira, na crítica grosseira, na ironia destrutiva a roçar o sarcasmo, nas metáforas gastas… Situações onde as palavras “são pedras” arremessadas contra os outros e contra o leitor apanhado desprevenido. Servirão, pelo menos, para aliviar a alma de quem as produz? Acreditemos que sim e terão tido pelo menos alguma utilidade.
Há ainda outra categoria que, provavelmente, deve ser inserida neste capítulo do humor: trata-se de uma espécie de arte de “encher chouriços”, à boa maneira de algum jornalismo que procura algo onde já nada de novo existe. São capítulos onde nada existe para além da mancha gráfica.
Não me caracterizo como pessoa sisuda, incapaz de uma brincadeira. Rio até, e principalmente, de mim própria, de certas situações que vivi e motivaram reações interessantes, inusitadas e caricatas. Mas também não sou de riso fácil. Não é qualquer piada que me faz rir. E, portanto, é normal que, durante uma comédia com piadas gastas, não ria uma única vez. Outros rirão. É uma questão de personalidade. Mas, quando vejo um rodopio de brincadeiras no Facebook, do tipo “Descubra a sua personalidade pelos 4 últimos dígitos do número do seu telemóvel” e outras similares, algumas com muitos “seguidores”, fico perplexa e com uma pontinha de inveja. A perplexidade advém da constatação de que existe enorme capacidade de construções a partir do nada (e que redundam em nada). A inveja, do tempo que sobra a muitos para se dedicarem a esses passatempos, que terão as suas vantagens, apesar de eu ainda não as ter descoberto.
Não se pense, contudo, que esta é uma tendência das redes sociais, através das quais cidadãos anónimos divulgam as suas ideias e criatividade. Não. Basta ligar a televisão, à hora dos noticiários e voilà! O assunto é o furação que se dirige para Portugal. O acompanhamento da situação exige uma jornalista estrategicamente bem colocada. Entenda-se, com “estrategicamente bem colocada”, num local onde a velocidade do vento exceda os 120 Km horários e levante a areia. Se chover, ainda melhor. Depois a receita é simples: repetir até à exaustão a informação. Se, mesmo assim, o espetador não tiver captado a mensagem, basta, passado uma hora, voltar a apresentar a mesma peça, com a indicação de “direto” ao fundo para criar mais dramatismo. Assim, o espetador fica na expectativa de ver a moça levantar voo e não muda de canal. Isto tudo já depois de o furação se ter afastado do local! Para os que não assistiram à cena, garanto a veracidade do relato, que não tem qualquer artifício retórico.
Neste momento, aqueles que tinham esperança de ler uma crónica de jeito e chegaram a este ponto estão a apontar-me o dedo. “Critica, critica, mas viu.” É factual. Caso contrário, não estaria a escrever sobre o assunto. Não posso esconder esta curiosidade pelo trágico: também eu estava à espera que a jornalista voasse.
Antecipo outra objeção justa: estamos em democracia, cada um escreve o que quer, os outros leem se quiserem. Se não querem ler, não abram o Facebook. Se não querem ver uma peça, mudem de canal. É verdade. É essa a mesma liberdade que me permite escrever este texto e a outros não o lerem.