Mantendo-se a trabalhar ou dedicando-se ao voluntariado, muitos foram os que, nesta região, continuaram a ajudar os outros.

Os casos de quem se manteve “na linha da frente”, desde os profissionais de saúde aos bombeiros ou funcionários de supermercado, são os mais conhecidos, mas houve também muitas empresas que não pararam a produção e serviços que continuaram abertos. Todos tiveram de se adaptar a uma nova realidade.

Damos a conhecer alguns casos de quem não baixou os braços e tentou dar um contributo nestes tempos difíceis, ajudando idosos, produzindo máscaras, fazendo voluntariado onde é preciso ou expondo-se ao risco tratando do lixo dos infectados.

Lar e bombeiros uniram-se para levar conforto a idosos sozinhos em Paço de Sousa

Com a chegada da pandemia, os centros de dia fecharam e muitos idosos passaram a ficar em casa, sozinhos. Para reduzir o isolamento social, atenuar o seu impacto, prevenir o risco de doenças, manter a capacidade funcional do idoso e vigilância ao nível da saúde, entre outros, o Lar e Centro de Dia Padre Américo e os Bombeiros Voluntários de Paço de Sousa, em Penafiel, juntaram-se no projecto “Juntos Vencemos”.

Semanalmente, elementos das duas instituições visitam e acompanham, para já, 20 idosos, de Paço de Sousa mas também de Fonte Arcada, Galegos ou Penafiel. Tinham começado com 12.

“Na primeira semana fomos ver como estavam e entregamos um kit com dois pares de luvas, duas máscaras descartáveis, um gel desinfectante de mãos, um pack de lenços de papel e um folheto informativo, assim como actividades de estimulação cognitiva para eles irem realizando durante a semana”, recorda Ana Nunes, psicóloga no Lar e Centro de Dia Padre Américo, que integra a equipa com outras duas colegas, uma animadora sociocultural e uma assistente social. Seguiram-se visitas dedicadas à promoção da alimentação saudável. Esta semana o enfoque está nos cuidados primários de saúde. Até porque os três elementos dos Bombeiros de Paço de Sousa são enfermeiros.

O objectivo era levar o centro de dia a casa das pessoas, não deixar os nossos utentes sozinhos nesta altura, e chegar às famílias mais vulneráveis. É uma presença que para eles é importante. Sentem que há alguém que se preocupa. A maioria não tem rectaguarda familiar”, justifica Ana Nunes. “Eles recebem-nos muito bem. Muitos ficam emocionados por nos ver chegado. O facto de irmos lá nem que seja meia hora por semana dá-lhes alento”, conta. “A pergunta que nos fazem mais é: quando é que isto vai acabar? Muitos têm filhos emigrados e mostram-se preocupados com eles. Nunca imaginei que este projecto ia ter um impacto tão grande”, confessa ainda, lembrando que são tomados imensos cuidados, com uso de materiais descartáveis que vão para o lixo entre cada visita.

“As pessoas brincam connosco, sorriem, choram, oferecem bolos. Somos a família que eles não têm”

Para os Bombeiros a experiência também tem sido gratificante. “Ajudamos com a vertente médica e tentamos manter a actividade cognitiva dos seniores com algumas actividades. Já ensinamos a boa prática da higiene das mãos ou como colocar máscaras”, explica João Pinto. “Esta semana estamos a fazer quase uma consulta, com a avaliação da pressão arterial, do colesterol e açúcares para perceber se é preciso encaminhar ou intervir”, acrescenta o enfermeiro e bombeiro. Quando é preciso algum curativo ou troca de penso, entre outros, também ajudam.

“As pessoas brincam connosco, sorriem, choram, oferecem bolos. Somos a família que eles não têm”, acredita João Pinto. A ideia é manter o projecto até que haja um regresso à normalidade.

Apoio aos idosos em casa mantém-se, com protecção e sem medos

Joana Mesquita, de Paços de Ferreira, assume-se apaixonada pela prestação de cuidados ao idoso. Foi animadora social durante vários anos e auxiliar de acção médica em hospitais e lares. Mas não tinha o tempo necessário para fazer o trabalho com o carinho que desejava. “Gosto de fazer o meu trabalho com tempo e dar conforto e nos hospitais e lares há tempos definidos para tudo”, lamenta.

Até que, no final do ano passado, quando ficou desempregada achou que era altura de avançar com o sonho que andava a acalentar de criar o seu próprio negócio. “Tenho três filhos e andava sempre em turnos, o que era complicado. Quis gerir o tempo e fazer o que gostava”, diz. Criou o Apoio Domiciliário da Ju 24h. “Num dia deixei cartões nas caixas do correio e no outro já estava a receber chamadas”, recorda a pacense de 37 anos.

Começou a trabalhar das sete da manhã às 20h00, sozinha, e mal tinha tempo para almoçar tal foi a procura. Chegou aos 10 domicílios por dia. Até que chegou a pandemia, que fez algumas pessoas ficar em casa, em lay-off ou desempregadas e suspender o serviço, porque passaram eles próprios a tomar conta dos idosos.

Já Joana Mesquita, que entretanto contratou outra pessoa para a ajudar, não parou nem pensou em parar. Continua a dar apoio a cinco seniores, uma delas com 103 anos.

“As coisas não mudaram muito. Já usava desinfectantes e protecções, a única coisa que se acrescentou foi a viseira. E sempre que se sai e se entra há troca de calçado e farda, agora descartável. Tomamos todos os cuidados”, explica.

Aos seniores levam vários serviços, desde a higiene à administração de medicamentos e alimentação, pequenos cuidados de saúde, medições de tensão e glicémia, actividades cognitivas ou pequenos exercícios. “É o que a família pedir”, realça a pacense. “Desde que chego até que saio é uma palhaçada. Sinto que naquele bocadinho eles são felizes e eu também. Nunca me custou levantar às 6h15 da manhã para ir fazer domicílios“, descreve.

Aos idosos a quem presta serviços não os sente assustados com a situação, mas sim preocupados com a segurança da sua “Joaninha”. “Pedem-me que me proteja e querem saber se estou bem. Vemo-nos de domingo a domingo. Estamos muito ligados”, admite.

“Eu não tenho medo porque sigo as regras. Nunca pensei em parar. Tenho filhos em casa e tomo todos os cuidados. Dispo-me à entrada da porta e trago tudo o que preciso na mala do carro. Já antes da COVID me preocupava com estes gestos”, dá como exemplo.

Quanto ao trabalho com os idosos não esconde que é para ficar: “é isto que gosto de fazer. Tratar e cuidar deles. Não sei fazer mais nada. O facto de ajudar quem não pode a mim reconforta-me”.

Ela e a colega também iniciaram outro apoio. Estão a distribuir máscaras de tecido a quem não as pode comprar.

Para o futuro Joana Mesquita tem um sonho: criar uma associação para ajudar os mais carenciados com refeições quentes. “Acho que com a pandemia vai haver muita gente a ficar desempregada e a precisar de ajuda”, antecipa.

Funcionários do município recolhem lixo potencialmente contaminado em Lousada

Lousada foi um dos primeiros concelhos do país com infectados, o que exigiu inventar soluções, uma delas ligada à recolha dos resíduos que quem estava contaminado e a recuperar em casa, para evitar a propagação da COVID-19.

Neste concelho foram desde logo criadas equipas específicas para lidar com esta questão que exige cuidados e risco. Todos os dias, cantoneiros e motoristas que tiveram formação e aceitaram fazer este serviço, equipados dos pés à cabeça com fatos, máscaras e dois pares de luvas, saem para o terreno e vão de casa em casa com habitantes infectados para levantar os lixos produzidos.

Artur Coelho, encarregado geral operacional do Departamento de Obras do Município, gere as equipas, que são já quatro. Diariamente, recebe uma lista actualizada de pessoas a que é preciso dar resposta. Um número que tem vindo a crescer, mas vai flutuando à medida que há recuperações, num concelho já com 225 casos positivos confirmados desde o início da pandemia. “Estamos a fazer recolha em cerca de 120 casas”, explica.

Para manter a segurança de todos, apesar dos cuidados, estes funcionários do município não têm contactos com as pessoas a que vão dar apoio. “Ligam quando chegam à porta. Colocam um contentor onde a pessoa tem de colocar o seu saco. Depois de a pessoa confirmar que já está e fechar a porta recolhem, selam tudo dentro de um outro saco e retiram um par de luvas e calçam outras”, descreve Artur Coelho. Entre recolhas, a viatura que usam é desinfectada várias vezes. O lixo é depois depositado num contentor específico, no ecocentro, e é recolhido para incinerar. “Há sempre receio, mas eles estão protegidos com o equipamento”, garante o responsável pelo Departamento de Obras.

Voluntárias fizeram máscaras para distribuir à população em Paredes

Com as festas canceladas, as 25 mulheres da Comissão de Festas de Sobrosa 2020, a que se juntaram outros voluntários da freguesia, não quiseram ficar paradas. Respondendo ao repto da Junta de Freguesia lançaram apelos e montaram “quase uma linha de produção” na Tasquinha das Festas para produzir 6.000 máscaras reutilizáveis para distribuir pela população de Sobrosa. “Houve quem emprestasse máquinas de costura, outros deram materiais e a junta comprou outros. Nós demos a mão-de-obra: umas cortavam, outras vincavam, outras faziam dobras e cosiam”, conta Diana Costa, da comissão.

Todos os voluntários, dos 12 aos 65 anos, ajudaram. “Os mais novos embalavam e cortavam linhas. Resolviam os pormenores”, refere. “Fizemos algumas noitadas, muita gente que estava em lay-off veio ajudar, e produzimos todas praticamente numa semana”, descreve Diana Costa.

Depois ajudaram ainda na distribuição das máscaras por toda a freguesia. “O espírito que se criou foi muito bom. A população ficou muito envolvida e recebemos muitos agradecimentos. Foi um trabalho muito gratificante para todas nós”, garante a jovem da comissão de festas. Numa outra vertente, também solidárias, as 25 festeiras já se tinham unido para comprar viseiras que doaram ao IPO do Porto.

Agora continuam a produzir máscaras, algumas reutilizáveis e outras de uso único para vender a custo simbólico. A meta é angariar verbas para as festas em honra de Santa Eulália e São Sebastião de Sobrosa no próximo ano. “Queremos fazer mais cinco mil. Temos várias encomendas. Umas custam 0,50 cêntimos e as outras 1,50 euros”, adianta.

Ao lado, na freguesia de Vilela, houve iniciativa em tudo idêntica. Um grupo de voluntários produziu 3.000 máscaras laváveis para a Junta de Freguesia distribuir à população. Chegaram a estar 14 mulheres a produzir. Depois dessa meta cumprida, também não pararam. Fizeram mais 5.000 máscaras reutilizáveis para enviar para Moçambique. “Cada um fez um bocadinho e fizemos a nossa parte”, diz Joaquim Silva, empresário que apoiou o processo.

“Super voluntários” disponibilizaram-se em todos os concelhos para ajudar

Centenas de voluntários inscreveram-se nos bancos de voluntariado criados pelas autarquias da região, tendo como meta dar apoio no âmbito da pandemia COVID-19, nas mais diversas tarefas. Isso aconteceu em Lousada, Paços de Ferreira, Paredes e Valongo.

Em Valongo o pelo para “super voluntários” visava o apoio à logística da Protecção Civil, participar na distribuição de alimentos e/ou medicamentos a pessoas isoladas, dar apoio telefónico (pequenas informações, acompanhamento de pessoas em isolamento), fazer apoio nos lares de campanha com população sénior, ajudar com passeio de animais de estimação, entre outras tarefas.

Miguel Oliveira, um comercial de 46 anos, foi um dos que respondeu sim ao apelo. Nunca tinha feito voluntariado. “Ajudei na montagem de camas no hospital de campanha. Estive na Câmara a ajudar a montar routers para alunos que não tinham internet e depois fui para o centro de rastreios de Valongo”, explica o valonguense. Esteve lá durante três dias, equipado a rigor com fato e viseira a controlar a entrada de pessoas e a indicar às que tinham marcação como proceder.

“A minha empresa estava em lay-off, tinha tempo disponível e resolvi ajudar”, conta Miguel, que já regressou entretanto ao trabalho. “Nunca tinha sido voluntário, mas não me dou parado. Gostei da experiência de ajudar as pessoas. Muitas vinham muito aflitas com a possibilidade de poderem estar infectadas”, admite.