Vila Real de Santo António, onde me encontro para algumas semanas de férias é a terra natal de minha mulher. Já cá não temos a saudosa companhia de seus pais e avó que durante muitos anos aqui nos acolhiam com inexcedível carinho. Temos cá muitas pessoas de família e uma delas ofereceu-nos há dias uma preciosa coleção de postais antigos da cidade.
Nesses postais chamaram-me particularmente a atenção o bulício dos barcos no Guadiana e a azáfama das fábricas de conservas. Numa terra pequena como esta chegou a haver na década de 1940 nada menos de 24 dessas fábricas, que davam trabalho a perto de 1500 pessoas! Conservava-se a sardinha mas sobretudo o atum, capturado nas migrações entre o Atlântico e o Mediterrâneo de grandes cardumes ,em águas a sul do Algarve.
Entretanto essas fábricas desapareceram, como de resto aconteceu a grande parte delas pelo país fora. Dessas conservas de peixe restam algumas tradições como as do atum, do qual se pode obter além das partes frescas para a culinária tradicional algarvia, algumas saborosas especialidades preparadas numa pequena oficina. Trata-se de ovas secas, muxama que lembra o presunto, embora seja mais macia, atum fumado e a estupenda estupeta de atum. Esta consiste em farripas em salmoura que para se consumirem se desfiam mais e se passam por água até perderem parte do sal; depois servem-se, frias e temperadas, com tomate e pimentos.
A cidade do presente, já sem fábricas conserveiras, apresenta interessantes coisas novas como a biblioteca, o complexo desportivo e a marina, além de outras antigas como o imponente farol, bem conservado e a funcionar, mesmo com as modernas ajudas do GPS à navegação. Este ano surgiu uma grande coleção de esculturas urbanas que representam ofícios antigos e animais que por aqui aparecem: flamingo, mocho, camaleão, cegonha e borboletas.
Permita-se-me um devaneio etimológico que o título do artigo me suscitou. Assim, vem a “conservatória do registo civil”, onde obviamente se guardam ou “conservam” os registos de nascimentos, casamentos, óbitos e outras efemérides. O que pode não se atender é à palavra “civil” que distingue tais registos dos muito mais antigos nos quais se assentavam também o batismo e o crisma, nas paróquias. Recordo com saudade um velho amigo, engenheiro, que às tantas me perguntou se eu sabia de onde vem a designação de engenharia “civil”. Respondi-lhe que não sabia e ele, todo lampeiro e feliz, disse-me que servia para a distinguir da engenharia militar, por sinal a sua especialidade. O que eu ainda não sei, nem tive a pachorra de pesquisar, é o que se conserva num conservatório. Enquanto aguardo que alguém mo explique, termino com duas quadras do poeta popular desta terra, António Aleixo, cujas agruras enquanto viveu – e foram muitas – não o impediram de expressar sabedoria e bom humor.
Para não fazeres ofensas/ E teres dias felizes/ Não digas tudo o que pensas/ Mas pensa tudo o que dizes
Entre leigos ou letrados/ Fala só de vez em quando/ Que nós às vezes calados/ Dizemos mais que falando