Depois de se ter remetido ao silêncio quando, há cerca de duas semanas, a direcção da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Cete (AHBVC) se ter demitido em bloco, alegando divergências entre o comando e a direcção, o comandante da corporação, Noel Ferreira, emitiu um longo comunicado em que aponta várias críticas ao presidente demissionário e o acusa de mentir.
No documento enviado à comunicação social, Noel Ferreira diz que quer repor “a verdade” e começa por dizer que o seu lugar sempre esteve à disposição. “Sempre estive consciente que a direcção podia demitir-me, quando considerasse que o meu perfil de comandante não correspondesse ao pretendido para a corporação. Como se verificou, a direcção demissionária não entendeu demitir-me. Se sou assim tão mau como apregoaram, desde início, bastava destituir-me do cargo!”, sustenta.
Ataca depois o presidente demissionário, Paulo Pinto, garantindo que os seus pedidos de demissão eram frequentes e terão acontecido pelo menos quatro vezes. “Tinha de lidar com estas constantes mudanças de humor e vontade. Refira-se que nunca esta instabilidade foi passada para o corpo activo, servindo eu de escudo a todas estas intempestivas vontades”, alega o comandante. A penúltima “demissão”, refere, terá acontecido a 6 de Janeiro deste ano, altura em que chegou “ao cúmulo de não ter a certeza se ainda era efectivamente presidente ou não” e que enviou um email ao presidente da Assembleia Geral a questionar quem era o presidente.
Noel Ferreira nega que não tenha tentado dialogar com a direcção
“Desta vez, o demissionário presidente da direcção efectivamente quase me fez acreditar que se ia demitir mesmo, sendo que à data invocou motivos como o facto de se aproximar um período de muito trabalho, disponibilidade e sacrifício. Explicou que o quartel precisava de obras de grande dimensão, que existe uma necessidade absoluta de viaturas de socorro e incêndio, assim como a necessidade de material e equipamento para os bombeiros. Com todas estas adversidades, inumeradas pela mesma pessoa que agora diz que fez tudo e está tudo bem, informou o presidente da assembleia não reunir condições para enfrentar estas circunstâncias prevendo um mandato difícil e no qual não conseguiria manter a estabilidade. Mas…para meu espanto, afinal decorridos quase dois meses na incógnita, depois de eu próprio ter questionado, foi-me comunicado que afinal continuava a ser presidente da direcção”, explica o comunicado.
No email enviado a Saúl Ferreira, presidente da Assembleia Geral da associação humanitária, Noel Ferreira escreveu: Como é do conhecimento de V/Exa., esta atitude e vontade de demissão do Exmo. sr. presidente da AHBVC é recorrente, sendo que desta vez a reflectiu em texto enviado a V/Exa. No passado, apenas alguns meses atrás, acedi a reunir com o Exmo. sr. presidente da AHBVC também com vista à resolução do que eventualmente lhe possa chamar de conflito entre partes, mas, o facto é que decorridos uns meses a vontade demonstrada pelo Exmo. sr. presidente da AHBVC é exactamente a mesma. Não me revejo nisto, e como referi, não percebo sequer onde possa ser enquadrado num processo/problema que aos órgãos sociais diz respeito, dado que até à data desconheço qualquer erro ou acção, da minha parte, no que às minhas funções diz respeito ou que de alguma forma tenha prejudicado a AHBVC”.
Abordando tópico a tópico algumas afirmações feitas pela direcção cessante na comunicação social, o comandante dos Bombeiros Voluntários de Cete critica desde logo o uso da palavra “ingratidão” por Paulo Pinto. “É no mínimo ridículo intitular alguém que deixa a própria família para socorrer a dos outros, mesmo daqueles que os intitulam de ingratos, voluntariamente. Lamento que o demissionário presidente da direcção pense de outra forma e principalmente faça questão de expressar tal ideia nos jornais”, escreve.
Nega ainda que tenha recusado dialogar com a direcção cessante, e diz que estava uma reunião já agendada para os dias seguintes àqueles em que apresentaram demissão.
“Nunca exigi, nada. Sempre solicitei e propus”
Sobre a alegada divergência sobre o pagamento de um euro por hora aos bombeiros voluntários, Noel Ferreira critica: “o agora demissionário presidente da assembleia geral, em entrevista garantiu que era uma exigência minha, mas de onde saiu essa ideia se nem sequer faz parte do órgão executivo? A explicação parece-me simples, ouviu apenas uma das partes e infelizmente não assumiu o papel que lhe é devido, de moderação e imparcialidade”.
Diz que essa fez parte de um leque de propostas que apresentou e que representaria um custo de cerca de 200 euros por mês. “Em reunião de direcção obtive uma boa receptividade à proposta (…) Nunca me foi comunicado que não havia possibilidade de pagamento nem que a proposta seria uma má ideia. Nunca foi uma exigência, mas sim proposta, como tantas outras”, alega. “Nunca exigi, nada. Sempre solicitei e propus”, garante.
Quando o presidente da direcção cessante, Paulo Pinto, diz que os directores tiveram que “meter dinheiro do próprio bolso” para manter a instituição em funcionamento, Noel Ferreira clarifica que há “uma tremenda diferença entre meter dinheiro e adiantar dinheiro”. “Efectivamente um director adiantou dinheiro”, diz. Afirma ainda que, desde a tomada de posse despendeu cerca de 13.800 euros para os Bombeiros de Cete, desde 400 euros por mês para viagens, 1500 euros para ter um EPI e farda, 1000 euros para um portátil para os bombeiros conseguirem trabalhar, dá como exemplo, acrescentando ainda que adiantou dinheiro para outras coisas como refeições dos soldados da paz, material para formação, combustível ou portagens.
Garante ainda que é “mentira” que o presidente demissionário não conseguisse falar com ele há dois meses. “Ainda estou à espera da resposta ao email que enviei no dia 31 de Maio às 19h54. Em conhecimento seguiram todos os directores, mas aparentemente ninguém se lembra”, frisa.
Paulo Pinto não devia sair de consciência tranquila pela “campanha difamatória” que fez
Noel Ferreira aponta ainda como “gota de água” para ter colocado a hipótese de demissão em cima da mesa o facto de não terem sido pagas horas feitas por voluntários no serviço da Central. “Gota de água para tomar a posição que tomei foi a direcção comunicar que não iam pagar, como ecfetivamente não pagaram, o trabalho feito por alguns bombeiros para conseguir manter a normal operação do quartel”, refere.
Argumenta ainda que a direcção cessante mente quando afirma que não esperava que o comandante tomasse essa posição. “Sabiam que ninguém aguentaria muito mais tempo o que fui aguentando. Naturalmente, após consecutivas ‘demissões’ e eu ter cedido e aceite os seus pedidos de desculpa todas essas vezes, caso continuasse com a mesma atitude, que continuou, era óbvio que mais tarde ou mais cedo o desfecho seria este”, sustenta Noel Ferreira.
Quando Paulo Pinto garantiu que saía “de consciência tranquila”, o comandante da corporação critica. “Não devia, principalmente pela campanha difamatória e infeliz que fez com entrevistas totalmente irresponsáveis. Só serviram para tentar denegrir a imagem da corporação, mais uma vez unicamente por puro orgulho”, acusa.
Este comunicado do comandante surge a três dias das eleições que vão decidir o próximo presidente da associação humanitária. Estão agendadas para domingo e há dois candidatos.