Doença genética rara; acumulação de cobre em órgãos como cérebro, figado e olhos; sem cura; dificuldade em andar; espasmos nos membros superiores; alterações de comportamento e personalidade; perda da capacidade de falar e dificuldade em deglutir. Estes foram apenas alguns dos termos que Maria João Vasconcelos ouviu dos médicos há duas décadas quando lhe foi diagnosticada Doença de Wilson. Tinha 21 anos. A partir daí tudo mudou.
A terminar o Ensino Secundário em Ermesinde, em 1995, Maria João trabalhava complementarmente em part-time numa grande superfície do concelho. Em plena época de exames, recorda a mãe Maria Júlia Pereira, surgiram sintomas, como ansiedade, depressão e fala arrastada, que levaram à procura de ajuda médica. Foi então medicada como se de uma depressão se tratasse. Com os sintomas a persistirem, procuraram segunda opinião médica e foi então que Abílio Vilas Boas, médico em Ermesinde e actualmente presidente da Assembleia Municipal de Valongo, rapidamente concluiu, através de uma análise aos olhos, mais precisamente aos anéis de Kayser-Fleischer (a acumulação de cobre provoca uma mudança na pigmentação dos olhos), pelo diagnóstico de Doença de Wilson, neste caso com predominância de sintomas neurológicos. De referir que os principais locais de acumulação de cobre são o fígado e o cérebro, causando lesões nos respectivos órgãos. Seguiu-se uma série de exames que confirmaram a doença genética hereditária. O agregado familiar, pais e irmã mais nova, realizaram também exames e constatou-se que os pais são ambos portadores e que a irmã mais nova tem também a Doença de Wilson, detectada numa fase precoce, sem lesões neurológicas que lhe permite viver com normalidade, ainda que medicada. A família alargada também fez os exames e foram detectados casos de portadores. A terapêutica exigiu a toma diária de 14 comprimidos, para controlar o cobre no organismo e os espasmos, e a redução do consumo de alimentos ricos em cobre. Em pouco tempo, recorda Maria João, perdeu 10 quilos e muita massa muscular.
Lesões irreparáveis
Apesar da rápida progressão, a doença estagnou mas deixou lesões irreparáveis a Maria João Vasconcelos, hoje com 41 anos. Actualmente toma 10 comprimidos por dia, já que o nível de cobre no organismo desceu. Mas o diagnóstico e todas as consequências, neste caso, confirmaram-se. As lesões neurológicas levaram Maria João a perder o controlo motor fino, limitaram muito a mobilidade, obrigando ao uso de cadeira de rodas para as deslocações, alteraram a fala, bem como provocaram dificuldade na deglutição. Por tudo isto, Maria João tem de estar permanentemente acompanhada e dependente de ajuda. Mas isso não significa ficar em casa. Devido à incapacidade está reformada, mas Maria João não parou. Frequenta diariamente o Centro de Actividades Ocupacionais da Associação dos Deficientes das Forças Armadas.
Notícia “caiu que nem uma bomba”
E por isto, tudo mudou! Não só para Maria João, mas também para os pais, que a acompanham em todas as situações. A mãe Maria Júlia Pereira recorda que o diagnóstico “caiu que nem uma bomba”. “Não se tinha a noção da evolução que teria”, diz, salientando que havia um grande desconhecimento em relação à doença. “Passa-se a viver em função da pessoa”, conta. Maria Júlia Pereira lamenta que não haja mais ajudas por parte do Estado às famílias com estes problemas. É que não obstante a medicação ser comparticipada, não há isenção apesar de estar classificada como doença genética rara. De referir que até à redução do número de comprimidos diários, a medicação custava mensalmente 200 euros. Hoje gasta 100 euros só para os medicamentos específicos para a Doença de Wilson. O medicamento mais importante, refira-se, aumentou 10 vezes o valor inicial. Custava pouco mais que um euro e hoje custa 10 euros.
Doença de Wilson: o que é?
A Doença de Wilson é uma doença genética rara, provocada pela incapacidade do corpo em metabolizar o cobre. Este problema faz com que haja uma acumulação de cobre no cérebro, rins, fígado e nos olhos, causando lesões nos órgãos. É uma doença hereditária que não tem cura, mas existem medicamentos e procedimentos que podem ajudar a reduzir o cobre no organismo e melhorar os sintomas da doença. O principal método de prevenção das complicações da doença de Wilson é o diagnóstico precoce.
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