Há cerca de três semanas, vários proprietários de terrenos junto ao Parque Empresarial de Baltar, em Paredes, foram surpreendidos ao verem as suas propriedades invadidas por máquinas da empresa Edilages, que procederam ao abate de árvores e a trabalhos de terraplanagem. A Câmara Municipal de Paredes celebrou um contrato de promessa de compra e venda para um terreno de aproximadamente 60 mil metros quadrados com a empresa RENIMOGAL – Empreendimentos Imobiliários, S.A., no entanto, mais de 40 mil metros quadrados são, segundo os proprietários, terrenos privados que nunca foram vendidos à autarquia.

“Tinha lá eucaliptos, agora está tudo terraplanado”

Felisberto Moreira, de 84 anos, dono de um dos terrenos em questão, conta que soube do sucedido há cerca de duas semanas, depois dos incêndios na região. “Tinha lá eucaliptos e fui ao terreno para ver como estava a vegetação. Quando me apercebi, estava tudo terraplanado e estavam lá máquinas a trabalhar”, relatou. No início, pensou ter-se enganado de local, mas ao confrontar os trabalhadores, foi informado de que o terreno pertencia à Edilages. Mais tarde, numa conversa com o administrador da empresa, Daniel Rocha, este teria garantido a Moreira que “o terreno era dele porque tinha feito uma permuta com a Câmara”.

Desconfiado da situação, Felisberto Moreira contactou outros donos de terrenos nas imediações, incluindo a paróquia de Parada. “Como vi que existiam outros terrenos à volta na mesma situação, liguei para a paróquia, que também tem terrenos ali, e já sabiam. E começámos a ligar a outros proprietários e, neste momento, somos uns 12 nesta situação”, explica. “Como é que a Câmara Municipal cede através de permuta terrenos que não lhe pertencem? Não consigo perceber”, afirma.

“Os meus pais estão muito tristes”

Outro proprietário, José Teixeira, também soube do abate de árvores quando visitava o terreno com o pai, logo após os incêndios. Ao ver máquinas em operação e os eucaliptos derrubados, Teixeira questionou o encarregado da obra, que afirmou que o terreno pertencia à Edilages. “Ainda não sei muito bem o que se passa. Falei com outros proprietários, e estavam na mesma situação”, diz José Teixeira. Após demarcar o local, constatou que alguns dos marcos estavam partidos.

Teixeira lamenta a perda das árvores que constituíam uma fonte de rendimento para os pais. “Os meus pais estão muito tristes”, afirma, acrescentando que “o problema é que abateram as árvores que eram uma ajuda na reforma. E agora, como se vai resolver?”, questiona.

“Não estava à espera de um roubo destes”

Firmino Leão, outro proprietário com cerca de 18 mil metros quadrados de terreno invadido, também relata a surpresa ao ver o seu terreno desmatado. “Não estava à espera de um roubo destes. Fui lá e nem queria acreditar quando vi tudo descampado”, desabafa. Leão afirma que apenas soube da invasão quando lhe perguntaram se tinha vendido a propriedade. Determinado a defender os seus direitos, Firmino Leão assegura: “Isto não pode ficar assim.”

Câmara admite contrato promessa e permuta sem detalhes

Apesar de existir um contrato de promessa de compra e venda entre a Câmara Municipal de Paredes e a RENIMOGAL, a escritura definitiva ainda não foi realizada, o que significa que o terreno oficialmente não pertence à empresa que, no entanto, já se apresenta como proprietária.

Questionada sobre a situação, a autarquia apenas afirmou que “a escritura será feita brevemente”, sem explicar como legalmente assumirá a posse de terrenos privados.

Instada ainda sobre os valores da venda e a natureza da transação, a Câmara limitou-se a indicar que “houve uma permuta de parte do valor, com um terreno em Cete e outro em Baltar para a construção de habitações a rendas acessíveis”, mas recusou especificar valores ou fornecer mais detalhes.

Edilages responde com silêncio

O VERDADEIRO OLHAR questionou também a Edilages sobre a relação entre a empresa e a RENIMOGAL, responsável pelo contrato promessa, e ainda sobre a autorização para avançar com obras em terrenos que não lhe pertencem legalmente. A unidade respondeu por email, indicando apenas que “o assunto tinha sido encaminhado para o departamento de património, pelo que daremos resposta assim que nos seja possível”. Desde então, não houve mais esclarecimentos.

Reuniões com a Câmara e ameaças de expropriação

Perante a pressão dos proprietários, a Câmara Municipal organizou reuniões individuais, lideradas pela vereadora Tânia Ribeiro. Segundo José Teixeira, durante o encontro, a vereadora afirmou que a situação “já vinha do anterior executivo”. Teixeira diz ter ficado ainda mais confuso. “Disseram que venderam, depois era uma cedência e depois já falaram em permuta. Não percebi nada”, confessa.

Felisberto Moreira vai mais longe e revela que a autarquia ameaçou recorrer à expropriação, caso os proprietários não concordassem com a venda. “Foi-nos dito na Câmara que ou vendemos ou usam outros meios. Conheço a lei e não podem usá-la como se estivéssemos no tempo da PIDE”, desabafa.

Câmara justifica reuniões para verificar titularidade

Questionada sobre as reuniões e as acusações de ameaça de expropriação, o município esclareceu que o objetivo das reuniões é “permitir que os proprietários mostrem os documentos dos terrenos que dizem ser seus e verificar onde confrontam com os nossos”. Quanto à alegada pressão para vender, a autarquia afirmou apenas que “neste momento, estamos a reunir com esses proprietários para avaliar as situações e em conjunto tomarmos decisões”.

Enquanto isso, os proprietários esperam respostas claras e ações para reverter os danos causados, mantendo a expectativa de que os seus terrenos sejam protegidos e respeitados.

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