Lealdade, transparência e frontalidade. São esses três pilares que Filipe Carneiro quer implementar nos Bombeiros Voluntários de Cete.
Depois de um percurso de mais de 20 anos como bombeiro voluntário, iniciado na corporação de Santo Tirso, na qual foi comandante até Novembro de 2022, Filipe Carneiro aceitou o desafio de liderar os Bombeiros de Cete. É comandante há cerca de um mês e toma posse oficial do cargo numa cerimónia agendada para 15 de Janeiro.
Promete um trabalho de proximidade, “para que todos sintam que são uma equipa” e para que “o corpo de bombeiros seja um só”, e ainda rigor, transparência e, sobretudo, estabilidade, rumo ao centenário da associação humanitária.
Elogia, desde já o “espírito de bombeiro” que encontrou na corporação de Cete, de missão e de amor à instituição, algo que se te tem vindo a perder noutras corporações do país.
“A maior riqueza que herdei na vida foi ser criado pelos meus avós”
Os pais emigraram cedo e Filipe Carneiro foi criado pelos avós, em Santo Tirso, de onde é natural. Viviam ao lado do antigo quartel e a proximidade do avô aos bombeiros levou-o a estar sempre pela corporação, desde criança. Às vezes fugia de noite e dormia dentro dos carros de bombeiros, relata. Foi com os avós, dos quais muito se orgulha, que aprendeu “princípios e valores”. “Fizeram de mim o homem que sou hoje. A maior riqueza que herdei na vida foi ser criado pelos meus avós”, garante o comandante.
Podia ter sido padre, a vocação ainda lá está, comenta. Durante anos, partilhou a formação de bombeiro com o seminário, que frequentou até aos 18 anos. O apelo dos bombeiros foi mais forte. Tinha-se inscrito aos 13 anos. E nunca esqueceu a expressão usada pelo, na altura, comandante dos Bombeiros Voluntários de Santo Tirso: “Este vai dar bombeiro”. E deu.
Foi na corporação que fez inúmeras formações e especializações, progredindo na carreira até chegar a bombeiro de primeira. Assumiu o cargo de adjunto dos Bombeiros de Santo Tirso, entre Março de 2017 e Julho de 2019, altura em que tomou posse como comandante da corporação. Integra ainda a direcção da Federação de Bombeiros do Distrito do Porto, na função de vogal.
Foram 21 anos dedicados à corporação da terra onde reside. Terminou a ligação porque “há um tempo para tudo na vida”, mas guarda “uma experiência bonita”. “Não há comandante sem bombeiros e eles estiveram sempre ao meu lado”, realça Filipe Carneiro.
“Senti-me na responsabilidade de vir ajudar Cete e de dignificar o centenário da associação humanitária”
Ser comandante de Cete foi algo que não procurou. Ao sair de Santo Tirso contava ir para a zona de Lisboa, onde a mãe reside, e procurar uma corporação por lá.
Mas quando foi desafiado, aceitou. “Senti-me na responsabilidade de vir ajudar Cete e de dignificar o centenário da associação humanitária. Podem contar comigo para ter um centenário digno, queremos fazer história nesse dia de forma unida. É o meu compromisso manter a estabilidade até lá”, sustenta. A corporação, que serve as freguesias de Cete, Parada de Todeia, Sobreira, Recarei e Aguiar de Sousa, comemorou em 2022 os 97 anos de existência.
Filipe Carneiro não conhecia a corporação, assume. Mas encontrou em Cete uma comunidade que confia na instituição e uma associação humanitária “em notório crescimento”. Diz que o motivaram a aceitar a “a dinâmica de uma direcção voltada para o futuro e com respeito pelos bombeiros”. “Noto um grande espírito de voluntariado nestes bombeiros. E só estou cá há um mês. Problemas existem em todos os corpos de bombeiros, não há nenhum perfeito”, salienta.
Em Cete, o novo comandante quer desenvolver um trabalho de proximidade – não só aos bombeiros, mas à comunidade -, que una a instituição, com transparência, rigor e disciplina, com vista à estabilidade. “Um corpo de bombeiros é uma estrutura hierarquizada em que cada um tem a sua função”, aponta. “Lealdade, transparência e frontalidade” serão os pilares do seu comando. E ser uma pessoa externa à corporação pode ajudar, acredita.
A liderança que quer implementar é baseada na hierarquia, sendo as chefias “fundamentais na gestão” e quer que os bombeiros “se sintam acarinhados”. Será “um escudo” para eles, garante.
Para completar o comando, irá buscar fora um segundo comandante, avança. Já para adjuntos, irá propor à direcção os mesmos que estavam no último comando existente, nos quais deposita “toda a confiança”.
Quer ambulância INEM e nova EIP
Desde que chegou, Filipe Carneiro já avançou para uma campanha de recrutamento, “para assegurar o futuro”.
Em termos práticos, a aposta vai passar pela formação dos operacionais, pelo acompanhamento das necessidades em termos de equipamentos e recursos humanos e pela exigência de melhorias das infra-estruturas, quando necessário.
Em termos humanos, quer “trabalhar mentalidades, disciplina e rigor”. “Mas vejo aqui bons homens, com espírito de bombeiros”, frisa.
Quer reorganizar e reestruturar a corporação de Cete. “Mas existem muitas coisas que estão bem. O meu principal papel é orientar e respeitar”, diz.
Entre os objectivos estão ainda ter na corporação uma ambulância INEM e lutar por uma segunda EIP – Equipa de Intervenção Permanente.
Filipe Carneiro admite que tem “um grande apreço pelo espírito de voluntariado”, mas que defende um equilíbrio entre o voluntário e o profissional, devendo ser o bombeiro voluntário um complemento ao bombeiro profissional. “As corporações devem basear-se cada vez mais numa base profissional. O voluntariado é precioso, e temos de o aproveitar, mas deve ser complemento. Não podemos viver com as sirenes a tocar tempos infinitos. Devemos dar passos bem assentes e nunca descurar o verdadeiro voluntariado. Serei sempre defensor do verdadeiro bombeiro voluntário”, afirma o novo comandante.
Quanto ao actual panorama do voluntariado a nível nacional, Filipe Carneiro argumenta que as câmaras e o Estado têm de assumir as suas responsabilidades. “O Governo central tem de decidir, de uma vez por todas, o caminho que quer para os bombeiros portugueses”, defende, já que os bombeiros têm uma diversidade de papéis, mas só são lembrados na altura dos incêndios e não podem estar dependentes de “sensibilidades políticas”. Falta sobretudo “reconhecimento”.
Cete poderá ser o seu último comando, avançou Filipe Carneiro, já a ligação e amor aos bombeiros “será até morrer”.