Em Portugal ainda há poucos casos em que o medo da vacina é superior ao medo da doença. No nosso país o Programa Nacional de Vacinação (PNV) é um caso de sucesso, com taxas de vacinação acima de 96%, mas é preciso manter os esforços e enfrentar novos desafios. E é preciso ainda assim lutar contra a ideia de não vacinação. As conclusões são do encontro “Estórias sobre vacinas”, organizado pelo Serviço de Pediatria do Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa (CHTS), no auditório do Museu Municipal de Penafiel, na passada sexta-feira. A iniciativa, sobretudo dedicada a profissionais de saúde, teve como propósito assinalar os 50 anos do PNV.
Na região, mostram os dados sobre a vacinação nos ACES do Tâmega, Vale do Sousa Sul e Vale do Sousa Norte, divulgados pelo novo portal do Serviço Nacional de Saúde, as taxas de vacinação são elevadas.
PNV tem “níveis elevados de procura” e “pouca hesitação”
Variolação, Primeira Vacina, Histórias das Vacinas, História do Programa Nacional de Vacinação, Movimentos Anti-vacinas, Doenças de Declaração Obrigatória (DDO) e Cobertura Vacinal foram alguns dos temas abordados neste encontro, que reuniu algumas dezenas de profissionais de saúde no Museu Municipal de Penafiel.
As conclusões são mais que positivas. O Programa Nacional de Vacinação tem “níveis elevados de procura” e “pouca hesitação” na hora de tomar a vacina. Ou seja, os portugueses aderem, por norma, ao PNV. Portugal tem mesmo das melhores taxas de cobertura de Europa, a rondar os 96%. “A nossa população está imunizada. Mas estamos sempre a preparar-nos para as situações de hesitação, que são normais”, explica Ana Leça, vice-presidente da Comissão Técnica de Vacinação da Direcção-Geral da Saúde (DGS). E é esse o grande desafio do PNV para o futuro, lidar com as hesitações relacionadas com a vacinação e os movimentos anti-vacinas, ainda pouco estruturados na Europa e no nosso país.
“O controlo das doenças levou ao esquecimento ou desvalorização da sua gravidade”
“A vacinação já não é percebida como medida preventiva necessária porque o controlo das doenças levou ao esquecimento ou desvalorização da sua gravidade. O medo da vacina acaba por ser superior ao medo da doença”, clarifica Ana Leça. “Um problema que é recorrente é o da hesitação. As pessoas não são 100% contra nem 100% a favor da vacina, mas questionam. É preciso saber informar as pessoas que aquela vacina é importante e que a vai proteger contra uma doença que é grave, mas que ela não conheceu porque foi controlada”, acrescenta a responsável da DGS. Esta desmistificação e a continuidade do PNV são a única forma de evitar que algumas doenças reapareçam. Um dos casos citados foi o de uma criança de seis anos, da Catalunha, que morreu por difteria, porque os pais tinham medo da reação adversa à vacina e não a tinham vacinado.
Quando os pais recusam a vacinação, algo que em Portugal ainda não é algo frequente, é preciso mostrar que as vantagens da vacinação são maiores que as da recusa, explica Margarida Vieira. “É preciso perceber o que preocupa os pais e deixar a porta aberta se mudarem de opinião”, afirma a enfermeira responsável pelo Programa Nacional de Vacinação no Departamento de Saúde Pública da Administração Regional do Norte (ARS-N).
“O PNV é um caso de sucesso mas é preciso manter os esforços para que haja bons resultados numa altura em que há mais desafios do que nunca”, defende Ana Leça.
“Estamos livres de varíola e estivemos a um passo de erradicar o sarampo e a poliomielite”
Antes disso, a vice-presidente da Comissão Técnica de Vacinação da DGS lembrou os anos do início do PNV e da criação do boletim de vacinas individual. Este serviço nacional e gratuito nasceu em 1965, incluindo vacinas de “primeira linha”, as mais seguras e eficazes. “Temos um programa de vacinação muito rico e caro, típico de países europeus mais ricos”, sustentou Ana Leça.
Isso permitiu erradicar doenças como a varíola e que, desde 1987, não haja nenhum caso registado de poliomielite em Portugal. “Aos 3 meses 95% das crianças fizeram as vacinas recomendadas”, adianta esta responsável.
O país, tem, concorda Assunção Frutuoso, coberturas acima dos 96%, que “são de excelência” e melhores que as de muitos países desenvolvidos e nórdicos. Mais que isso, as coberturas vacinais são elevadas e consistentes ao longo dos últimos anos. “Estamos livres de varíola e estivemos a um passo de erradicar o sarampo e a poliomielite, mas é preciso manter os esforços”, afirma a responsável pelo PNV no Departamento de Saúde Pública da ARS-N. E deixa um alerta: “É preciso monitorizar a chegada dos refugiados para que não haja surtos e para que não seja posta em causa a imunidade de grupo. É uma questão de os proteger a eles e a toda a comunidade”.
Casos de sarampo no país são importados
Desde 2004 que não há nenhum caso de sarampo com origem no nosso país. Os que foram registados entretanto são casos “importados”, ou seja, em que o doente veio para o nosso país depois de ter sido contagiado noutro local.
Na região Norte houve dois, um em 2011 e outro em 2012. O primeiro caso começou com um engenheiro que trabalhava em França e que não tinha sido vacinado contra o sarampo. O homem exibiu sintomas e foi medicado com um antibiótico no serviço de saúde francês. Quando regressou a Portugal foi internado e foi feito o diagnóstico. O irmão mais novo foi logo vacinado e este caso não originou nenhum contágio secundário, contou a enfermeira Margarida Vieira.
O mesmo não aconteceu em 2012. Um homem de 35 anos que esteve em Xangai por motivos profissionais exibiu sintomas de sarampo já em Portugal. Primeiro também foi medicado com antibiótico, mas acabou por ser internado no Hospital de São João. O filho de 11 meses foi vacinado de imediato mas o contágio já tinha acontecido e acabou por ter que ser internado. “Se frequentasse o infantário poderia ter havido um surto”, dá como exemplo Margarida Vieira. Também uma colega de trabalho desse homem foi contagiada e passou a doença à filha bebé.
Em 2015
Mais de 130 mil vacinas administradas no Vale do Sousa
ACES | N.º de vacinas administradas | Proporção de crianças com o PNV cumprido até 2 anos | Proporção de crianças com o PNV cumprido até 7 anos | Proporção de crianças com o PNV cumprido até 14 anos | Proporção de idosos ou utentes com doença crónica com vacina da gripe | |||||
2014 | 2015 | Dez-14 | Nov-15 | Dez-14 | Nov-15 | Dez-14 | Nov-15 | Dez-14 | Nov-15 | |
ACES Tâmega II Vale do Sousa Sul | 66.066 | 69.117 | 96,60% | 96,30% | 96,10% | 95,80% | 92,80% | 90,90% | 44,90% | 46,10% |
ACES Tâmega III Vale do Sousa Norte | 58.657 | 63.730 | 94,00% | 94,90% | 95,00% | 97,20% | 93,50% | 92,50% | 46,70% | 49,10% |
*Dados do portal do Serviço Nacional de Saúde - https://transparencia.sns.gov.pt/ |
Segundo os dados de transparência do novo portal do Serviço Nacional de Saúde, em 2015, foram 132.847 as vacinas realizadas através dos dois agrupamentos de centros de saúde do Vale do Sousa. No ACES Tâmega II Vale do Sousa Sul foram administradas 69.117 vacinas, mais três mil que em 2014. E no ACES Tâmega III Vale do Sousa Norte o número foi de 63.730, um aumento de cerca de cinco mil em relação ao ano anterior.
Na área de abrangência da ARS Norte foram administradas, em 2015, quase 1,5 milhões de vacinas.
A cobertura vacinal na região é elevada. A proporção de crianças com o PNV cumprido até aos dois anos de idade era de 96,3% e de 94,9% nos ACES do Vale do Sousa Sul e do Vale do Sousa Norte, respetivamente, em Novembro de 2015 (os dados de Dezembro ainda não estão disponíveis). Cerca de 23 mil crianças foram vacinadas. Já nas crianças com sete anos os números são de 95,8% e 97,2% (quase 38 mil utentes nos dois ACES) e nas de 14 anos de 90,9% e 92,5% (41.815 jovens).
O número de idosos ou utentes com doença crónica que optam pela vacina da gripe tem vindo a crescer, mostram os dados. Em 2015, mais de 58 mil pessoas dos seis concelhos do Vale do Sousa foram vacinadas.