A Sofigel, empresa que foi distinguida com o prémio de Mérito Municipal de Integração de Pessoas com Deficiência, atribuído pela Câmara de Valongo, foi criada em 2009 pelos irmãos André e Sofia Gomes e uma prima destes. Começou com os três administradores já nomeados e com cinco funcionários, dois deles, tal como Sofia, surdos. Hoje, a empresa sedeada em Ermesinde, Valongo, cresceu, tem 14 trabalhadores e uma facturação anual superior a 500 mil euros. Mas continua a ter como sócia-gerente uma empresária surda e com dificuldades motoras. E também mantém a aposta em pessoas portadoras de deficiência.
Família criou empresa para dar emprego aos filhos
É Dulce Gomes, mãe de André e Sofia, quem resume a história de criação da empresa de salgadinhos de Ermesinde. “A ideia foi sempre a de dar emprego aos dois filhos”, conta a mulher que já tinha experiência na produção de rissóis, bolinhos de bacalhau e croquetes.
Dulce, de 58 anos, recorda que, em 2009, André tinha acabado de terminar a licenciatura e estava a estagia na Unicer sem perspectivas de lá ficar a trabalhar. Mas em pior situação estava Sofia. Na sequência de uma paralisia cerebral que a atacou logo após o parto, Sofia ficou surda e com dificuldades motoras. Mesmo assim, frequentou o ensino obrigatório e concluiu, com boa média, o secundário. Depois, sem universidades preparadas para acolher surdos, Sofia viu-se obrigada a ingressar num curso profissional. Escolheu o de Multimédia e terminou-o com distinção. Ainda conseguiu estagiar, durante um ano, numa gráfica, mas no final não encontrou colocação no mercado de trabalho. “Apesar de a Sofia ter tido uma média impecável, o Centro de Reabilitação Profissional de Gaia teve muita dificuldade para a colocar a estagiar. E mais dificuldades houve para lhe arranjar um trabalho. Tentei de tudo e promessas tinha muitas, inclusive de autarcas. Mas na realidade ninguém empregou a Sofia”, recorda.
Os três anos de inactividade que se seguiram deixaram Sofia “revoltada” e emocionalmente alterada. A solução para este problema acabou por chegar um pouco por acaso. “Um dia, o nosso pai conversou com um amigo que lhe deu a ideia de se candidatar a fundos comunitários para avançar com uma empresa. Decidimos arriscar”, lembra André.
Apoio do Centro de Emprego foi fundamental
O primeiro passo foi dado em direcção ao Centro de Emprego de Valongo, entidade à qual a família Gomes não poupa elogios. “Deram-nos um grande apoio”, frisa Dulce. André destaca a ajuda para concretizar uma candidatura que lhes valeu um subsídio a rondar os cem mil euros. “A empresa foi criada em 2009 e em Maio de 2010 começámos a funcionar”, descreve. O negócio escolhido foi o da produção de salgadinhos, área em que Dulce já tinha uma grande experiência. “A administração ficou a meu cargo, da minha irmã e de uma prima nossa”, acrescenta André.
De então para cá, o número de empregados subiu de cinco para 14 e o volume de facturação ultrapassou, no final do ano passado, a barreira dos 500 mil euros.
Empresa aposta em pessoas portadoras de deficiência
Entre os trabalhados da Sofigel estão quatro pessoas surdas. “São excelentes profissionais. O facto de falarem com as mãos dá-lhes uma agilidade extraordinária”, garante Dulce Gomes. “A nossa melhor funcionária é surda. Se ela falta, a produção baixa logo”, acrescenta André. Ambos revelam que há a possibilidade de, a breve prazo, integrar uma outra funcionária, também ela com problemas de audição. “Nem todas as pessoas surdas têm a sorte de ter um apoio familiar como a Sofia. Bem pelo contrário. Por isso, se pudermos, vamos ajudar estas pessoas”, assegura Dulce.
Deficiências não a impedem de conduzir e de ser totalmente autónoma
Apesar de todas as limitações impostas pela paralisia cerebral, Sofia Gomes é uma pessoa completamente autónoma. Actualmente, reside com os pais, mas já viveu sozinha num apartamento do qual cuidava e onde realizava tudo o que uma dona de casa tem a seu cargo.
Com 36 anos, Sofia também conduz – o carro foi adaptado com mudanças automáticas e um travão de mão – e é na sua própria viatura que percorre o trajecto que separa a sua casa na Maia da empresa situada em Ermesinde. A meio do caminho, Sofia pára, todos os dias, num café para, sem ajuda, pedir o pequeno-almoço e ler o jornal.
Já na Sofigel, Sofia começa por fazer a leitura da temperatura das arcas frigoríficas. Em seguida, dá entrada, no sistema informático, de todas as vendas e pagamentos. Também é ela que ordena as facturas e organiza o arquivo. “E ainda ajuda na produção”, assegura a mãe.
“Gosto de trabalhar”, frisa Sofia, que mantém o sonho de trabalhar na área da multimédia e da fotografia. Mas enquanto isso não acontece, a mulher de 36 anos mostra contentamento em trabalhar na empresa da família. “Tenho aqui pessoas surdas e ouvintes e isso é bom”, diz quem tem a noção de que as oportunidades rareiam para quem sofre de uma qualquer deficiência. “Os surdos ficam tristes quando não conseguem encontrar emprego. Faltam apoios e formadores, sobretudo, para as crianças. Sem formação o que que será do futuro delas?, questiona.