A vespa velutina, mais conhecida como vespa asiática, chegou a Portugal em 2011, depois de ter entrado na Europa pela França (em 2004) e se ter disseminado também por Espanha (em 2010).
Desde essa altura, que este animal exótico, de maiores dimensões que a vespa comum, tem vindo a crescer, exponencialmente, no nosso país. Até porque o plano de combate criado para fazer face ao problema visa apenas o controlo da espécie e não a sua eliminação definitiva. Algo que será difícil já que a vespa asiática não tem predadores no nosso país. O segredo passará por aprender a conviver com este animal.
Avistada, pela primeira vez, em 2013, no concelho de Valongo, e, em 2014, nos concelhos de Lousada, Paços de Ferreira, Paredes, Penafiel, a vespa velutina tem vindo a ser eliminada pelos serviços de Protecção Civil das câmaras municipais.
Desde essa altura, já foram destruídos 2.679 ninhos de vespa asiática. Só até meados de Novembro deste ano as autarquias destes cinco concelhos já eliminaram 1.609 vespeiros desta espécie. Estes são os números que ficam registados. Muitos outros não são contabilizados porque são destruídos pela população e por apicultores que procuram defender os seus apiários e colmeias. Paredes e Penafiel são os concelhos mais afectados.
O Verdadeiro Olhar acompanhou a equipa da Protecção Civil de Penafiel numa das incursões nocturnas para destruir os ninhos. É que cada ninho que completa um ciclo pode dar origem a seis novos ninhos.
Equipa da Protecção Civil de Penafiel chega a eliminar 14 ninhos por noite
Duas vezes por semana, a partir das 20h00 e, às vezes, até às 2h00 da manhã, pelo menos três elementos dos serviços da Protecção Civil da Câmara de Penafiel trocam o descanso pelo combate às vespas asiáticas no concelho.
Não vão em busca de nada. Vão munidos dos equipamentos necessários e de uma lista com os ninhos a destruir devidamente identificados. Chegam a ser 14 por noite, até porque têm sido reportados cada vez mais casos.
Esta espécie de “brigada anti-vespa” tem que resolver das situações mais simples, em que basta um pequeno frasco de insecticida, até situações complexas que exigem o uso de kits para incineração extensíveis até 20 metros, escadas ou plataformas elevatórias (15 metros).
Na noite em que o Verdadeiro Olhar acompanhou os elementos do serviço de Protecção Civil penafidelenses, havia vento a ameaçar chuva. E chegou mesmo a chover. Mas isso não travou o trabalho de José Pedro Martins, Manuel Silva, Adílio Guedes e Albano Barbosa.
Começaram na zona Castelões e São Mamede de Recezinhos, onde eliminaram um pequeno ninho mesmo por cima da porta de uma casa, com recurso a insecticida. Seguiram para Penafiel onde, mesmo pedindo autorização para utilizar o pátio de uma casa particular, o equipamento quase não chegou para atingir o ninho. Foram precisos quatro homens a segurar nas varas com cerca de 20 metros e duas tentativas para fintar o vento e conseguir, por fim, destruir o ninho que se evaporou em pouco mais de um minuto. Passaram ainda em Boelhe, numa operação mais simples, já que o ninho estava, desta vez, num muro do campo de uma habitação. Nessa noite, os funcionários do município haveriam ainda de ir a Cabeça Santa, Milhundos e Guilhufe e Urrô.
Já foram picados… mas por vespas comuns
Durante o dia, é José Pedro Martins que percorre dezenas de quilómetros a identificar o local dos ninhos, perceber se são ou não de vespa asiática – há muitos casos de falsos avistamentos -, e os meios que serão necessários para os eliminar. “Há alguns em que nem com as varas com os 20 metros se lhe chega. Nem com o camião e a grua a auxiliar”, explica. Nesses casos, manda o bom senso, afirma Paulo Bessa, Comandante Operacional Municipal (COM) da Protecção Civil de Penafiel. “Nas situações em que não se consegue aceder aos ninhos, por limitação física, não é destruído”, refere.
A experiência acumulada por estes homens tem tornado o trabalho cada vez mais simples. Picados por vespas asiáticas nunca foram, mas ainda assim guardam peripécias para contar. “Uma vez estávamos a eliminar um ninho em Rio de Moinhos e quando faltava só encaixar mais uma vara para lá chegarmos, um foi picado por uma vespa das normais. Alguém tinha calcado um vespeiro no chão. Tivemos todos que fugir”, relatam. “Não acho que as vespas asiáticas sejam agressivas”, acrescenta José Pedro Martins, ideia corroborada pelo Comandante Operacional Municipal: “a vespa velutina não é mais perigosa para os seres humanos que a vespa europeia”.
Os ninhos são eliminados durante a noite, altura em que as vespas estão recolhidas. Quando isso é feito durante o dia a tendência é para que se espalhem e gerem novos ninhos. “A principal preocupação é queimar os ninhos com cuidado, para não darmos origem a incêndios”, salienta o funcionário municipal, que já foi bombeiro. Por isso, durante o Verão e sempre que se mostra necessário são acompanhados por equipas dos bombeiros do concelho.
“Tenho notado que há cada vez mais ninhos aqui. Tem sido um ataque enorme”, lamenta apicultor
A assistir à queima de um ninho em Boelhe está Francisco Brites, apicultor que antes tinha 18 colmeias e que agora tem apenas 12 e “fracas”.
“Tenho notado que há cada vez mais ninhos aqui. Tem sido um ataque enorme”, conta o homem que, na ânsia de defender as suas abelhas, já foi picado várias vezes enquanto tenta matar vespas asiáticas à entrada das colmeias. “Ando sempre a vigiar e eu e o meu irmão já destruímos vários ninhos”, diz o apicultor. “Este ano houve pouco mel. No ano passado tive cerca de 100 quilos e este ano a produção foi de cerca de metade”, queixa-se.
“Isto tem que ser dominado. Tem que haver solução. Se isto continua assim daqui a um ano ou dois não temos abelhas”, acredita Francisco Brites.
Paulo Bessa não dramatiza. Mas também defende que o que tem sido feito não basta. “Era necessário mais do que isto”, afirma.
O plano de acção para a Vigilância e Controlo da Vespa Velutina em Portugal foi criado para diminuir o impacto da vespa asiática e prevenir a sua disseminação noutras áreas. Foi desenvolvido pela Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária e pelo Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, sendo ainda articulado com as Comunidades Intermunicipais, com o Serviço de Protecção da Natureza e Ambiente da Guarda Nacional Republicana e com as Direcções Regionais de Agricultura e Pescas.
Mas, no fundo, o combate à expansão destas vespas exóticas acabou entregue aos serviços de protecção civil municipais. A estratégia passa pelo controlo e não pelo extermínio da espécie, que parece, cada vez mais, ser impossível.
Sendo uma espécie sem predadores no território nacional, a vespa velutina pode causar impactos a médio e longo prazo na biodiversidade nacional. A consequência da na apicultura, já que se alimenta de abelhas, para a produção agrícola, pela destruição de alguns frutos e também porque diminuiu a actividade polinizadora das abelhas.
“Não vamos conseguir eliminar a vespa asiática. Vamos ter que aprender a conviver com ela”, acredita o Comandante Operacional Municipal da Protecção Civil de Penafiel
O Comandante Operacional Municipal de Penafiel explica que, ao contrário do que as pessoas esperam, nem sempre o ninho é destruído no dia seguinte à sua identificação, já que a Protecção Civil vai varrendo o concelho por zonas. Há claro excepções, nos casos em que estão muito próximos de casas e pessoas ou escolas, em que os ninhos são eliminados no mesmo dia. “Somos muito criteriosos a definir prioridades e temos os ninhos em dia. Mas não vamos conseguir eliminar a vespa asiática. Vamos ter que aprender a conviver com ela”, sustenta. “A tendência é para aumentar. Vamos ter mais ninhos em Penafiel e na região no próximo ano. Este ano devemos chegar próximo dos 500 ninhos eliminados”, acredita Paulo Bessa.
Só em 2017 foram eliminados 385 ninhos de vespa asiática em Penafiel. Desde 2014, foram 714 os ninhos destruídos neste concelho.
Nesses quatro anos, as freguesias com maior incidência de casos registados foram Penafiel (118), Paço de Sousa e Guilhufe e Urrô (56) e Abragão (45). Os casos registados na zona de Abragão têm vindo a aumentar no último ano, enquanto em freguesias como Sebolido e Rio Mau há menos casos que chegam às mãos dos serviços de Protecção Municipal. “Há muitos apicultores nessa zona que sozinhos resolvem o problema e nos contactam apenas para os casos mais difíceis”, explica o Comandante Operacional da Protecção Civil de Penafiel.
O combate a esta espécie tem custos. Por ano a Câmara Municipal de Penafiel gasta mais de 20 mil euros no controlo da vespa velutina. “Considerando apenas os custos anuais e o número de ninhos eliminados este ano poderemos considerar um custo médio de 52,5 euros por ninho”, clarifica Paulo Bessa.
Ninhos de vespa asiática eliminados por concelho
2013 2014 2015 2016 2017*
Lousada --- 6 94 151 249
Paços de Ferreira --- 9 49 54 119
Paredes --- 9 126 239 332
Penafiel --- 1 89 239 385
Valongo 43 96 103 122 164
* Lousada - até 17 de Novembro; Paços de Ferreira - até 23 de Novembro; Paredes - até 24 de Novembro; Penafiel - até 21 de Novembro; Valongo - até 24 de Novembro.
A vespa asiática concelho a concelho
Lousada: 500 ninhos já destruídos
Desde 2014, já foram destruídos 500 ninhos de vespa asiática em Lousada, sendo 2017 o ano com mais casos identificados. Em relação a 2016, só até esta altura do ano já foram destruídos mais cerca de 100 ninhos.
“Esta espécie invasora é, essencialmente, um predador de outras vespas e de abelhas e tem tido um impacto negativo ao nível dos ataques aos apiários, matando as abelhas e provocando, em consequência, a diminuição na produção de mel, acarretando assim prejuízos avultados para os apicultores. Esta situação também está a provocar de alguma forma um ‘alarme social’, pondo em causa a segurança dos cidadãos, dado que quando aparece um ninho de vespa velutina junto das edificações, os moradores ficam assustados havendo a necessidade de os serviços municipais actuarem o mais rápido possível”, reconhece o vereador da Protecção Civil, António Augusto Silva.
O autarca não esconde que o município está preocupado com esta situação “uma vez que o número de ninhos tem vindo a aumentar todos os anos, exigindo uma alocação mais exigente de recursos humanos, materiais e financeiros”. Até ao momento, a Câmara Municipal de Lousada terá gasto cerca de 30 mil euros no combate à vespa velutina.
Paços de Ferreira: 231 vespeiros eliminados
Paços de Ferreira é o concelho com menor registo de ninhos eliminados até agora: 231 nos últimos quatro anos. Mas o número duplicou entre 2016 e 2017. Este ano a contagem já vai em 119 ninhos. Fonte da autarquia salienta que estes números só reflectem os ninhos de vespa asiática destruídos pelos serviços municipais, havendo muitos casos em que os próprios munícipes eliminam os ninhos.
A mesma fonte não esconde que os custos alocados pelo município na resolução deste problema são elevados “devido à logística” e salienta que não há qualquer ajuda estatal: “Desde o início do ano que a Câmara Municipal de Paços de Ferreira tem um kit de combate à vespa, que foi atribuído no âmbito de um processo de candidatura submetido à CIM do Tâmega e Sousa, no entanto, isto não cobre todas as despesas do processo. Assim, em média, cada processo resolvido tem um custo associado de 490 euros”.
O crescimento de ninhos detectados diariamente também preocupa a autarquia que apela à população que identifique os mesmos.
Paredes: 706 ninhos destruídos
Paredes é dos concelhos com maior número de casos registados nesta região. Entre 2014 e até meados de Novembro de 2017 foram eliminados 706 ninhos de vespa asiática neste município, grande parte deles nos últimos dois anos.
2017 é o ano com maior número de ninhos destruídos pelos serviços municipais de Protecção Civil: 332 ninhos.
Elias Barros destaca que esta espécie, “predadora e sem predadores”, tem crescido exponencialmente, estando actualmente presente em toda a área geográfica do concelho. “De salientar que esta contabilização só expressa os vespeiros comunicados aos serviços da Câmara Municipal de Paredes. Sabemos que o número é mais elevado. Existem muitos casos que não são comunicados e que as pessoas tentam resolver pelos próprios meios, o que poderá ser uma forma de disseminação da espécie”, sustenta o vereador da Protecção Civil.
Como nas outras autarquias, a destruição dos ninhos não tem custos para os munícipes, mas a autarquia paredense estima gastar entre 20 a 25 mil euros anuais no combate à vespa asiática, “com tendência a aumentar”.
“O município está preocupado com esta situação pois trata-se de um problema ambiental grave e afecta também a parte económica do negócio do mel. Este é um problema que veio para ficar, por isso, as pessoas terão de aprender a conviver com ele. Mas tendo em conta o trabalho desenvolvido pelo Serviço Municipal de Protecção Civil, aparentemente, a situação está controlada/estabilizada pois o crescimento da presença sem qualquer intervenção já teria ultrapassado o milhar de vespeiros”, acredita o autarca.
Elias Barros defende ainda que “este trabalho tem que ser encarado uniformemente por todos os municípios, pois não existem fronteiras geográficas para o problema”. “Se um município não actua correctamente está a ajudar a proliferação da espécie e a exportar o problema”, refere.
Valongo: 528 ninhos eliminados
Depois da avaliação dos ninhos, para perceber se são ou não de vespa velutina, a autarquia afirma que os serviços destroem o ninho em 48 a 72 horas, dependendo das condições atmosféricas.
Os custos com equipamentos e mão-de-obra para o município no combate a este problema já ultrapassam os sete mil euros.
“A vespa asiática é uma praga que tem gasto muito tempo e muitos recursos públicos na sua detecção e posterior destruição. A autarquia tem respondido eficazmente a todas as solicitações procedendo à verificação e isolamento do ninho em apenas cinco dias, bem como à sua incineração, juntamente com a Protecção Civil Municipal e bombeiros”, explica o município. “Dentro das nossas competências estamos a efectuar um trabalho rápido e eficaz no auxílio e protecção da população. A situação pode considerar-se controlada, mas é preocupante”, sustenta no entanto a Câmara Municipal de Valongo.
Para esta autarquia faltam “mais esforços, estudos e apoio dos governos central e europeu para controlar cientificamente esta praga, pois destruindo os ninhos está-se apenas a minorar um problema e não a resolvê-lo em definitivo”.
Como identificar a vespa asiática e os seus ninhos
Provenientes de regiões tropicais e sub-tropicais da Índia, China, Indochina e da Indonésia, as vespas asiáticas caracterizam-se por ter maiores dimensões que a vespa comum. Normalmente, medem entre 1,7 e 3,2 centímetros e a rainha pode ter até 3,5 centímetros.
A vespa velutina é predominantemente preta, tem patas amarelas, uma faixa laranja larga no abdómen e uma faixa fina amarela no primeiro segmento do corpo.
Os seus ninhos são constituídos por fibras de celulose mastigadas e têm, normalmente, forma arredondada ou de pêra com apenas uma entrada/saída lateral. Geralmente, estão localizados no topo de árvores, embora também se encontrem noutros locais. Cada ninho pode chegar a ter 80 centímetros de diâmetro e alberga mais de 2.000 vespas.
Por cada ninho de vespa asiática que completa um ciclo (de um ano) podem surgir até mais seis ninhos já que as vespas fundadoras vão dar origem a novos ciclos de reprodução.
Foto: Protecção Civil de Penafiel
Como e a quem denunciar um ninho de vespa asiática
Em todos os casos o procedimento é o mesmo. Caso detecte um ninho que acredite ser de vespa velutina deve dirigir-se aos serviços da câmara municipal, fisicamente, por telefone ou mesmo nos sites das autarquias ou por e-mail. Há casos em que é preciso preencher um formulário. Também pode dirigir-se às juntas de freguesia ou corporações de bombeiros que, depois, encaminham a questão para as respectivas câmaras. Existe ainda um site, de carácter nacional, designado SOS Vespa.
Os próprios serviços municipais vão identificando e destruindo ninhos não reportados pela população.
Depois de receberem as comunicações sobre a localização de ninhos, os serviços vão ao local e avaliam se é ou não de vespa asiática, determinam o que é necessário para o destruir e se é necessária ou não a presença dos bombeiros. Posteriormente, durante a noite, os ninhos serão destruídos com recurso a fogo ou insecticida.