Na vida política do concelho também há diferenças abismais. Só não vê quem é cego. Há respeito por todas as ideologias. O orçamento é curto mas foi distribuído de acordo com as necessidades e a participação dos autarcas das freguesias. Todos podem saber o que cada um vai fazer, quando, porquê e por quanto. Há regras transparentes. Foi solicitado o apoio das pessoas com ideias, das associações e dos grupos organizados para que contribuam na dinamização da cidade e do concelho. Não interessa quem são, o que representam ou a quem estão ligados. O que interessa é que estejam interessados em promover a sua terra. Só quem é cego é que não vê.
A Assembleia Municipal é um real fórum da comunidade. O presidente da câmara informa e esclarece. Políticos e cidadãos não se podem queixar. Agora são informados. Vale a pena assistir. E as contas? As contas estão a ser geridas de forma a serem pagas sem parar de viver. Toda esta frenética atividade pouco tem gasto das contas do município. Quando todos ajudam, as despesas são poucas. Já não se paga para pensar, não se paga para fazer fora o que podemos fazer em casa. Só por isso se poupam milhares. Cada um faz o que sabe fazer. Cada freguesia traz os seus fregueses. Se todos dermos um pouco do que temos, faz-se algo grande e ainda sobra. Foi assim no “Paredes a rir”, na festa da “Primavera e Festival das Flores”, no “Concerto da Banda da Armada”, nas diversas caminhadas solidárias, na “Queimada Galega” da sexta-feira 13, que espero que continue no 13 de Junho. Paredes está animada, pá! Até já temos uns bares catitas – o “Mercado”, o “Batikano”, o “Tapas”, o “Praça” que se juntam aos que já existiam e que animam a noite e a malta. Mas só não vê quem é cego.
Não é por falta de eventos ou animação que não há povo nas ruas. Mas não há povo. Falta de hábito? Quero acreditar que sim. Anos e anos em que pouco de interessante se fazia, fez com que a população se desabituasse de participar. Mas agora não há razão. Foi pobre a participação da população em alguns dos eventos realizados na Casa da Cultura, nomeadamente nos debates culturais, nas exposições, na feira do livro usado e em diversos outros eventos formativos. Ficaram espaços vazios.
Tristemente temos que nos referir à escassa participação popular nas comemorações do 25 de Abril. Um concerto de Abril realizado pelo Orfeão do Altis no dia 24 de Abril. Música e declamação de qualidade, cantada por paredenses orgulhosos da sua participação, mas quase sem público. Meia sala num espetáculo que merecia encher. Sessão solene do 25 de Abril no Salão Nobre dos Paços do Concelho com sala cheia de membros da assembleia, autarcas e alguns (muito poucos) populares. Espaços perdidos do primeiro andar com dois honrosos assistentes. Largada de pombas e concerto da Banda de Vilela no Parque José Guilherme com muito pouca participação popular. E na tertúlia da tarde, na Casa de Cultura, nem se fala. Houve uma recordação das músicas de Abril com a participação artística de grande qualidade do orfeão feminino e de um solo de viola clássica do Conservatório de Música de Paredes. Fomos presenteados por um momento de declamação emocionante, em que se recordaram os sentimentos vividos naquele dia de transição entre a prisão e a liberdade. Não menos interessante o debate entre o Dr. Pereira Leite, presidente da câmara de Paredes no dia 25 de Abril de 1974, e Manuel Ferreira Coelho, outro jovem paredense que na altura se encontrava do outro lado da barreira. Testemunhos deles e de outros (poucos) que no público disseram como viveram aqueles tempos. Faltou a juventude a quem aquele debate era dirigido. Faltaram muitos dos intelectuais de Paredes, contemporâneos daqueles tempos, que teriam enriquecido o debate com os seus testemunhos. Preferiram ficar recolhidos na cómoda posição de críticos de sofá. Será que o povo de Paredes preferirá comemorar o próximo 28 de Maio? Não quero acreditar. Há coisas que não se esquecem, embora cada vez mais longínquas. Quanto mais distante da vista, mais distante da memória. Por isso é importante renovar o conhecimento todos os anos. Nós, os que vivemos antes e depois daquele dia 25 de Abril de 1974, somos o testemunho vivo. Enquanto vivermos, teremos sempre a obrigação de o recordar. É um dever de todos nós. Participemos publicamente este nosso conhecimento e não deixemos morrer a memória. Os nossos jovens, dirigentes e simples trabalhadores, são o garante de que não haverá retrocesso. Mas precisam de saber. Não podemos voltar aos tempos em que se vivia amordaçado, limitado de movimentos, amedrontados, vigiados 24 horas pelos vizinhos, colegas de trabalho e falsos amigos. Em que éramos formatados desde nascença na trilogia “Deus, Pátria, Família” pelas cartilhas de Salazar, o “salvador da Pátria que tão ditosos filhos tem”, como anunciava a propaganda e aprendíamos na Mocidade Portuguesa. Tal como disse Marques Júnior, capitão de Abril, “O 25 de Abril, a sua simbologia, a sua força, a sua esperança, desenvolve-se nos jovens, porque hoje como ontem, o 25 de Abril é sobretudo amanhã”
Eu sei que nem todos vivemos do mesmo modo esses tempos. O ser humano adapta-se para sobreviver. Ignora ou não quer ver o que lhe pode trazer problemas. Sempre ouvi dizer que os portugueses são um povo que se adapta bem a todos os cenários. Será que nos estamos a acomodar? Não é possível. Há que acordar. Participemos na vida social e cultural que se nos oferece e acordemos da letargia de tantos anos. Só não vê quem é cego e não há pior cego do que aquele que não quer ver.