Nesta sexta-feira, leu-se na Eucaristia o texto em que S. Marcos relata o martírio de S. João Baptista, parente de Jesus. Simultaneamente, tornou-se pública uma reconstrução arqueológica extraordinária, do local em que o episódio aconteceu. Por causa do valor desta descoberta, as Academias Pontifícias condecoraram, na terça-feira passada, o arqueólogo húngaro Győző Vörös com a Medalha de Ouro do Pontificado.
Vörös foi contratado pelo Governo da Jordânia em 2009, através de um concurso internacional, lançado para corresponder ao desejo expresso por Bento XVI, na sua visita apostólica à Jordânia, de que se investigasse o sítio de Maqueronte. Na altura, era difícil ir lá, porque o local era uma zona-tampão entre as forças militares em conflito.
Além dos relatos nos Evangelhos de Marcos e Mateus, a história de João Baptista é contada em pormenor pelo escritor judeu contemporâneo (não cristão) Flávio Josefo e, mais tarde por Eusébio de Cesareia e outros. É através de Flávio Josefo e destas outras fontes que sabemos que o local da prisão e do martírio foi a fortaleza real situada em Maqueronte, a leste do Mar Morto.
Poucos anos depois da morte de Cristo, no ano 70, a luta encarniçada da X legião romana contra a resistência judia culminou na devastação de Jerusalém. No ano seguinte, no Inverno de 71/72, a X legião conquistou Maqueronte. Ao fim de poucos séculos já ninguém sabia ao certo onde ficava Maqueronte. Havia relatos da época, mas não se sabia a que local correspondiam. Só em 1968 o arqueólogo alemão protestante August Strobel levantou a hipótese de que a antiga Maqueronte ficasse junto de uma povoação actualmente chamada Mkāwer. O nome tem alguma parecença e sobretudo Strobel descobriu no local uma imensa vala, uma muralha poderosa e uma rampa de terra para a conquistar, tal como na fortaleza de Massada, conquistada pelos romanos na mesma época. No centro da muralha poderia estar o palácio de Herodes.
Uma equipa de protestante norte-americanos começou os trabalhos de exploração e, embora só tenham permanecido quatro semanas no local, levaram 5 mil achados do tempo de Herodes para os Estados Unidos. Em 1978, dois arqueólogos franciscanos italianos retomaram as escavações, mas morreram antes de concluírem o trabalho. Dois institutos católicos, o Studium Biblicum e a École Biblique, avançaram nas pesquisas. Finalmente, os trabalhos foram retomados em 2009, como se disse, por iniciativa do Governo Jordano, sob a direcção do arqueólogo húngaro Győző Vörös.
Recolheram-se meticulosamente mais de 100 mil peças do que foi o palácio real de Herodes Antipas e, com esta espécie de «puzzle», conseguiu-se reconstruir o edifício em muitos pormenores. Foi como colar, peça a peça, os cacos de uma jarra partida, só que neste caso o «puzzle» tinha peças grandes, como colunas e pedras trabalhadas. O facto de o palácio ter ficado completamente abandonado durante quase dois mil anos permitiu que o local se conservasse como um dos mais intactos de toda a Terra Santa.
João pregou junto ao rio Jordão no ano 15 do Imperador Tibério, que corresponde aproximadamente ao ano 28 ou 29 da era cristã. Portanto, falta pouco para passarem dois mil anos daquele dia terrível em que Salomé, filha de Herodíades, dançou diante da corte do Rei idumeu Herodes, que os romanos tinham nomeado para governar os judeus. A luxúria fervia nesta corte pagã, estranhamente escolhida para subjugar o Povo de Deus. Flávio Josefo, um escritor judeu contemporâneo, escreve que Herodíades era a «vergonha do povo» pelos seus atrevimentos e Salomé seguia-lhe os passos. O vinho deve ter toldado a mente do rei, de modo que ele jurou o que não podia cumprir: prometeu à dançarina o que ela quisesse, nem que fosse metade do reino. É claro que os romanos tinham-no feito rei mas não lhe davam liberdade para dividir o reino em partes. O que aconteceu foi ainda mais surpreendente, em vez de poder ou riqueza, Salomé e a mãe pediram a cabeça de João Baptista.
Herodes, que vivia com a psicose e talvez o remorso de usurpar o governo do povo chamado por Deus, admirava e ao mesmo tempo temia esta relação com Deus. Preferia não matar João Baptista, mas não queria mostrar que respeito pela vida humana.
O resultado, ouvimo-lo na Missa desta sexta-feira, na leitura do Evangelho: «O soldado degolou-o [João Baptista] na prisão, trouxe a cabeça num prato e deu-a à rapariga [Salomé]. Esta entregou-o à mãe [Herodíades]».
Jesus, depois da Transfiguração, disse aos discípulos que fariam conSigo o mesmo que fizeram com João Baptista.