A famosa ”Declaração de Voto” que o PS/Paredes só agora exibe com orgulho, talvez merecido, foi redigida por nós, na madrugada que antecedeu a reunião de concessão e foi depois apresentada, em reunião do executivo, pelo vereador em funções, José Alberto de Sousa. Naquela altura o PS deliberava em órgãos próprios, na autarquia e no partido, ouvia os militantes e depois distribuía as tarefas pelos camaradas consoante as capacidades de cada um.
A dita declaração de voto, elaborada em 13 pontos e era um libelo duro contra a gestão do PSD. Tão duro que, a determinada altura questionava se o Presidente da Câmara, Granja da Fonseca, se tinha tornado também Presidente do Conselho de Administração dos SMAS com o único fim de subordinar os interesses de toda a população do concelho aos interesses particulares.
Infelizmente, para os habitantes do concelho, todos os pressupostos negativos se confirmaram. Paredes tem hoje as menores coberturas dos serviços de distribuição de água e saneamento do país e os preços que os munícipes pagam por essa míngua são quase insuportáveis.
Contudo, o que lá vai lá vai e não adianta chorar sobre leite derramado.
A questão que hoje temos de colocar é esta: como resolver o problema?
A proposta de solução apresentada pelo atual presidente da câmara, na passada semana, levanta-nos, também desta vez, um conjunto de dúvidas que é tão grande ou até maior do que as do processo que agora se tenta reverter.
Será e (re)municipalização desses serviços a solução adequada?
Pensemos, então:
– Não se resolve da mesma maneira hoje um problema que já se desenvolveu durante 20 anos.
– Um novo problema exige novas soluções.
– O que Alexandre Almeida se propõe levar a cabo como solução tornar-se-á, a breve prazo, numa catrefada de novos e maiores problemas. É também um processo eivado de mentiras e contradições cujo desfecho e conclusões nos devem fazer, no mínimo, pensar duas vezes.
– Os 25.000.000 (vinte e cinco milhões) que Alexandre Almeida diz que pagaremos pela (re)municipalização dos serviços são apenas a manifestação de uma intenção. Nada nos diz que a concessionada BE Water aceite este valor. Aliás, lendo os contratos assinados entre as partes e tendo em consideração o número de anos que ainda faltam até à cessão do contrato, não nos espantaríamos que a Be Water exigisse quatro vezes mais, ou seja, 100.000.000 (cem milhões) pela rescisão unilateral. Tomando em consideração que o tribunal dividia as responsabilidades, até porque o não cumprimento do contrato está já assumido por ambas as partes, câmara e empresa, ficaríamos em 50.000.000 (cinquenta milhões). O dobro do que o presidente da câmara diz e uma fortuna que só beneficiaria a empresa que adquiriu a concessão por 10.000.000 (dez milhões), explorou os serviços durante 20 anos e agora ainda recebia quase cinco vezes do valor que pagou pelo negócio.
E ficar-se-ia por aqui o prejuízo dos cidadãos de Paredes?
Obviamente que não. Rescindir um contrato não diminui as necessidades. Ou seja, o concelho continuaria a precisar de grandes investimentos nas redes de distribuição de água e saneamento. Ora, segundo as palavras do presidente da câmara de Paredes, o concelho só tem cobertura de 40%. Como não distingue a rede de saneamento da de distribuição de água, e sabendo nós que há maior cobertura da rede de água do que de saneamento e acrescentando que é sempre mais dispendioso o investimento na rede de saneamento, facilmente concluiremos de que os 15 milhões de que fala são para investir na rede até 2036 (?). Talvez cheguem para meter água e saneamento na freguesia de Rebordosa, mas deixará para trás todas as outras freguesias.
Ou seja, Alexandre Almeida acusa o executivo anterior de lhe ter deixado uma dívida de 100.000.000 (cem milhões) construída ao longo de 24 anos. Se acreditássemos no que ele diz agora, teríamos de perceber – coisa que se nos afigura quase impossível- como é que num único ato de gestão o PS se atreveria a endividar o concelho mais num ano do que os seus antecessores em mais de duas décadas. Hipotecaria, durante décadas, qualquer possibilidade de investimento da autarquia em qualquer outra área.
E quanto ao preço da água?
Infelizmente, em vez de baixar teria de aumentar sistematicamente para pagar quer a indemnização à Be Water quer para pagar os 60% de investimento em rede que ainda falta construir e que envergonha o concelho de Paredes quando comparado com os outros municípios. Não há milagres: os custos da reversão do contrato, acrescentados dos investimentos na rede serão sempre pagos pelos mesmos. Maior despesa, serviços mais caros.
E há outra solução?
Havia, por parte da empresa concessionada, até Alexandre Almeida se ter precipitado neste processo de intenções, no qual, qual autocrata, não ouviu sequer os seus pares na autarquia nem teve em conta que a decisão final caberá sempre à Assembleia Municipal.
Agora, resta-lhe dar um passo atrás, pedir desculpas à Be Water e em vez de andar a propalar, mentindo, que andava em negociações e já tinha acordos garantidos, tem de se sentar humildemente a tentar, agora sim, obter um acordo, como se aconselha a quem tem o dever de defender o interesse público. Caso contrário, o endividamento do município crescerá de tal forma que as novas gerações virarão definitivamente as costas à terra que os viu nascer e de que tanto gostam. Até os mais velhos, cada vez mais, admitem a possibilidade de mudar de concelho e fugir de uma terra que tão maltrata os seus filhos.
O que é que nós pensamos? A sério?
Que tudo isto é uma treta eleitoralista de alguém que tenta esconder a sua incapacidade e a falta de vontade política do executivo para resolver o problema e, por isso, o adia só para nos ocultar que o preço da água subirá 6,5% em 2021 que é, mera coincidência, ano de eleições autárquicas.
Nem o problema da reinstalação da comunidade cigana se resolverá nem a água e saneamento serão municipalizados. Estão a empurrar com a barriga um ano para ganhar mais quatro.
Aliás, se Alexandre Almeida é quem diz ser, sabe tão bem ou melhor do que nós que muito pior do que um mau acordo é um não acordo.
Está, portanto, dispensado de nos tentar enganar mais uma vez.