A construção de um centro logístico de uma empresa de transporte de mercadorias junto a uma zona habitacional de Valongo porá fim ao “sossego e à segurança” da população aí residente e vai desvaloriza a mais de uma centena de habitações ali existentes, acreditam os moradores, que estão contra o licenciamento do projecto.
Constituíram-se como associação, denominada União de Moradores do Lugar de Lagueirões, que conta já com cerca de 70 elementos, e prometem tentar travar o processo, que viola o Plano Director Municipal (PDM), dizem, com uma providência cautelar. Sustentam que o projecto deveria ser implementado numa zona industrial.
A questão já foi levantada em várias reuniões de executivo e assembleias e já deu mesmo origem a um abaixo-assinado em 2017.
A Câmara Municipal de Valongo diz que o alvará já foi emitido e que tudo é legal. A construção vai avançar.
“Há ilegalidades procedimentais e tudo indica que há violação das normas do PDM”
Entretanto, foi criada uma associação de moradores, que se constituiu como contrainteressada no processo de licenciamento desta plataforma logística, com o objectivo de acompanhar todas as fazes e defender os interesses da população.
“A associação de moradores constituiu-se como interessada no processo e não foi notificada de nada. As decisões têm sido tomadas de forma opaca. Quem está actuar de forma legal e clara não esconde a informação”, salientam João Pacheco de Amorim e Frederic Teixeira, advogados da União de Moradores do Lugar de Lagueirões.
“Isto é uma zona habitacional e o PDM admite, excepcionalmente, equipamentos de uso colectivo com vertente residencial e para servir a população. Com a revisão do PDM foi cirurgicamente eliminado o pressuposto de que 60% devia ser destinado à habitação e ficou só o armazém”, alegam.
Por outro lado, os causídicos sustentam que Valongo tem várias zonas industriais “desaproveitadas” onde o projecto poderia nascer, ao invés de ser licenciado numa zona residencial em evolução. Dizem ainda que haverá pareceres técnicos a alertar que os níveis de ruído que serão provocados não serão admissíveis à luz do PDM.
“Há ilegalidades procedimentais e tudo indica que há violação das normas do PDM, o que é uma ilegalidade grave. Foi colocada uma acção em tribunal para impugnar os actos e travar o licenciamento. Se o tribunal não entender assim vamos avançar com uma providência cautelar. Ainda não sabemos se o alvará foi ou não emitido”, dizia o advogado João Pacheco de Amorim.
“Vindo para cá a empresa, é garantido que o sossego acaba”
“Dizem que só vão trabalhar até às 24 horas, mas não acreditamos. Achamos que vai ser a noite toda. E vamos deixar de ter estacionamento”, sustenta. “Nós procuramos um sítio para fugir do ruído das grandes cidades. Se quisemos barulho não teríamos vindo para cá”, defende Ricardo Lobo, que mora ali há sete anos.
A ideia é partilhada por Anabela Ferreira, que escolheu aquela zona habitacional para morar há 11 anos. “Vim do Porto. Escolhi isto pelo sossego e tranquilidade. Ia ser uma zona de moradias em que todos nos conhecemos e que seria segura para as crianças”, explica.
E é mesmo quem tem crianças ainda pequenas que mais se preocupa com os impactos. “Temos uma filha com seis anos e estamos preocupados por ela e por nós. Viemos para cá pelo sossego. Ela e outras crianças agora brincam na rua o que vai ser impossível com camiões aqui a toda a hora”, dizem Susana Durães e o marido Cláudio Pereira, que escolheram viver ali depois de casar, há 10 anos. “Isto ia ter aqui perto uma escola e não ia ser uma zona industrial”, realçam. “Isto não vai servir a nós nem a ninguém, mas apenas os interesses privados. Deviam obrigar a empresa a ir para uma zona industrial”, defende Cláudio Pereira.
“O nosso maior objectivo é não abrir precedentes ou qualquer dia estamos numa zona industrial”, defende Paulo Meireles, presidente da União de Moradores, alertando para o barulho e poluição que serão causadas naquela zona. “Somos da opinião que o armazém e a actividade que nele se irá exercer é incompatível com a envolvente e que, por via disso, o acto de licenciamento praticado pelo município é ilegal”, refere.
Não há violação do PDM, diz a câmara
Essa não é de todo a visão do município. Segundo a autarquia de Valongo, já foi assinado o contrato de urbanização entre as partes e emitido o alvará de obras válido por 24 meses, cujo prazo termina a 7 de Junho de 2021.
A Câmara confirma que o projecto de arquitectura inicialmente aprovado previa além da construção do entreposto comercial a construção de um edifício habitacional e que, “posteriormente foi apresentada uma alteração ao projecto que retirou a componente habitacional mantendo apenas o entreposto comercial”.
Em resposta ao Verdadeiro Olhar, a mesma fonte refere que foi condição do licenciamento a construção do sublanço n.º 2 da variante à EN15 e o prolongamento da Rua Álvares Cabral e respectivo nó de intercecção, “ligação muito desejada e aguardada por toda a população da cidade”.
“As obras de urbanização em causa vão permitir assegurar uma correcta coexistência entre a estrutura viária local e as vias distribuidoras de atravessamento não sendo expectável, de acordo com o estudo de tráfego, circulação, transportes e estacionamento, que se venham a agravar as actuais dinâmicas de circulação nos arruamentos contíguos”, frisa o município.
Além disso, a câmara garante que todo este processo tem decorrido com legalidade. “Não há qualquer violação das regras aplicáveis às operações urbanísticas, designadamente do PDM de Valongo”, sustenta, garantindo que o processo vai avançar.