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Lousada: Família mantém vivo há mais de um século um dos moinhos de Pias

Foto: António Ferreira e a mulher à esquerda e à direita a irmã mais velha e um dos restantes irmãos | Ana Regina Ramos/Verdadeiro Olhar

Em Pias, Lousada, há um único moinho a funcionar que é explorado há mais de um século pela família Ferreira, actualmente a cargo de dez irmãos, que tratam-no como uma relíquia que foi passando de geração em geração.

Chama-se Moinho do Meio e, hoje em dia, serve apenas para fazer, de vez em quando, farinha, mas, essencialmente, para receber vários visitantes, curiosos com este trabalho antigo.

Foto: Ana Regina Ramos/Verdadeiro Olhar

“Agora não há muito movimento, as padarias compram farinha nas fábricas. Mói para nós ou para algum vizinho, fora isso, põe-se a moer para as pessoas que querem visitar para ver como isto funcionava”, refere António Ferreira, o irmão mais velho, que diz que antigamente chegava a produzir 300 quilos de farinha só para uma das padarias de Lousada e ficava a moer durante 24 horas, tanta era a produção.

Sublinha ainda que “há muita gente” que vai visitar o espaço, dos mais novos aos mais velhos e que, durante a Festa do Rio, que decorreu em Pias no passado fim-de-semana, “a maior parte das pessoas comeu broa cozida com farinha moída aqui”.

Foto: António Ferreira | Ana Regina Ramos/Verdadeiro Olhar

António Ferreira nasceu há 68 anos, literalmente no moinho, numa cama com um colchão de colmo. Conta que os moinhos têm de ser tratados como os bebés, com “muito carinho” e, por isso, antigamente, no máximo de duas em duas horas, era preciso ou deitar mais milho, ou ver se a farinha não chegava à mó. “A pessoa tem de estar sempre por perto, não pode abandonar o moinho. Então dormia-se aqui e acompanhava-se”, remata.

Todos os irmãos nasceram em Pias e cinco deles ainda vivem por ali perto do moinho, quatro acabaram por emigrar e há ainda mais um que reside no Marco de Canaveses. No entanto, tanto António Ferreira, como a irmã que se encontra de férias cá, referem que todos ajudam, sabem como funciona e participam quando chega a altura de mudar algumas peças ou o soalho que vão ficando deteriorados. “Há três responsáveis, mas isto é de todos. Passa a ser uma casa de família”, sublinham, indicando que a casa ao lado do moinho é utilizada quando os que estão emigrados vêm de férias e se juntam todos.

Foto: Ana Regina Ramos/Verdadeiro Olhar

Apesar de não saberem a data ao certo em que o moinho foi construído, sabem que os avós paternos casaram e viveram sempre no local que, nessa altura, pertencia a uma quinta. Só em 1960 é que o pai destes 10 irmãos comprou o moinho.

Antigamente, contam, os pais ainda conseguiam viver apenas do trabalho do moinho, dedicavam-se também a terras cultivadas com vários alimentos e criavam animais, incluindo cavalos. Mas já estes 10 irmãos foram crescendo e o seu “ganha pão” já passou a ser cada uma das suas profissões. Ainda mantêm, contudo, um milheiral – para poderem usar na produção da farinha – e uma criação de porcos e galinhas.

 

“Hoje não dá para viver disto. Isto mantém-se para um museu, para dizer às pessoas como eram as coisas antigamente”, aponta António Ferreira. “Fica muito caro manter isto. Todos os anos é preciso fazer algumas peças, pôr soalho novo… Para manter é um investimento muito grande. Vamos tentando”, acrescenta.

Quanto às gerações mais novas, os irmãos Ferreira contam que dificilmente alguém vai continuar o trabalho no moinho. “Para já, não há ideias. Estão formados, outros a formarem-se e ninguém vai querer seguir isto. Podem querer manter por tradição dos avós e pais, mas ninguém mais vai seguir essa profissão. Sabem ver, agora fazer… Quando a nossa geração acabar, não sei se há quem faça isso”, lamenta António Ferreira. Mas ao lado, a irmã exclama que ainda são novos, por isso, ainda falta para a sua geração terminar.

Foto: Ana Regina Ramos/Verdadeiro Olhar

Este é um de três moinhos que já funcionaram em Pias, a poucos metros uns dos outros: O Moinho do Casal Novo (que já não é um moinho), o Moinho do Meio e o Moinho de Baixo (que está em ruínas). “É pena que não haja mais, é pena que se tenha deixado tudo destruir, mas é a vida. Pelo menos, vamos tentar preservar enquanto formos todos vivos, depois os nossos sobrinhos ou os nossos filhos farão o que entenderem”, conclui.