Verdadeiro Olhar

Iguaizinhos

Diz-se que Deus não faz duas criaturas iguais pelo respeito que tem para com elas. Na verdade, não é difícil de ter presentes as desigualdades entre dois animais ou plantas, por maiores que sejam as semelhanças. Os próprios “gémeos idênticos”, univitelinos, têm diferentes impressões digitais. As papilas dérmicas que as constituem têm as suas estruturas modificadas pelo contacto distinto com os tecidos maternos, pelo que, em número de umas 35 por milímetro quadrado, originam um padrão absolutamente único.

Se no falar habitual se podem ter como equivalentes os termos “igual” e “idêntico”, nos meandros da Matematica as coisas não são assim. Por exemplo, se dois números, A e B, têm o mesmo resto quando divididos por um terceiro número, N, tais números são “idênticos” ou “congruentes”. É o que acontece com os números pares quando divididos por 2, dão todos resto zero; por isso, 6 e 10, neste contexto, são idênticos ou congruentes, mas não são iguais!

A linguagem corrente é muito castiça nestes termos, dizendo-se que duas coisas muito parecidas são “iguaizinhas” ou até “muito iguais”. E ficou célebre a tirada de  George Orwell em “O Triunfo dos Porcos”, segundo a qual, na quinta dos animais, “Todos os animais são iguais mas alguns são mais iguais do que os outros.”

Estas e outras igualdades trazem-me à memória a história de um homem que, apesar de uma razoável bebedeira, se consegue pôr de pé num autocarro, carregar no botão de paragem, cambalear até à porta e anunciar en voz alta e entaramelada: “Esta é a minha paragem”. Levanta-se outro homem, mais novo mas em estado semelhante e diz: “Esta também é a minha paragem”. Lá saem os dois e um diz “Esta é a minha rua” enquanto o outro responde: “Esta também é a minha rua”. Lá foram cambaleando, um à frente e o outro atrás, dizendo o primeiro e repetindo o mais novo do mesmo modo com “esta é a minha porta da rua”, “este é o meu elevador”, “este é o meu andar”, até que uma senhora abre a porta de um apartamento, suspira e abana a cabeça dizendo “tal pai, tal filho!”