As farturas geram todos os anos filas em frente às roulotes, nas festas de cada região. De preferência, polvilhadas com açúcar e canela, como dizem que é tradição. Há quem leve para a família e quem prefira comer logo na hora, enquanto ainda estão quentinhas.
Esta realidade ainda se torna mais visível quando se fala das Farturas da Família Armando, com mais de 80 anos de tradição, que estão presentes nas festas de Paredes e, de seguida, em Lousada. Há filas que estão sempre repletas de pessoas dos oito aos oitenta.
Se há quem não se importe de lá esperar nas filas para comer o tão esperado doce, também há quem vá a pé, durante cerca de uma hora e meia, até ao centro de Paredes só para o ir buscar.
É o caso do grupo “Junta-te!” – um grupo de 40 pessoas de Vilela (Paredes) que realiza caminhadas – que, na sexta-feira à noite, veio de Vilela a pé até ao lado do Parque da Cidade de Paredes, numa romaria às farturas da família Armando.
“É o segundo ano consecutivo. Foi um desafio. Viemos, gostamos e, este ano, estamos cá novamente”, refere a presidente do grupo, Rosa Marques, sublinhando que “farturas de Lisboa não há igual, são uma maravilha”.
Enquanto saboreiam a caixa com dezenas de farturas que compraram (e desapareceram em pouco tempo), não arranjam palavras para as descrever, mas a verdade é que já são conhecidas de todos. “Gosto aqui e nas Fontainhas. Porque ganharam fama e, desde logo, porque são boas”, descreve Cláudio Bessa, membro do grupo.
Maria Santos, de 71 anos, e Rosa Ribeiro, de 66, são das mulheres do grupo com mais idade, mas referem que já é a segunda vez que participam da iniciativa e que gostam destas farturas porque “são sequinhas e muito gostosas”.
Já Luís Ferreira conta que é de Rebordosa e que não liga assim tanto a farturas, mas acredita que “é gratificante poder conviver com este grupo”. Enquanto acaba de comer uma, polvilhada com açúcar e canela, vai dizendo que gosta muito de andar e o grupo, que costuma realizar caminhadas solidárias, é “muito unido” e é “uma malta fixe”.
A fila para comprar farturas e churros parecia que nunca mais tinha fim. Era de noite e início de fim-de-semana e, além das dezenas de pessoas sentadas nas esplanadas, não paravam de chegar famílias, jovens e mulheres e homens sozinhos que levavam para os familiares e até carros paravam para deixar mais gente que se juntava à fila, que, apesar disso, andava rápido, mas também se “reabastecia” num instante.
“Parecem formigas, é uma loucura mesmo”, exclama Nazaré Correia, uma das responsáveis pelas Farturas da Família Armando. “Vem muita gente de fora aqui a Paredes às nossas farturas. Sabem que estamos cá e quando passam têm que parar. Os emigrantes também não falham, com as saudades que vêm de tudo”, explica, acrescentando que até há quem comemore aniversários lá.
Maria Cardoso estava há cerca de 10 minutos na fila, mas conta que vale a pena. “É indispensável, tem de se vir todos os anos, é tradição. Não sabe bem de outra forma a não ser aqui”, sublinha, referindo que trabalha há 40 anos no centro de Paredes e, desde então, que costuma comprar farturas à família Armando. “Nestas alturas, a gente esquece-se que engorda”, brinca.
Já Isabel Ferreira, que tinha acabado de comprar dois saquinhos para levar para casa, diz que veio de propósito ali. “Só vim hoje porque estava mesmo com desejo de farturas. São só estas, já há muitos anos, desde que fazem as festas de Lousada”. Para explicar o porquê da escolha, Isabel diz que são “diferentes, não têm tanto óleo, são mais sequinhas”.
Também em grupo, de propósito para estas farturas, veio Rosa Coelho, que mora em Paredes e tem preferência pelas farturas mais fininhas. “São sequinhas. São ótimas”, descreveu. Já é a segunda vez neste ano que lá aparecem, mas contam que vale a pena.
Acabados de sair das mesas, estavam os primos Mariana Silva, Pedro Silva, Alfredo Mota e Maria Silva, vindos de Baltar. Desde miúdos que vinham com os pais às Farturas da Família Armando, que já se tornou “uma tradição” anual. “São muito boas e parece que têm menos gordura”, apontam, mas não conseguem decidir por unanimidade se o que é melhor são os churros ou as farturas.
Fazem farturas há mais de 80 anos e geram filas em Paredes e Lousada
Há mais de 80 anos que a família Armando, de Aveiro, é presença assídua em várias festas do país. As Festas da Cidade e do Concelho de Paredes e as Grandiosas Festas em Lousada são alguns exemplos.
Nazaré Correia diz que é “a figura pública das farturas”. Desde os 17 anos que está atrás do balcão a preparar este doce, mas agora conta que a sua presença é mais para “ajudar e orientar”. “Há 44 anos que me casei com um fartureiro, é uma vida. Gosto muito de estar dentro do balcão, de atender os clientes e vender as boas farturas”, sublinha, dizendo que, mesmo assim, ainda hoje gosta deste doce.
A tradição destas farturas “à moda de Lisboa”, que já vai na terceira geração, veio dos sogros que começaram a vender por volta de 1931. Conta que o sogro veio de Lisboa para o norte vender aquelas que são consideradas por muitos “as melhores do mundo” e decidiram colocar o nome da família. “A pessoa morre, mas o nome fica”, refere.
Costumam passar pelas Fontainhas, na altura do São João no Porto, pelas Festas do Senhor de Matosinhos, pela Feira de Março, em Aveiro, que dura um mês inteiro e “é uma loucura”, e terminam a época em Arcos de Valdevez – onde, este ano, não vão poder ir.
Actualmente, também o filho e a nora se juntaram a ela e ao marido nesta tradição. Além deles, trabalham ainda quase mais 10 pessoas, que vêm o trabalho multiplicado sempre que a noite chega.
O segredo, confessa, está na massa e “também o óleo – de girassol – tem de ser bom”. No final, são polvilhadas com açúcar e canela, segundo manda a tradição, mas também há quem prefira os churros recheados.