“Este investimento não traz vantagens para o município. Há um impacto ambiental forte. Não vamos licenciar estas actividades”. A garantia foi deixada pelo vereador Paulo Esteves Ferreira, em reunião de executivo, referindo-se à intenção de duas empresas instalarem centrais fotovoltaicas na freguesia de Campo e Sobrado, em Valongo.
Nesta sessão, tanto PS como PSD indeferiram o reconhecimento de interesse público municipal requerido pela Compatiblespirit e pela Singular Sphere, Lda, que apresentam projectos em tudo idênticos.
“As justificações apresentadas pelo requerente para defender o ‘Interesse Municipal’ não evidenciam de facto qualquer benefício ou contrapartida efectiva, quantificada e directa para o Município e as suas populações, sobre a produção da energia solar que justifique a declaração solicitada. Pelo contrário, apresenta impactos negativos ambientais, paisagísticos e patrimoniais previsíveis e, eventualmente, irreversíveis”, argumenta a autarquia nas propostas que foram chumbadas por unanimidade.
Recorde-se que a Câmara de Valongo já se mostrou contra estes investimentos, por antecipar “fortes impactos negativos” a vários níveis e prometeu usar de meios legais para impedir os projectos.
O período de consulta pública de ambas as centrais fotovoltaicas já terminou, estando os processos de avaliação de impacte ambiental em análise, revela o Portal Participa.
Impacto na economia local não foi comprovado para justificar interesse público municipal
Uma das centrais fotovoltaicas, proposta pela Compatiblespirit, visa a “produção de energia eléctrica num conjunto de nove prédios totalizando uma área total de intervenção de 382.600,00 m2, e compreende 52728 módulos, com uma potência pico de 28473 kWp e uma potência nominal de 25900 kVA”, lê-se na proposta levada a reunião de executivo. A ligação à rede pública prevê uma linha de interligação aérea e subterrânea, desde o Posto de Seccionamento até à Sub-estação de Fânzeres (Gondomar) com uma extensão aproximada de 6,5 quilómetros. A empresa diz que os cálculos apontam para que a produção permita “a alimentação eléctrica de 3.121 habitações, considerando uma média de três pessoas por habitação e um consumo de 4,62MWh/capita”.
Já a segunda central, da Singular Sphere, “destina-se à produção de energia eléctrica num conjunto de 21 prédios totalizando uma área total de intervenção de 305.075 m2, sendo que a instalação eléctrica compreende 37.960 módulos, com uma potência pico de 20.498kWp e uma potência nominal de 18.600 kVA”. Neste caso, a ligação à rede pública prevê uma linha de interligação aérea, desde o Posto de Seccionamento até à Sub-estação de Valongo com uma extensão aproximada de 2,7 quilómetros. A energia a produzir, diz a empresa, iria abastecer “2.241 habitações”.
Em ambos os casos, as empresas invocaram vários argumentos para pedir o reconhecimento do interesse público municipal. Entre eles o facto de o processo de construção e operação da central fotovoltaica permitir o “envolvimento de pessoas locais” e o “alavancamento da actividade comercial local, como por exemplo hotéis, cafés, restaurantes, aluguer de habitações, entre outros”, tendo impacto na economia local e podendo ainda envolver os jovens nesta indústria.
Mas as razões apresentadas não colhem junto da autarquia de Valongo. “A central – após a sua construção – possui um funcionamento automatizado, sendo apenas necessários trabalhos de manutenção. Assim, o eventual envolvimento de pessoas terá lugar apenas no momento da construção, não existindo qualquer garantia de continuidade desse envolvimento assim que a central estiver operacional. Por outro lado, não existe também qualquer garantia que a instalação da central se fará com recurso a mão-de-obra local, nem se encontram quantificadas pelo titular do processo as necessidades dessa mesma mão-de-obra, e se na população activa do concelho existe mão-de-obra qualificada em quantidade suficiente para os trabalhos a realizar. Dito isto, verifica-se igualmente que não são apresentados dados quantitativos que demonstrem o impacto da construção da central na economia local”, pelo que a Câmara conclui que não fica “evidenciado qualquer impacto positivo na economia local decorrente da construção da central”. A par disso, e face aos números de habitações que iriam ser servidas citados, a Câmara de Valongo refere que a proposta não fala da “localização dessas habitações, nomeadamente se as mesmas se situam na área do Município de Valongo, ou se as mesmas se situam fora do concelho, pelo que o interesse municipal não se encontra – neste aspecto – garantido, podendo a energia produzida ser utilizada para abastecer consumidores doutros pontos do país”.
Estas propostas “não estabelecem qualquer relação concreta entre a produção de energia eléctrica e a economia local e para o bem-estar das populações do concelho, sendo que – tratando-se de centro electroprodutor que integra o Sistema Eléctrico Nacional – não existe qualquer garantia de benefício energético para o Município em particular”, ou seja, “não se encontra demonstrado qualquer impacto positivo na economia local relacionado com a produção de energia eléctrica”.
Já os impactos para as populações e território antevêem-se negativos. Razão que leva a autarquia a não aprovar o interesse público municipal.
Estas duas centrais teriam “impacto ambiental enorme” no concelho, afirmou Miguel Santos, pelo PSD. “O que é que Valongo ganha com isto: nada!”, sentenciou o vereador, perguntando qual é o estado do processo de licenciamento e se poderia ser celebrado protocolo com contrapartidas para o concelho, caso fossem instaladas estas centrais.
“Estamos do mesmo lado”, sustentou o vereador Paulo Esteves Ferreira, que explicou que houve reuniões com as empresas que tentaram licenciar e sugeriram contrapartidas para o município, o que foi recusado. “Este investimento não traz vantagens para o município. Há um impacto ambiental forte. Nas próprias justificações não conseguem comprovar que há ganhos. Não vamos licenciar estas actividades”, concluiu.