No dia 3 de janeiro de 2023, a Câmara Municipal de Paredes adquiriu um terreno para construção com cerca de 13 mil metros quadrados na Rua da Lage, em Rebordosa, pelo valor de 745 mil euros. O terreno, que anteriormente pertencia à SONAE Indústria e onde, em tempo, funcionou a NOVOPAN, foi comprado pelo Município às empresas PER TUTTI – Imobiliária Lda e GUESTZONE – Consultoria Financeira Lda.
Contudo, de acordo com a escritura a que o VERDADEIRO OLHAR teve acesso, este mesmo terreno foi comprado por estas duas empresas no dia 23 de dezembro de 2021, exatamente um ano e 10 dias antes, por 375 mil euros. Ou seja, as empresas adquiriram o terreno por 375 mil euros e venderam-no ao Município de Paredes por quase o dobro do valor.
Câmara Municipal diz que desconhecia valor da transação anterior
Perante esta informação, o VERDADEIRO OLHAR questionou a Câmara Municipal de Paredes sobre se tinha conhecimento de que o terreno havia sido adquirido pelos vendedores por metade do preço apenas um ano antes. Em resposta, o Município afirmou que “desconhece as atas e o valor pelo qual o proprietário de então adquiriu o terreno”.
Mais ainda, a Caderneta Predial Urbana do terreno, consultada pelo nosso jornal, indica que o valor patrimonial do imóvel, segundo a Autoridade Tributária, é de 135.850 euros. Questionada sobre a razão pela qual adquiriu o terreno por um valor que excede em mais de 600 mil euros o seu valor patrimonial, a Câmara Municipal respondeu que “a avaliação do terreno foi feita pelo perito avaliador contratado”, e que o valor atribuído ao terreno, num documento entregue no dia 28 de dezembro de 2022, foi de 841.219,68 euros.
Processo de aquisição envolto em dúvidas por falta de documentação
O VERDADEIRO OLHAR tentou apurar quando a Câmara Municipal tomou a decisão de adquirir o terreno e solicitou acesso à deliberação camarária ou a qualquer documento oficial que comprovasse essa decisão. No entanto, a Câmara recusou-se a fornecer essa informação, indicando que “a decisão foi tomada pelo senhor Presidente da Câmara Municipal que tem poderes para tal”. Apesar disso, para que os serviços municipais contratassem o avaliador externo que determinou o valor do terreno, deveria existir um despacho que autorizasse esse procedimento administrativo.
Porém, a Câmara Municipal afirmou que não existe qualquer documento com tal despacho, justificando que “o ato administrativo para a aquisição do imóvel foi tomado pelo Sr. Presidente da Câmara Municipal, com poderes para tal, com a assinatura da escritura pública, não havendo necessidade de despacho aquando da solicitação do relatório de avaliação”. Na prática, isto significa que os serviços municipais contrataram um avaliador externo sem qualquer suporte documental formal que sustentasse essa contratação.
Câmara vai construir pavilhão multiusos a 1400 metros de outro multiusos
Em relação à finalidade do terreno adquirido, a Câmara Municipal de Paredes indicou que o mesmo será destinado à construção de um “pavilhão multiusos para eventos desportivos e culturais”. Contudo, importa recordar que, a apenas 1.400 metros de distância, já existe um outro pavilhão multiusos, o Pavilhão Rota dos Móveis, com funcionalidades semelhantes. Este facto levanta questões sobre a necessidade e a racionalidade financeira de investir num novo pavilhão com características tão próximas de outro existente.
Câmara afirma que a relação entre vendedores e funcionária municipal não levanta questões de conflito de interesse
Os antigos proprietários do terreno, as empresas PER TUTTI – Imobiliária Lda e GUESTZONE – Consultoria Financeira Lda., têm como sócio-gerente o marido da atual Chefe de Divisão de Assuntos Jurídicos da Câmara Municipal de Paredes. Questionada sobre se o Presidente da Câmara Municipal estava ciente desta relação e se considera haver um potencial conflito de interesses na transação, a Câmara admitiu que tinha conhecimento da situação. Afirmou ainda que “a chefe de divisão da Câmara Municipal não teve qualquer intervenção na transação para salvaguardar qualquer conflito de interesse”.