Fernando Gomes Perpétua acreditou que podia transformar o mundo através da política. Foi um dos vereadores mais jovens do país, assumindo as funções de vereador da oposição, sem pelouros, na Câmara Municipal de Castelo de Paiva, logo aos 18 anos. Anos mais tarde, havia de ser também vereador da Câmara Municipal de Paredes (entre 2001 e 2005).
Passou pela administração de uma empresa pública e duas privadas até que, em 2010, resolveu afastar-se e tirar um curso de Teologia. Tinha reencontrado a fé, anos antes, e passou a perceber que “o mundo se transforma a partir do coração do homem”.
“A vida diz ao homem quem ele é”, é a frase com que começa o livro em que fala da forma como uma “convicção personalista profunda, um pensamento de que a política existe para servir as pessoas e de que todos os totalitarismos são uma ameaça à liberdade da pessoa humana” marcou o pensamento político de Francisco Sá Carneiro.
O livro “Francisco Sá Carneiro: Um Católico na Política” é apresentado esta quarta-feira, com a presença do Bispo do Porto, D. António Francisco dos Santos, nas instalações da Misericórdia do Porto.
Queria transformar o mundo pela política
Nasceu e cresceu na freguesia de Sobrado, em Castelo de Paiva, e foi influenciado, desde jovem, pela religião e pela política.
Aos 18 anos, tornou-se num dos vereadores mais jovens do país ao ser eleito, pelo PSD, para um mandato na Câmara Municipal de Castelo de Paiva, na altura liderada pelo socialista Antero Gaspar.
Porquê? Tinha o desejo de “transformar o mundo”, confessa Fernando Gomes Perpétua, que mais tarde, haveria de descobrir que o mundo se transforma a partir de dentro.
“Na minha família não existia tradição de participar na vida política, embora tenha conhecido o PSD no berço. Aos cinco anos de idade costumava adormecer na sede do PSD”, recorda.
Tinha entusiasmo e um misto de vontade de fazer e inexperiência. “Fui construindo esse processo com algumas ajudas, com crescimento pessoal e aprendizagem”, diz.
À época, ser vereador, ainda que sem pelouros, foi desafiante. Tinha acabado de entrar no curso de Engenharia Civil, na Universidade do Porto, e confessa que não era fácil manter o equilíbrio entre o estudo e a política, sobretudo quando “o apelo da política era mais forte”.
Terminou o curso e iniciou uma carreira profissional que o haveria de trazer, anos mais tarde, como técnico, para a Câmara Municipal de Paredes. Mais tarde, foi convidado por Granja da Fonseca a integrar o executivo como vereador, funções que exerceu durante um mandato, até 2005.
“Gostei muito de ser vereador em Paredes”
“Gostei muito de ser vereador em Paredes, das pessoas de Paredes, e do trabalho que ajudei a fazer aqui. Foi uma coisa que me realizou profundamente”, garante Fernando Gomes Perpétua, que lembra o processo de valorização de infra-estruturas realizado na altura, com os projectos de requalificação urbana da cidade de Paredes e de polos como Lordelo, Rebordosa, Baltar ou Gandra e ainda a consolidação das zonas industriais do concelho. “Paredes deu um salto importantíssimo num período de 10 anos”, salienta.
Depois foi presidente de uma empresa pública em Vila Nova de Gaia e administrador de outras duas empresas privadas. Até que, em 2010, decidiu suspender a actividade profissional.
Esse passo surgiu do reencontro que teve com a fé, há alguns anos atrás, depois de um afastamento de 10 anos à religião. Foi quando fazia um mestrado de Filosofia, na Universidade Católica, que descobriu a filosofia personalista, pela mão de João Paulo II. Foi aí que descobriu que “o mundo se transforma a partir de dentro, a partir do coração do homem”.
“Seguiu-se uma descoberta progressiva de mim próprio, dos outros e de Deus. Isso levou-me a um encontro profundo com Deus”, garante.
Por isso, optou por ingressar no curso de Teologia para aprofundar conhecimentos, optando depois por entregar-se a uma vida de serviço aos outros e à Igreja. “Podia pôr-me ao serviço das pessoas noutros contextos, mas vejo que o posso fazer desta forma e que isso me fará também feliz”, explica. Foi ordenado diácono em Junho deste ano.
Pensamento político de Sá Carneiro foi influenciado pelo personalismo cristão, diz o autor
Foi também do curso de Teologia que surgiram as bases do livro que agora apresenta e que é um ensaio de moral social a partir do estudo do pensamento político de Francisco Sá Carneiro. “O livro parte da vida de Sá Carneiro e mostra, em detalhe, como o personalismo cristão e o pensamento da doutrina da Igreja acabam por ser decisivos na estruturação do seu pensamento político”, sustenta o autor.
Para escrever este livro leu e releu mais de 2.000 páginas deixadas por Francisco Sá Carneiro. Nelas encontrou uma fé católica profundamente evidente.
“O seu pensamento político nos anos 70, o modo como pensa as bases programáticas do PPD/PSD; como luta contra os totalitarismos de esquerda e de direita num contexto quente do Verão de 75; como estabelece o combate politico para afirmação do PSD a nível nacional; e como, depois de ganhar as eleições, estabelece o seu programa de Governo, reflecte as suas convicções, sempre pensadas a partir da pessoa humana e de grandes referências religiosas e culturais”, defende o antigo vereador da Câmara de Paredes.
“Faz muita falta uma visão que respeite e coloque a pessoa humana no centro da actividade política”
“A pessoa humana deve ser o princípio e o fim de toda a acção política”, dizia Sá Carneiro. “Eu concordo inteiramente”, corrobora Fernando Gomes Perpétua.
“Faz muita falta uma visão que respeite e coloque a pessoa humana no centro da actividade política”, defende. “Não é possível pensar a política a partir do interesse ou poder pessoal, isso é a subversão da política”, acrescenta.
Algo que não vê a acontecer hoje em dia. “Vejo que é um caminho que deve ser redescoberto. A doutrina social da Igreja e o personalismo são contributos enormes para a política, se a política souber tirar deles o partido que deve tirar”, acredita.
O livro com esta nova visão sobre Francisco Sá Carneiro é apresentado esta quarta-feira, dia 23, pelas 21h15, na nova sede da Misericórdia do Porto, na Rua de Joaquim de Vasconcelos. O evento será presidido pelo Bispo do Porto, António Francisco dos Santos, contando com intervenções do Provedor da Misericórdia do Porto, António Tavares, e do professor da Universidade Católica, Jorge Teixeira da Cunha.
“Quem for assistir poderá fazer a descoberta de uma dimensão fortíssima de Sá Carneiro, talvez não tão conhecida como devia”, promete o autor, que adianta ainda que espera voltar à escrita em breve, desta vez com um ensaio sobre “onde está a liberdade”.